Parafraseando um esquecido gênio
brasileiro, a verdade é impopular - segue-se que os defensores da
erraticidade espírita, aquela mesma revelada pelos Espíritos da Codificação a
Allan Kardec são, diuturnamente, mais e mais relegados ao ostracismo que a
verdade lhes impõe. Colônias Espirituais, Umbral e cousas do mesmo gênero não
existem; assim o sabia o Codificador, assim sabiam aqueles que leram e
estudaram as Obras Básicas e lhe foram coetâneos. E assim sabem aqueles poucos
que, insulados, deram-se a debruçar sincera diligência a desvelar uma Doutrina
que clama por seu lugar ao Sol, constrangida a um canto escuro da História por
seu abominável parasita teratológico, que atende pelo nome de movimento
espírita brasileiro. Paulo Neto é um, dentre milhares de diminutos
organismos que constituem o microbioma de tal monstruosidade, deambulando sobre
sua derme na feliz marcha dos ignorantes. Obviamente, a qualquer abalo que
atrapalhe o caminho, muitos hão de se insurgir contrários, forçando-se ao
embate, e a defesa da criatura da qual vivem. Assim, ante um alarido qualquer
que cogitou pela inexistência das Colônias Espirituais, fez surgir a presente
obra, de ponta a ponta um completo equívoco.
Para defender a realidade das
Colônias Espirituais, qualquer autor precisará de bases sólidas e, num livro
que tem a Codificação em seu título, era esperado que Allan Kardec fosse a
grande estrela a ser conclamada a demonstrar, inescapavelmente, que tais locais
de circunscrição de Espíritos são uma realidade axiomática. No entanto, como
isto não ocorre, por que nas Obras Básicas nada há que possa embasar uma
mentira de tal monta, o autor precisa apanhar do prestígio e obra de outros
autores que, a exemplo dele, propugnam dessa ignomínia. O baluarte a quem apela
não é senão outra que Yvonne A. Pereira, figura incensada por sua mediunidade -
Devassando o Invisível é a obra escolhida; desde já se saiba que em seu
conteúdo é citado cinco vezes o Espírito André Luiz, adjetivado por termos
meritórios quais 'eminente' e 'ilustre', um proceder que, para
efeito de fonte isenta e segura, o autor talvez devesse ter se esmerado mais em
buscar outra. Além disso, a autora carioca falecida em 1984 teceu curiosa
consideração acerca da mediunidade:
“Ora, sendo a mediunidade, em
geral, ao que se observa, uma sensação ou uma percepção, participante de
determinadas funções da consciência; e sendo estas entendidas como potências da
alma, que traduzem a sua individualidade, acreditamos que todas as criaturas
sejam dotadas dessa faculdade, em grau maior ou menor, dependendo de um estado
mais ou menos acentuado de desenvolvimento, ou experimentação. Todavia,
parece-nos que, no estado de desencarnação ou de desprendimento espiritual,
esse atributo da nossa individualidade anímica emerge espontaneamente, visto
que, no que a nós própria respeita, certos acontecimentos, desenrolados durante
aquele segundo estado, parecem confirmar nossa impressão.”
Mediunidade é comunicabilidade,
um atributo do homem como a fala, e justamente como esta pois porque se destina
a comunicar inteligivelmente uma ideia, uma mensagem, enfim, algo útil, bom e,
mais que isto, verdadeiro - não é uma sensação, como um comichão ou prurido,
menos ainda uma percepção, dado que o vocábulo tem um sem número de
significações, de tal conta que, podendo tudo significar, nada expressa. O uso
de tal vocábulo aqui, em particular, ecoa outras tantas palavras que são usadas
correntemente pelos espíritas e que, analogamente, são desprovidas da
capacidade de representar corretamente aquilo a que indicam - um bom exemplo é
a palavra energia, amiúde usada para referir-se ao fluido, mas não sabendo
senão superficialmente, ou nada sabendo acerca do fluido, o espírita tem
de expressar-se, ainda que erroneamente, de algum modo. Fluido é matéria, e
energia um atributo desta - mas há energia no fluido? O Espiritismo não o
indica, e quem em nome dele assim o afirmar positivamente precisará prová-lo.
