1.
Ademais toda comoção quase nula
causada pela existência mesma do presente blog, e de todo o seu conteúdo, o
derradeiro artigo aqui publicado suscitou domésticas palestras acerca de um
pormenor, no tocante a aparência que Jesus de Nazaré houvera de ter envergado
quando se sua passagem entre as gentes da Palestina do século I. A descrição
original atribuída ao historiador judaico-romano Flávio Josefo, e recuperada
pelo polímata Robert Eisler é espantosa, principalmente pela completa disparidade
que forçosamente leva ao leitor a comparação com toda a imagética cristã que
retrata a figura de Jesus - homem caucasiano, de olhos e cabelos claros, alto e
trajado de branco. A fim de ilustrar o artigo anterior, foram apanhadas parte
das imagens confeccionadas por Carl Heinrich Bloch, artista dinamarquês do
século XIX, que entre 1865 e 1879 executara 23 pinturas com cenas da vida de
Jesus sob encomenda do Palácio de Frederiksborg; os originais ainda se
encontram no castelo, que deixou de ser a residência da família real
dinamarquesa para tornar-se o Museu de História Nacional da Dinamarca. Tais
imagens foram, e ainda são largamente utilizadas em material promocional da
Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, os Mórmons. A reafirmar este
padrão europeu atribuído a Jesus, há ainda a tal carta de Públio Lentulus,
suposto político romano e, ainda, a quem se diz haver sido em existência
passado o mentor de Chico Xavier, o Espírito obsessor Emmanuel - que se faça a
justiça, o próprio Espírito reivindicou tal identidade para si, contando com o
crédito extenso de grande parte do ilegítimo movimento espírita nacional. Entre
esta última, considerada uma falsificação medieval, e as imagens confeccionadas
pelos pintores ao longo dos séculos não há distinções visíveis, senão
similaridades - para ressaltar a divergência entre esta e aquela atribuída a
Flávio Josefo, vale enxertar a descrição do historiador à apreciação:
“Naquela época, também,
apareceu um certo homem (de mágico poder), se é permitido chamá-lo de homem, a
quem certos gregos chamam de filho de Deus, mas seus discípulos o chamam de
verdadeiro profeta, capaz de ressuscitar os mortos e curar todas as doenças.
Sua natureza e sua forma eram humanas (homem de aparência simples, idade
madura, baixa estatura, três côvados de altura, corcunda, de rosto comprido,
nariz comprido e sobrancelhas unidas para espanto de quem o veja, com cabelo
escasso, mas separados no meio da cabeça à maneira dos nazarenos, e com barba
subdesenvolvida).”
Em verdade, para o Espiritismo
pouco causa a aparência que se deseja atribuir a Jesus - mas certo critério de
bom senso se espera haver do estudioso, que não recusa o proveito que toda
espécie de saber lhe acresce ao progresso próprio, para concluir que há
qualquer cousa de aberrante na imagem classicamente imputada a Jesus. Dado
conhecimento, mesmo que superficial, da história das regiões do mundo, dos
povos que as habitam e habitaram, das correntes migratórias ao longo dos
séculos e milênios pode resultar em concordar que um Jesus caucasiano seria
estranho - e mais estranho que tal aparência em dissonância a seus pares não
fora notada nos Evangelhos, menos ainda por Josefo que é, sob concordância
unânime dos acadêmicos, oficialmente a mais antiga descrição do aspecto de Jesus.
Não, para o Espiritismo a imagem não é nada; mas para o homem encarnado, é
natural ter suas ideias representadas por algo concreto, e este ponto focal ele
o deseja agradável segundo seus próprios padrões estéticos - é o que explica a
prevalência da imagem mais conhecida da Jesus, e do fato de ela se refletir nos
relatos, absolutamente ficcionais, das obras examinadas no artigo anterior; e
razão pela qual nos utilizamos das pinturas de Carl Heinrich Bloch, entre
outros, para o estampar.
Não é o desejo aqui compor um
ensaio pormenorizado de tudo quanto diga respeito a este aspecto da vida de
Jesus; ainda menos que isto deva importar a maneira como presente nas obras
citadas, para o espírita - não deve, e não demanda reiterar, são visões
particulares de seus compositores, de seus autores, que nenhum compromisso
doutrinário manifestaram em seus escritos, não fazendo mais que compor
sentenças de teor lírico a fim de levar os leitores ao pranto. No entanto, à
título de trazer informes, conhecimentos e saber acerca desta questão,
igualmente objeto de estudo do mundo acadêmico, escusamo-nos a solicitar a
licença de devotar algumas laudas a esta, no presente espaço, num exercício
escapista de compulsar a manifestação da vida humana em certas expressões no planeta,
a fim de alcançar alguma conclusão acerca do tema.
