“Segundo os Espíritos, de
todos os mundos que compõem o nosso sistema planetário, a Terra é dos
habitantes menos adiantados, física e moralmente. Marte lhe estaria ainda
abaixo, sendo-lhe Júpiter superior de muito, a todos os respeitos.” -
rodapé à questão 188 de O Livro dos Espíritos.
“26. O número e o estado dos
satélites de cada planeta têm variado de acordo com as condições especiais em
que eles se formaram. Alguns não deram origem a nenhum astro secundário, como
se verifica com Mercúrio, Vênus e Marte, ao passo que outros, como a Terra,
Júpiter, Saturno, etc., formaram um ou vários desses astros secundários.” -
item de A Gênese, capítulo VI, Uranografia Geral; a que a editora
acresce em nota de rodapé: “Em 1877, foram descobertos dois satélites de
Marte: Fobos e Deimos.”
“3º Ao tempo de Buffon,
somente se conheciam os seis planetas de que os antigos eram conhecedores:
Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter e Saturno.” - A Gênese,
capítulo VIII Teorias Sobre a Formação da Terra.
“Segundo os Espíritos, o
planeta Marte seria ainda menos adiantado que a Terra. Os Espíritos ali
encarnados parecem pertencer quase que exclusivamente à nona classe, a dos
Espíritos impuros, de sorte que o primeiro quadro, que demos acima, seria a
imagem desse mundo.” - tal quadro ele o expõe alguns parágrafos acima: “Suponhamos,
então, um globo habitado exclusivamente por Espíritos da nona classe, por
Espíritos impuros, e para lá nos transportemos pelo pensamento. Nele veremos
todas as paixões liberadas e sem freio; o estado moral no mais baixo grau de
embrutecimento; a vida animal em toda a sua brutalidade; nada de laços sociais,
porquanto cada um só vive e age por si e para satisfazer seus grosseiros
apetites; o egoísmo ali reina como soberano absoluto, arrastando no seu cortejo
o ódio, a inveja, o ciúme, a cupidez e o assassínio.” - Revista Espírita,
março de 1858.
“Marte é um planeta inferior à
Terra, da qual é grosseiro esboço; não é necessário habitá-lo. Marte é a
primeira encarnação dos mais grosseiros demônios. Os seres que o habitam são
rudimentares; têm a forma humana, mas sem nenhuma beleza; têm todos os
instintos do homem, sem a nobreza da bondade. Entregues às necessidades
materiais, comem, bebem, batem-se, acasalam-se. Mas como Deus não abandona nenhuma
de suas criaturas, no fundo das trevas de sua inteligência jaz latente o vago
conhecimento de si mesmo, mais ou menos desenvolvido. Esse instinto é
suficiente pra torná-los superiores uns aos outros e preparar a eclosão para
uma vida mais completa. A deles é curta como a dos insetos efêmeros. Os homens,
que são apenas matéria, desaparecem após curta duração. Deus tem horror ao mal
e só o tolera como servindo de princípio ao bem. Ele abrevia o seu reino, sobre
o qual triunfa a ressurreição. Nesse planeta a terra é árida; pouca verdura;
uma folhagem sombria, que a primavera não renova; um dia igual e cinzento.
Apenas aparente, o Sol jamais prodigaliza suas festas; o tempo escoa monótono,
sem as alternativas e as esperanças das novas estações; não é inverno, não é
verão. Mais curto, o dia não é medido do mesmo modo; a noite reina mais longa.
Sem indústria, sem invenções, os habitantes de Marte consomem a vida à procura
de alimento. Suas grosseiras habitações, baixas como um casebre, são
repugnantes pela incúria e pela desordem que nelas reinam. As mulheres se
destacam sobre os homens; mais abandonadas, mais famélicas, não passam de suas
fêmeas. Têm apenas o sentimento maternal; dão à luz com facilidade, sem nenhuma
angústia; alimentam e aguardam seus filhos a seu lado, até o completo
desenvolvimento de suas forças, e os expulsam sem pesar e sem saudades. Não são
canibais; suas contínuas batalhas não têm outro objetivo que não seja a posse
de um terreno mais ou menos abundante em caça. Caçam nas planícies intermináveis.