Outro exemplo de emprego de terminologia errada, presente na obra, diz respeito
a constante referência a mediunidade de incorporação, ou apenas incorporação,
o que não existe e aponta, em realidade, para a psicofonia; além, é claro do
infame desdobramento, ou mediunidade de desdobramento, que não
define cousa alguma, embora se refira a mediunidade sonambúlica.
A leitura deste enxerto de Devassando
o Invisível parece indicar que, para a autora, a mediunidade é também
atributo do Espírito, configurando novo erro. Aliás, afirma, outrossim, que a
mediunidade é desconhecida dos estudiosos do Espiritismo, ao que apenas se
constata por tais trechos que ela não deixara nada a desejar a estes, e embora
enaltecida e vangloriada, Yvonne A. Pereira não vai muito além do que se vê de
parte dos médiuns que são mote de culto da choldra espírita. Ainda que
pela extensão venhamos a pecar, outra passagem interessa para um exame mais
atento - acaso firme-se em real dificuldade à autora definir a mediunidade, ou
crê-la presente no Espirito, vejamos como se sai ao lidar com outro fundamento
do Espiritismo, o livre-arbítrio. Para tanto, e afim de vir encerrar tal obra,
ela deseja abordar assunto que seja objeto das preocupações de companheiros de
ideal espírita; destarte, resulta após aguardar que lhe venha algo por
inspiração, em considerar o seguinte tema:
“Das teses aventadas, uma nos
parecera a mais sedutora: procurar saber, de nossos mentores espirituais, a
razão pela qual certos Espíritos desencarnados se supõem ainda vivos, 'qual o
mecanismo que os leva a se considerarem homens carnais' quando, em verdade,
muitas vezes, há séculos que estão separados da condição humana.”
Não será demasiado vir lembrar o
que responderam a Allan Kardec os Espíritos em O Livro dos Médiuns
acerca de seu papel como guias dos homens em suas descobertas - “Que mérito
teria ele (o homem), se não lhe fosse preciso mais do que interrogar os
Espíritos para tudo saber? A esse preço, qualquer imbecil poderia tornar-se
sábio.” - ou ainda, ao risco a que se expôs por assumir tal atitude, como
que ignorando que há sempre uma multidão de Espíritos prontos a tomar a
palavra, sob qualquer pretexto; tais prevenções, todavia, não a impediram
de, destemidamente partir junto de um suposto enviado do Espírito do médico
Adolpho Bezerra de Menezes, bastião moral febiano. Ladeada por este suposto
emissário, adentra pocilga onde seus ocupantes, maltrapilhos Espíritos
divertem-se com álcool, tabaco, conversas infrutíferas e muita cantoria.
Informa seu cicerone que tais sujeitos intervinham negativamente na vida dos
encarnados. Questiona Yvonne se não haveria meios 'que os impeçam de
(cometer) tais monstruosidades', ao que o Espírito responde:
“(...) será oportuno
considerar que, da mesma forma, monstruosidade será a sociedade deixar um
órfão, ou um filho de pais miseráveis ou delinquentes, criar-se ao abandono,
pelas ruas... E a sociedade o faz agora, e o fez com estes mesmos que está
vendo aqui... Monstruosidade será também omitir providência humanitária para
que o jovem abandonado, ou o pobre, se instrua, eduque e habilite de modo a
furtar-se à humilhação da ignorância, prendendo-se na escola do dever e da
honestidade... No entanto, estes que aqui vemos foram banidos pela sociedade,
que lhe não facilitou escola, nem educação, nem exemplos bons, senão a dureza de
coração com que os tratou... Não se instruíram porque não tiveram meios de
remunerar professores, e as escolas públicas nem sempre são acessíveis aos
deserdados, como estes foram... Não puderam educar-se porque o lar é que modela
os caracteres, e eles, desde a infância, viveram perambulando pelas ruas... Tal
como os vemos, são ainda frutos da sociedade... Sua impiedade foi libada na
impiedade que receberam... Tornaram-se criminosos inveterados, na Terra e no
Além, porque foram vítimas do crime de egoísmo da sociedade... Portanto,
pertencem à sociedade terrena, esta é afim com eles e eles vivem nos ambientes
que lhes convêm...”