2.
Antes, no entanto, é preciso
compor um breviário do que é conhecimento comum entre estudiosos acerca da
aparência que Jesus de Nazaré envergara - e, antes que cause estranhamento aos
devotos da primeira hora, o que a Ciência busca é o Jesus histórico, o homem
que de fato pisou o solo poeirento da Palestina do século I; questões quanto a
atribuições metafísicas relativas a natureza de Jesus são mote da religião,
artigo de fé e objeto de culto. A historiografia e as disciplinas com que
guarda relações tem debruçado esforços contínuos para alcançar a realidade das
narrativas bíblicas, e muitas de suas descobertas e conclusões interessam para
dar a devida medida humana a Jesus, nos distanciando da versão culturalmente
construída dele, e largamente aceita pela irreflexão própria do senso comum.
Jesus é, como notado unanimemente
pelos fragmentos colhidos dos livros que foram analisados em artigo anterior,
representado com uma aparência caucasiana, alto, portando madeixas longas e
claras tal qual a barba, olhos cristalinos, e uma túnica alva. Seria demasiada
leviandade dar crédito a que, factualmente, esse Jesus de feições europeias
existira, e maior imprudência ainda divulgá-lo como expressão da verdade. Os
autores das obras em questão não apenas esforçaram-se na prática de tal
desajuízo como embusteiros alguns, ingênuos outros, como todos, partindo de uma
visão de fé, suficientemente maleável e fluída para abarcar a poesia e lirismo
necessária a dobrar as objeções mais engessadas, trabalharam na contramão da fé
raciocinada prescrita pelo Espiritismo. Ao fazê-lo se expuseram, e expuseram os
reais compromissos que os levaram a partir de premissas conhecidas e
reconhecidas como historicamente falsas - personalismo, fama, influência,
acumulo de fortunas, etc.; ou seja, nenhum objetivo nobre os norteou. Tão
prejudicial quanto foram os leitores que deram seu total crédito a tais
narrativas e asserções, trabalhando como divulgadores secundários desses
autores e suas obras, maculando ainda mais a imagem da Doutrina dos Espíritos,
fornecendo razão aos detratores pontuais, e o desdouro a generalidade das
gentes.
A figura de Jesus longe está
desta persona idealizada - o berço de tal exemplar deificado de homem europeu remonta
ao paganismo ocidental, cujos deuses de seus panteões eram representados com
longos e volumosos cabelos e barbas. Tal imagem veio a ser adotada como aquela
atribuída, por extensão, aos filósofos, votados a arte do pensar, pouco se
ocupando com questões de aparência. No medievo, a representação de Jesus
adotaria similaridades com os monarcas de então, cuja figura de poder indicava
portar cabelos e barbas longas - antes de tais fontes diretas de influências
incidirem na imagem pensada para Jesus, a arte paleocristã, contudo, o
representava como um judeu palestino do período, ou seja, com cabelos e barba
curtos. As imagens das moedas da época, das poucas que traziam a representação
de um judeu ofertavam tal mesma análoga estampa. E não poderia ser diverso,
estando Jesus inserido no mundo romano, onde o estilo adotado repudiava como
desonra para um homem portar cabelos crescidos, o que Paulo expressa claramente
em sua primeira carta aos Coríntios. A única exceção cabível para o comprimento
dos cabelos e barba de Jesus seria se houvera feito um voto nazirista, que
compreendia entre outras regras mais não consumir vinho - ele é visto o
fazendo, por exemplo, no Evangelho de Mateus, o que leva concluir que não
consumara tal voto e que, portanto, tinha cabelos e barba curtos.
Os registros fósseis do período
indicam que os judeus palestinos guardam correspondência aos judeus iraquianos
atuais, ou seja, tinham cabelos e olhos castanho escuros ou pretos, pele
morena, de subtipo oliva, guiando-nos a visão de um Jesus tipicamente oriental,
de porte árabe. Tais fósseis ainda vem revelar que a altura média de um homem
então era de cerca de 1,60cm., não sendo Jesus, portanto, muito mais alto do
que isto. Quanto ao que vestia, o traje típico era uma túnica chamada chiton,
constituída de uma camada externa de tecido mais fino chamada sindon, feita de
suas peças, uma frontal e outra traseira, ambas atadas nos ombros e ornadas por
listras até a bainha. A túnica interna poderia ser de uma só peça, que ia até
os joelhos apenas, pois túnicas longas eram próprias das mulheres ou, usadas
ocasionalmente por abastados e socialmente bem posicionados. Por sobre as
túnicas se usava um manto chamado Himation, confeccionado usualmente em lã.