Inquietos e instáveis como os seres desprovidos de inteligência, deslocam-se
incessantemente. A igualdade da estação, a mesma em toda parte, comporta, em
consequência, as mesmas necessidades e as mesmas ocupações; há pouca diferença
entre os habitantes de um e de outro hemisfério. Para eles a morte não
representa nenhum pavor ou mistério; consideram-na apenas como a putrefação do
corpo, que queimam imediatamente. Quando um desses homens vai morrer, logo é
abandonado; então, só e deitado, pensa pela primeira vez; um vago instinto o
assalta; como a andorinha advertida da próxima estação, sente que nem tudo está
acabado, que vai recomeçar alguma coisa desconhecida. Não é bastante
inteligente para supor, temer ou esperar, mas calcula, às pressas, suas vitórias
e derrotas; pensa no número de caças que abateu e se regozija ou se aflige
conforme os resultados obtidos. Sua mulher - só têm uma por vez, embora possam
trocá-las sempre que lhes convêm - agachada à entrada, atira seixos no ar,
quando formam um montículo, ela julga que chegou a hora e se aventura a olhar
para o interior, se suas previsões se tiverem realizado, se o homem estiver
morto, ela entra sem um grito, sem uma lágrima, despoja-o da pele de animais
que o envolve, vai friamente avisar seus vizinhos, que transportam o corpo e o
incineram, tão logo esfria. Os animais, que por toda parte sofrem os reflexos
humanos, são mais selvagens, mais cruéis que em qualquer outro lugar. O cão e o
lobo são uma só e a mesma espécie, incessantemente em luta com o homem, que,
contra ele, se entrega a combates encaniçados. Aliás, menos numerosos, menos
variados que na Terra, os animais são a miniatura deles mesmos. Os elementos
têm cólera cega do caos; o mar furioso separa os continentes sem navegação
possível; o vento ruge e curva as árvores até o solo; as águas submergem as
terras ingratas, que não fecunda; o terreno não oferece as mesmas condições
geológicas da Terra; o fogo não o aquece; os vulcões são desconhecidos; as
montanhas, pouco elevadas, não oferecem nenhuma beleza; fatigam o olhar e
desencorajam a exploração; enfim, por toda parte, monotonia e violência; por
toda parte a flor sem cor e sem perfume, por toda parte o homem sem
previdência, matando para sobreviver. Georges.” - Revista Espírita,
outubro de 1860, ao que Allan Kardec acresce: “Observação - para servir de
transição entre o quadro de Marte e o de Júpiter, seria necessário o de um
mundo intermediário, da Terra, por exemplo, mas que conhecemos suficientemente.
Observando-a, fácil é reconhecer que mais se aproxima de Marte que de Júpiter,
posto que, mesmo no seio da própria civilização, ainda se encontram seres tão
abjetos e tão desprovidos de sentimentos e de humanidade, vivendo no mais
absoluto embrutecimento e não pensando senão em suas necessidades materiais,
sem jamais terem voltado o olhar para o céu, que parecem ter vindo diretamente
de Marte.”
Todos tais informes resumem
suficientemente bem tudo quanto guardam os escritos kardecianos a respeito do
planeta vermelho - ademais, Marte é citado pontualmente ali e acolá, sem
acrescer em nada ao exposto. Não é necessário ser um entendido em astrofísica
para constatar-se que, por todas as aparências, o narrado, principalmente na
derradeira comunicação assinada pelo Espírito Georges, não tem correspondência
com os fatos - e por todas as aparências ressalta-se, pois que apostar na
absoluta idoneidade da mensagem é o mesmo que fazê-lo por crer na boa fé dos
países que tem perscrutado e explorado o planeta vizinho, no tocante a divulgar
tudo quanto lá encontraram sem impor nenhuma restrição ao escrutínio público.
Allan Kardec fora cauteloso com tais informes, na mesma medida que estes lhe
atiçaram a curiosidade e o desejo por conhecimento. No entanto, talvez mesmo
suspeitando da veracidade do que continham estes, pô-los a categoria de mera
suposição; a tanto que não constam de nenhuma das obras que pontificam as bases
da Doutrina dos Espíritos. A fim de examinar tais comunicações de além-túmulo
que dão conta das expressões da vida neste mundo, parte a parte, apontaremos
observações aos aspectos aí expostos.
- Condições planetárias
“Nesse planeta a terra é
árida; pouca verdura; uma folhagem sombria, que a primavera não renova; um dia
igual e cinzento. Apenas aparente, o Sol jamais prodigaliza suas festas; o
tempo escoa monótono, sem as alternativas e as esperanças das novas estações;
não é inverno, não é verão. Mais curto, o dia não é medido do mesmo modo; a
noite reina mais longa. (...) A igualdade da estação, a mesma em toda parte,
comporta, em consequência, as mesmas necessidades e as mesmas ocupações; (...)