Seguintemente, o Espírito afirma
caber ao encarnado, por vontade e alvitre, contrapor as influências de
Espíritos de tal natureza - mas esta inferência após um discurso tão afinado
aos preceitos da sociologia materialista, que propõe impor a culpa do criminoso
às suas vítimas, é de indagar se não caberia a mesma lógica para com estes
Espíritos, tornados obsessores, quando de seu contato com os encarnados. Ou
seja, que culpa há por parte da sociedade, uma vez que ela não anula o
livre-arbítrio do ser? Não há tanta miséria que sufoque absolutamente todas as
alternativas do sujeito encarnado por manter-se, senão ativo nas lides benfazejas
da bonomia, ao menos afastado do delito e do vício. O proceder adotado por este
Espírito a acompanhar Yvonne A. Pereira é um denunciador infalível do alcance
de seus saberes, de seu progresso - deve-se considerar sua fala? Não parece
haver a intenção de instar culpa ao leitor? Não seria um procedimento mais
correto tratar da questão por outros meios?
No mais, o que importa para Paulo
Neto está apartado do mourejo com que Yvonne A. Pereira lida com o
livre-arbítrio, pois que a médium, igual defensora da existência das Colônias
Espirituais, faz referência a obra de outros tantos autores a fim de, a seu
turno, também dar base a esta descabida doutrina - assim, além de Ernesto
Bozzano e George Vale Owen, Léon Denis é arrolado para esta reunião de insanos.
Ainda não foi a vez de Allan Kardec integrar as festividades. Um Paulo Neto
entusiasmado vem concluir:
“Portanto, com esses três
autores citados, a médium Yvonne A. Pereira conseguiu nos convencer da
realidade das colônias espirituais, ou construções diversas no mundo
espiritual. Sim, ela com as provas apresentadas, venceu o nosso 'achismo'.”
Notoriamente, a figura de Léon
Denis é a que salta aos olhos do autor, que sentencia:
“O que achamos fantástico é a
menção que Yvonne faz de personalidades renomadas terem comungado com essa
ideia; entre elas, e de um modo especial, cita nada menos que Léon Denis
(1846-1927), que sabemos ter sido o continuador de Kardec, após o seu
desencarne.”
Mais adiante, prossegue:
“Apresentar Léon Denis como
defensor da causa foi algo como que um tiro certeiro no alvo, porquanto não há
o que se falar de serem antidoutrinárias as colocações dele e, muito menos, que
tenha dito absurdos, produto de sua imaginação.”
Lamentavelmente para Paulo Neto,
o druida de Lorena embora respeitável, não avança intacto ao escrutínio de um
análise mais atenta. Em Depois da Morte, os leitores hão de encontrar o
trecho seguinte:
“É perispírito que garante a
manutenção da estrutura humana e dos traços fisionômicos, e isto em todas as
épocas da vida, desde o nascimento até a morte. Exerce, assim, a ação de uma
forma, de um molde contrátil e expansível sobre o qual as moléculas vão
incorporar-se. Esse corpo fluídico não é, entretanto, imutável; depura-se e
enobrece-se com a alma; segue-a através das suas inumeráveis encarnações; com
ela sobe os degraus da escada hierárquica, torna-se cada vez mais diáfano e
brilhante para, em algum dia, resplandecer com essa luz radiante de que falam
as Bíblias (antigas) e os testemunhos da História a respeito de certas aparições.
É no cérebro desse corpo espiritual que os conhecimentos se armazenam e se
imprimem em linhas fosforescentes, e é sobre essas linhas que, na reencarnação,
se modela e forma o cérebro da criança.”