Suas cores certamente estavam longe do púrpura e dos mais finos tons de azul e
vermelho, pigmentações caras reservadas apenas aos endinheirados - na
transfiguração, os Evangelhos registraram que as roupas de Jesus adotaram um
tom branco brilhante, o que faz supor que usualmente suas roupas não eram assim,
mas provavelmente desprovidas de tingimento, de tonalidades pasteis e sujas
pelas condições da aridez da região. As sandálias da época eram de uma
simplicidade estoica, sendo compostas de dois seguimentos de couro mais grossos
para a sola, com tiras finas a fixá-la nos pés, uma variação do que o
brasileiro encontra nos tradicionais chinelos Havaianas, certamente mais
rústicas e, creia-se, mas frágeis. E isto é tudo o que a historiografia pode
conjecturar acerca de Jesus, sendo-lhe impossível especular sem base quanto as
particularidades de sua expressão física e facial - até que se encontrem novos
documentos que venham trazer dados novos, a descrição de Flávio Josefo, por
mais chocante pareça, permanece o mais próximo de uma descrição fiel de Jesus;
e é a este que em pormenores analisaremos a seguir.
3.
Dispensado o primeiro seguimento
da descrição de Josefo, o foco no aspecto físico de Jesus se encontra nas
sentenças posteriores, onde afirma que sua aparência era simples, portanto,
condizente com a pobreza e humildade a ele atribuídos; pontua que sua idade era
madura, e aqui se poderia partir para uma polêmica igualmente fértil acerca dos
anos em que iniciara sua jornada pública e aquele em que encontrou seu fim - há
estudiosos que afirmam que Jesus morreu aos 36 anos, outros o levam até os 40,
de tal conta que esta maturidade presente no texto pode ser bastante relativa,
indicando um homem em idade adulta plena, diversamente de um jovem adulto de
vinte e poucos anos. Ou sua face e compleição deveriam estampar uma idade
inconciliável com a realidade de seus anos, reflexo da dureza inclemente da
vida àquele tempo, manifesta sob um sol onipresente e desgastante. Um dado nos
Evangelhos leva a tal conclusão - no livro de João, capítulo 8, versículos 56 a
59 encontramos o seguinte:
“Abraão, vosso pai, exultou
por ver o meu dia, e viu-o, e alegrou-se. Disseram-lhe, pois os judeus: Ainda
não tens cinquenta anos, e viste Abraão? Disse-lhes Jesus: Em verdade, em
verdade vos digo que antes que Abraão existisse, eu sou. Então pegaram em
pedras para lhe atirarem; mas Jesus ocultou-se, e saiu do templo, passando pelo
meio deles, e assim se retirou.”
A surpresa de seus pares indica
que imaginavam-no mais velho, um possível denunciador de sua aparência
degradada - Jesus provavelmente era precocemente envelhecido. A seguir, o
historiador nota que Jesus tivera uma baixa estatura, dando inclusive a medida
de três côvados - o côvado é uma unidade de medida milenar que variou ao longo
da História e do povo a que serviu-se dela; ao tempo da composição de tais
linhas por Flávio Josefo, o côvado egípcio era o de uso comum, e ele
representava cerca de 50cm., dando a Jesus 1,50cm. de altura, o que explicaria
o fato de ser este um aspecto de sua figura a se registrar, já que os homens de
seu tempo eram cerca de 10cm. mais altos - Jesus era, portanto, baixinho. Parte
de sua altura talvez se devesse a esta condição notada pelo historiador,
segundo a qual Jesus padecia de hipercifose torácica, a corcunda - é possível
que seja esta peculiaridade efeito da adoção de uma postura de trabalho, a qual
tenha sido submetido desde a infância, possivelmente associada a carpintaria
como profissão indicada de seu pai; mas aqui, seria preciso uma pesquisa
aprofundada acerca das condições de trabalho de um carpinteiro àquele tempo e
naquela região. Por outro lado, é possível que, baixinho, também fosse magro em
demasia, tendo uma curvatura de notar-se na coluna, sendo apontado como
corcunda sem que de fato apresentasse um quadro grave. A alusão feita ao rosto
e nariz compridos pode indicá-lo como homem do oriente próximo, um judeu comum,
ou mesmo deixar patente que, dentre estes, Jesus portava uma face e nariz
especialmente longos - mesmo dentre uma extensa gama de variações estéticas
presente nos povos orientais, particularmente dos originários do Oriente Médio,
há rostos e narizes mais belos que outros, de modo que se torna impossível
precisar tal valor atribuído a Jesus. Poderia ele ter um nariz invulgarmente
grande, adunco, destacando-se numa face de queixo longo e proeminente, ou nada
disso. Mas, encimando este nariz judeu, havia uma sobrancelha unida, o que
vulgarmente se conhece por monocelha. Da mesma forma, torna-se especulação
fantasiosa afirmar que era esta sobrancelha longa ou curta, grossa ou fina, bem
desenhada ou desgrenhada - mas, é forçoso concluir, pela paridade com os povos
do oriente, que o portador de uma monocelha não há teria discretamente, e sendo
homem Jesus talvez a tivesse em bom volume, a tal ponto que fez-se predicado
digno de considerar, e espanto de quem o via.