Os elementos têm cólera cega do caos; o mar furioso separa os continentes sem
navegação possível; o vento ruge e curva as árvores até o solo; as águas
submergem as terras ingratas, que não fecunda; o terreno não oferece as mesmas
condições geológicas da Terra; o fogo não o aquece; os vulcões são
desconhecidos; as montanhas, pouco elevadas, não oferecem nenhuma beleza;
fatigam o olhar e desencorajam a exploração; enfim, por toda parte, monotonia e
violência;” - um estudo da Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço
(ou apenas NASA), agência estadunidense responsável pela exploração espacial,
lançado em 2004, indicou que Marte possuiu mares em seu passado remoto.
Atualmente, contudo, o planeta vizinho é um deserto rochoso de cor avermelhada,
graças a grande quantidade de ferro presente na composição de seu solo. O pouco
gelo existente encontra-se nos polos marcianos e é composto não de água, mas de
gás carbônico em estado sólido, uma substância que na Terra é conhecida como
gelo seco. Uma vez que a atmosfera é rica neste gás, durante o inverno o gelo
dos polos de expande quase alcançando o equador, numa glaciação sazonal
decorrente dos até -142º graus Célsius que o planeta registra nesta estação;
nos verões, a temperatura sobe para confortáveis +20º graus Célsius,
extinguindo a capa branca de neve carbônica, expondo o solo avermelhado. Ou
seja, assim como a Terra, Marte possui estações do ano, de duração mais longa,
contudo. Tal fato se deve a que o ano marciano tem 687 dias, dias estes de 24
horas e 37 minutos. Um fato curioso que pode indicar em parte o caráter do
Espírito comunicante diz respeito a alegação da existência de vida vegetal - em
Marte há tempestades de areia que deixam o céu rosado e que, vistas da Terra,
formam marchas mais ou menos uniformes, cuja semelhança levou os observadores
do passado a acreditarem-se diante de florestas. O conhecimento atual não
registra nenhuma forma de vida vegetal lá. Tais tormentas de areia são
violentíssimas, podendo cobrir todo o planeta, e durar mesmo anos; talvez um
dos poucos pontos de concordância parcial com a mensagem do Espírito. Claro,
qualquer leitor minimamente instruído há de lançar reprovações ao trecho que
trata da inexistência de vulcões marcianos, e de notar que as montanhas são lá
de pouca expressão. Não há como considerar tais apontamentos em vista do Monte
Olimpo, o maior vulcão do sistema solar, com impressionantes 27 quilômetros de
altura e 600 quilômetros de base; há ainda outros vulcões na superfície
marciana, tal como o Monte Ascraeus, com mais de 11 quilômetros de altura. Ao
que se constata, tais pontos são os de maior dessemelhança entre o descrito
pela comunicação espiritual e o que o conhecimento de hoje registra acerca de
Marte.
“(...) suas contínuas batalhas
não têm outro objetivo que não seja a posse de um terreno mais ou menos
abundante em caça. (...) Os animais, que por toda parte sofrem os reflexos
humanos, são mais selvagens, mais cruéis que em qualquer outro lugar. O cão e o
lobo são uma só e a mesma espécie, incessantemente em luta com o homem, que,
contra ele, se entrega a combates encaniçados. Aliás, menos numerosos, menos
variados que na Terra, os animais são a miniatura deles mesmos.” - até o presente
momento, nenhuma forma de vida, da microscópica a macroscópica foi encontrada
em Marte. A imaginação humana, por outro lado, sempre atribuiu a existência de
alguma forma de vida ao planeta vermelho. Decorrência da grande quantidade de
imagens que as sondas terrestres têm captado, os adeptos das teorias da
conspiração alegam ver nestas toda sorte de provas da presença de vida,
pareidolias que dão conta de haverem desde animais a homens-lagarto, passando
por macacos e bípedes humanoides indolentemente apreciando a paisagem. Todavia,
tais supostos registros não são mais que efeito de imaginações férteis.
- Expressões da vida humana
“Os seres que o habitam são
rudimentares; têm a forma humana, mas sem nenhuma beleza; têm todos os
instintos do homem, sem a nobreza da bondade. Entregues às necessidades
materiais, comem, bebem, batem-se, acasalam-se. (...) A (vida) deles é
curta como a dos insetos efêmeros. Os homens, que são apenas matéria,
desaparecem após curta duração. (...) Suas grosseiras habitações, baixas como
um casebre, são repugnantes pela incúria e pela desordem que nelas reinam.
