Ariston
Teles é hoje reconhecido como o 'incorporador' de Francisco
Cândido Xavier - e o termo, usado equivocadamente, é este mesmo.
Produto do meio, e não da Doutrina dos Espíritos, Ariston Teles
fora amigo do médium mineiro, um dos inumeráveis que, após a morte
deste em 2002, deu-se a tarefa de enfeixar em livro as reminiscências
de tal relação. Chico Xavier é, e permanecerá sendo por muitos
anos ainda, um ídolo cultuado, independentemente do que prescreve o
Espiritismo acerca da questão. Aos que aderiram a esta crença
carente de provas segundo a qual o médium residente em Brasília
seria capaz de permitir manifestar-se ostensivamente a Chico Xavier,
a que se reconhecer a emulação competente dos maneirismos e tom de
voz do falecido - é real? Descrer do fenômeno em particular é
recomendável, ainda que a psicofônia seja medianimidade factual;
porém, provar que se trata do matuto de Pedro Leopoldo, eis aí o
desafio, e o é para os aderentes de sempre, antigos e novos, em
devoção.
Nos idos
de 1996, Ariston Teles arriscou-se literariamente com esta obra em
nossa posse, de título chamativo e apelativo. Nos anos que
antecederam a mudança do calendário gregoriano adotado no ocidente,
o milenarismo era o furor, conjurando toda sorte de conjecturas
acerca do final dos tempos - filmes-catástrofe não deixavam as
salas de cinema, enquanto séries de TV prescreviam invasões
alienígenas e o colapso civilizatório antevisto pelo bug do
milênio. O dito bug não veio, e os alienígenas também não,
e a folhinha de 1999 foi trocada pela de 2000; lá se vão vinte anos
em que novas formas de pensar e prever o fim do mundo pululam pelas
mídias. A geopolítica global incute no homem comum o medo ante a
mudança climática, prometendo extinção enquanto terraplanistas
ressurgem num movimento pretensamente sério, maculando o
conhecimento científico das eras. Naqueles idos o ensejo pedia uma
obra milenarista, e terrorista, que insuflasse temor nos corações
dos hipotéticos espíritas brasileiros - Ariston Teles não deixou
passar, e ainda que reconheça no prefácio deste que o livro não
pode ser reconhecido como tal por falta de conteúdo, ei-lo em sua
existência como objeto que evoca o intelecto, embora este,
singularmente não possa se afirmar que o faça.
Ramatis,
um Espírito flagrantemente pseudo-sábio previra, a seu turno,
agônicas convulsões de fin de sieclè que, como esperado,
não ocorreram. Nesta obra, Ariston Teles alinha-se aos visionários
do apocalipse, tendo nos caracteres próprios de uma sociedade em
transição os sinais precedentes do Armagedom - ele assim os
identifica. Todavia, antes que os fundamentar com argumentos de bom
volume, nota-se, e ele o aponta, que cada página registra os tópicos
de uma palestra - onde estaria o texto desta palestra? Não atinou
ele para tomar nota disto, transcrevendo seus dizeres em seguida? A
gramatura do papel que compõe as páginas, bastante denso, contribui
para a sensação de um livro confeccionado com o fito oportunista de
prover o milenarismo, somando às sensibilidades mais fragilizadas o
terrorismo próprio que acompanha os fins de ciclo dos calendários.
Fatores naturais pouco ou nenhuma influência sofrem pelo modo como o
homem conta o tempo, como o divide e subdivide, como classifica e
cria datas com significados próprios e especiais. O autor, o
brasiliense que alega falar por Chico Xavier, aqui se deixa levar
pelo zeitgeist, sonegando-se a uma abordagem mais crítica
para a questão, ainda de interesse tão nevrálgico para certos
indivíduos.
O fim do
mundo não deveria preocupar, mas que tantas pessoas o temam é
assunto oportuno para um estudo - não para o momento, contudo.
Importa notar, para tal o presente, que a obra de Ariston Teles foi
aqui escolhida para dar inicio a esta sessão justamente por sua
condição sui generis: como livro não se sustenta; como obra
alvitrada espírita, é um atentado a própria Doutrina. E o é por
seu extremo oportunismo, na ambição de amealhar algumas somas em
vista da iminência do novo século, e do novo milênio. Não é um
livro amparado pelas bases da Doutrina dos Espíritos que Allan
Kardec codificou; não aborda a questão a que se propõe de um
ângulo seguramente crítico, historiográfico e espírita, o que
garantiria, por certo, uma obra imensamente mais interessante, mesmo
que seu autor insistisse na defesa de uma visão catastrofista da
realidade. Aqui, contudo, não passa de um caça-níqueis em formato
de livro; observa-se a capa e seus dizeres sensacionalistas, bem como
o título falacioso, visto que a transição planetária prescrita
pelo Espiritismo não é neste abordada; pior, fica-se com a certeza
que o termo, para Ariston Teles é como que um sinônimo para o fim
do mundo. Recomenda-se cuidado com obras de tal qualidade, pois são
comuns; aninham-se sobre a corruptela de obra espírita, sem que
sequer Allan Kardec haja sido evocado, numa prática ordinária que visa
lesar o leitor pelo embuste barato, que pode sair caro.
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