Mas que não nos enganemos quanto
aos padrões de beleza aceitáveis àquele tempo e região do mundo, pois far-se-ia
injusta comparação ao que hoje é tido por belo; no Tardjiquistão, por exemplo,
a monocelha destacada é sinal de beleza... em mulheres. Obviamente, nem todas
nascem com tal abundância nos sobrolhos, ficando a cargo das peripécias da
maquiagem unir o que nasceu separado. Há, inclusive, uma modelo grega, Sophia
Hadjipanteli, profissionalmente evidente por conta de sua rara beleza e de suas
enormes e unidas sobrancelhas. Mas nenhum pelo facial há de causar maior pasmo
que aqueles que enfeitaram as faces das mulheres do harém do Xá da Pérsia Nácer
Aldim Xá Cajar, que governou o país (atual Irã) entre 1848 e 1896. Além dos
sobrolhos unidos, suas esposas cultivavam o buço, e desconheciam a depilação ao
que indicam suas pernas repletas de longos fios, como registradas pelos
retratos que ele mesmo colheu de suas amadas, facilmente encontráveis na
internet. Era este o padrão de beleza, ao menos para o Xá da Pérsia; é um
desafio considerar o valor estético de tal cultura sob o padrão europeu
dominante no ocidente contemporâneo.
Jesus, outrossim, segundo a descrição,
padecia de calvície, ou alopecia androgenética, condição absolutamente comum ao
gênero masculino (cerca de 50% dos homens são acometidos de calvície), de
causas ordinariamente hereditárias, manifestando-se costumeiramente entre os 17
e os 23 anos de idade, mas podendo ter seu início aos 25 anos; entretanto, segundo
o texto, não fora completamente desprovido de cabelos, dando a crer que
estivesse em vias de tornar-se careca, como ocorre quando certos homens atingem
a meia-idade. Bem, havia fios suficientes para que os fendesse ao meio 'à
maneira dos nazarenos'; parte das causas a que se atribuí a calvície é o
excesso de oleosidade capilar, de modo que o volume deste parco cabelo que
Jesus ostentava está na razão da imaginação de cada um. Ao fim e ao cabo, mas
não menos importante, Jesus teria uma barba subdesenvolvida; possivelmente
curta, ou no pior cenário, repleta de falhas. Toda esta descrição elaborada por
Josefo compõe, ao que parece, a imagem de um homem destituído de atributos
físico agradáveis aos olhos, bastante feio se o leitor levar em conta a padrão
adotado consensualmente para Jesus. A considerar o livro de Isaías no Velho
Testamento, crendo haver tido a presciência do aspecto físico de Jesus, ele
assim profetizou no capítulo 53, versículos 1 e 2:
“Porque foi subindo como
renovo perante ele, e como raiz de uma terra seca; não tinha beleza nem
formosura e, olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o
desejássemos. Era desprezado, e o mais rejeitado entre os homens, homem de
dores, e experimentado nos trabalhos; e, como um de quem os homens escondiam o
rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum.”