(...) Caçam nas planícies intermináveis. Inquietos e instáveis como os seres
desprovidos de inteligência, deslocam-se incessantemente. (...) enfim, por toda
parte, monotonia e violência; por toda parte a flor sem cor e sem perfume, por
toda parte o homem sem previdência, matando para sobreviver.” - poder-se-ia
concluir em vista de tais trechos que a humanidade marciana é nômade, caçadora
e cuja vida, violenta, é de curta duração; suas habitações, pode-se inferir, a
exemplo daquelas erigidas pelos povos indígenas têm existência transitória; no
entanto, aqui é já território especulativo. Por conta disto as questões de
ordem espiritual, e os modos pelos quais seus supostos habitantes de organizam
socialmente pouco importam para provar-lhes a existência - o modo como é
tratado o gênero feminino, como procriam e cuidam dos filhos, sua relação com a
morte e que tais são acessórios inúteis. Enquanto não forem encontrados
vestígios de habitações, os despojos que lhos denuncie a presença, sejam
grandes ou pequenos, recentes ou antigos, pouco importará que da vida não
tenham senão uma visão primitiva e eminentemente material, ou que guardem algum
senso de pudor que os impeça de consumir a carne de seus semelhantes.
- Especulações imaginativas
Contudo, ainda que a mensagem
toda padeça de uma forte tendência a fantasia, alguns dados podem levar-nos,
com as luzes dos dias atuais, a imaginar a possibilidade, ainda que remota, que
parte do que ela contém possua expressões verdadeiras. E se o que narra não for
o presente, mas o passado do planeta Marte? Para onde foram seus habitantes, e
sua vida vegetal e animal? Extinguiram-se, é o que se conclui. Em 2011 a NASA
descobriu um buraco no solo marciano, cuja foto foi divulgada apenas em março
do presente ano; estima-se que tenha cerca de 35 metros de diâmetro e algo em
torno de 20 metros de profundidade, supondo-se ser uma abertura por onde um
veio de lava haja escapado no passado, uma vez que este se encontra localizado
na encosta do vulcão Pavonis Mons. Não poucos observadores quiseram crer que,
se há vida em Marte, ela se esconde no subsolo, e aquele orifício pode
representar uma passagem para este mundo subterrâneo. A fartura de vulcões e seus
tamanhos hiperbólicos podem ter eivado o subsolo marciano com cadeias de
cavernas, túneis e passagens imensas, onde toda uma humanidade esconder-se-ia
do clima hostil da superfície. Tudo leva a crer, na mensagem do Espírito, e a
lógica do Espiritismo remete a isto também, que os marcianos são vida material
grosseira o que, portanto, a faria visível, palpável, perceptível para os
sentidos da humanidade terrena - algo que se encontra no espectro oposto quando
se trata dos que habitam Júpiter, por exemplo, um mundo muito superior a Terra.
Ou não? Bem, se se levar em conta as diversidades elementares de cada mundo, a
expressão material da vida é uma loteria; Allan Kardec acerca disto tece um
comentário a questão 58 de O Livro dos Espíritos bastante pertinente para
o presente artigo:
“As condições de existência
dos seres que habitam os diferentes mundos hão de ser adequados ao meio em que
lhes cumpre viver. Se jamais houvéramos visto peixes, não compreenderíamos
pudesse haver seres que vivessem dentro d'água. Assim acontece com relação aos
outros mundos, que sem dúvida contêm elementos que desconhecemos.”
A vida em Marte pode, portanto,
manifestar-se por meios que escapem a captação da materialidade terrestre? Quem
pode sabê-lo? Tal exercício de especulação, ainda que leve a mais perguntas,
até o presente momento irrespondíveis, tece hipóteses em dissonância a
comunicação espiritual, dando senão ao estudioso a concluir por sua falsidade -
ou antes, seria mais prudente assumir a postura de Allan Kardec, aguardando
para um futuro hipotético o avançar do conhecimento humano acerca da existência
de vida fora da Terra, acrescida ou não de informes espirituais, de fato,
representação da verdade então conhecida do homem futuro. Até lá, Marte é um
planeta estéril e árido, um vizinho de planícies ferrosas e vulcões
superlativos, de invernos rigorosos e tempestades de areia planetárias, mas
também um mundo que incendeia a imaginação humana por suas latentes
possibilidades, desde há muitos milênios.