Acaso de fato esta passagem
bíblica sublinha Jesus como alguém sem beleza física, dando crédito a descrição
de Flávio Josefo, é interessante pensar como o Espiritismo, milênios mais tarde
cravaria que o corpo físico não é nada, que o aspecto das formas é transitório
e desimportante frente ao Espírito - isto empresta a Jesus uma grandeza maior,
tendo ele exemplificado em si um manifesto contra o materialismo, desafiando o
preconceito social, e mesmo as ressalvas estéticas de seu povo. É de se
imaginar que sua atitude tenha, sendo ele miserável, feio e sujo, apontando
para os bem nascidos doutores da lei e lhes demonstrando um conhecimento
imensurável, a ponto de calá-los e, ainda, vindo ilustrar suas palavras em atos
considerados miraculosos, que se voltassem com toda fúria contra ele, levando-o
finalmente a morte. Sua presença era já um tapa às faces orgulhosas dos
fariseus e saduceus, um desafiante impávido cuja conduta e atitudes não eram
condizentes ao que sua aparência e origem humilde faria esperar-se dele. Uma
pesquisa superficial dos aspectos físicos dos povos do oriente próximo, dos
padrões estéticos que valorizaram em suas culturas ao longo dos milênios,
certamente, não daria a Jesus e seus pares a consideração que os paradigmas
atuais pedem no ocidente. Ao contrário: coerente é vislumbrar que,
transportados para os dias atuais, Jesus e seus discípulos mais próximos
parecer-se-iam a um bando suspeito de moradores de rua, pedintes sem pouso ou
destino, deambulando pelas ruas a cata da próxima refeição. E aqui os textos
bíblicos podem ainda trazer alguma luz - no Evangelho de João, capítulo 18,
versículos 4 a 8 encontra-se o seguinte:
“Sabendo, pois, Jesus todas as
coisas que sobre ele haviam de vir, adiantou-se, e disse-lhes: A quem buscais?
Responderam-lhe: A Jesus Nazareno. Disse-lhes Jesus: Sou eu. E Judas, que o
traía, estava com eles. Quando, pois, lhes disse: Sou eu, recuaram, e caíram
por terra. Tornou-lhes, pois, a perguntar. A quem buscais? E eles disseram: A
Jesus Nazareno. Jesus respondeu: Já vos disse que sou eu; se, pois, me buscais
a mim, deixar ir estes;”
A expressão cair por terra não
tem o significado literal de que seus captores, entre judeus e oficias romanos,
ajoelharam-se ou caíram ao solo diante da presença de Jesus - esta expressão
significa, aqui, que tal agrupamento admirou-se ante a figura de Jesus, a tal
ponto de não haver lhe dado o crédito e ter ele de identificar-se duas vezes.
Jesus, portanto, encontrava-se distante de corresponder às histórias que dele
se devia contar o povo - não é de duvidar que ia a mente de seus captores que
as ordens que cumpriam estariam equivocadas, pois sobre tal figura qualquer
acusação parecer-lhes-ia descabida. Jesus devia compor uma feição
insignificante, reles, desimportante, incapaz de chamar a atenção
exclusivamente por seus atributos físicos, muitíssimo distante do alto homem de
túnica branca, cabelos claros esvoaçantes e olhos translúcidos em tons de azul.
Não foi senão com grande surpresa que a reconstrução facial empreendida pelo
artista forense Richard Neave, executada já há alguns anos veio causar comoção
entre os crentes, pois está mais em paridade ao que realmente se supõe fora
Jesus numa contrastante comparação as suas usuais representações. Outro
especialista que recentemente debruçou-se a dar contributos a questão foi a
historiadora inglesa Joan Taylor, que lançou a obra What Did Jesus Look
Like? em 2018, onde ela própria executara um esboço de como teria sido
Jesus, corroborando o trabalho de Neave e outros estudiosos que tem revelado o
passado, fazendo emergir o Jesus histórico - não é de abalar, por efeito, que
frente aos artigos de fé e a descabida crença religiosa que tudo idealiza sem
considerar a razão, o verdadeiro Jesus permaneça revelado em palavras e atos, o
que deve realmente importar acerca dele. Quanto as muitas obras de arte que
eventualmente surgem junto ao ilegítimo movimento espírita brasileiro, tais
como supostas representações reais da face de Jesus, ou de sua mãe, não são
mais que a judiciosa expressão do acúmulo secular de crenças, influências e
superstições culturalmente aderidas a Jesus, a fim de vir representá-lo segundo
os anseios imagéticos ideais de seus autores. Ao fim e ao cabo, são tais obras
a manifestação dos Espíritos, que refletem a cristandade em sua generalidade;
esperar que tudo o que comuniquem esteja de par e passo a verdade é o que
constitui a grande chaga que impede a real prática do Espiritismo em território
nacional. E sem a correta prática, efeito do pleno entendimento, Jesus
permanece objeto de fé, jamais da razão - por isso as obras compulsadas no
anterior artigo não serem espíritas, expressões ficcionais das ideias de seus
autores.
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