Léon Denis parece omitir um fato
conhecido e reconhecido de todo estudioso do Espiritismo acerca da natureza do
perispírito - ele afirma ser este envoltório fluídico um apenas, acompanhando o
Espírito em suas múltiplas vidas; verdade, mas apenas em parte. Transladado a
outro mundo, este corpo fluídico é abandonado como a uma veste, e tão rápido
quanto se pode supor a velocidade do pensamento, visto que é constituído da
matéria comum aos elementos do orbe onde se encontra o Espírito. Faltou aqui um
cadinho mais de capricho na elaboração da questão por parte de Denis - a ideia
que evoca acerca dos contornos diáfanos e radiantes que o perispírito assume no
decurso do progresso do Espirito, assim apresentada, pede explicações
acessórias que aí não se encontram. Aspecto de fato indefensável é sua
afirmação de haver um cérebro no perispírito - um pioneirismo que se refletiria
décadas após, e de modo mais ostensivo na literatura do Espírito André Luiz. Um
infeliz erro, lamentavelmente.
Em O Problema do Ser, do
Destino e da Dor, Léon Denis vai contra O Livro dos Espíritos em sua
questão de número 298, ao defender a existência das almas gêmeas, ou como
denomina Allan Kardec, metades eternas:
“Muitas almas, criadas aos
pares, são destinadas a evoluírem juntas, unidas para sempre na alegria como na
dor. Deram-lhes o nome de almas-irmãs; o seu número é mais considerável do que
geralmente se crê; realizam a forma completa, mais perfeita de vida e do
sentimento e dão às outras almas o exemplo de um amor fiel, inalterável,
profundo.”
Sobram lirismo e poesia, falta
conhecimento ao venerável e suposto continuador de Allan Kardec. Quanto a
suposição que versa Denis como herdeiro e continuador da missão do Codificador,
aliás reiterá-se, defendida na obra de Paulo Neto, vale uma judiciosa
observação. Para tanto, algumas passagens de Obras Póstumas, em que
Allan Kardec solicitando instruções acerca de um possível sucessor, obtém uma
longa resposta, da qual se destacam os seguintes trechos:
“A ti te incumbe o encargo da
concepção, a ele o da execução, pelo que terá de ser homem de energia e de
ação. Admira aqui a sabedoria de Deus na escolha de seus mandatários: tu
possuis as qualidade que eram necessárias ao trabalho que tens de realizar,
porém não possuis as que serão necessárias ao teu sucessor. Tu precisas da
calma, da tranquilidade do escritor que amadurece as ideias no silêncio da
meditação; ele precisará da força do capitão que comanda um navio segundo as
regras da Ciência. Exonerado do trabalho de criação da obra sob cujo peso teu
corpo sucumbirá, ele terá mais liberdade para aplicar todas as suas faculdades
ao desenvolvimento e à consolidação do edifício.”
Fora Léon Denis este homem? A
cada um caiba examinar a biografia de tal venerável pioneiro das lides
espíritas, ir ao seu encontro por suas obras, seus artigos, tudo quanto legou e
acerca dele foi composto para se responder, de fato, tal indagação - de nossa
parte, cremos ter sido um dos mais contundentes laboradores do Espiritismo nos
anos subsequentes ao decesso de Allan Kardec. Estes seus equívocos, e alguns de
seus posicionamentos pessoais, contudo, depõem contra a asserção, mui
mitificada, de que fora o continuador mor da obra principiada pelo mestre
lionês. Esta mitificação, aliás, é própria de um meio afeito as práticas e
condutas mais reprováveis oriundas da religião - a Paulo Neto parece faltar
preencher profundas lacunas instrucionais. Contudo, ainda que pareça sincero
devoto do espírito de pesquisa na busca da verdade e do conhecimento, ele se
mostra a nu quando, por fim se recorda de trazer o Codificador para a
celebração de suas teses, infelizmente indo de encontro a outros tantos
supostos investigadores da questão, concluindo erroneamente que:
“Entendemos que as colônias
estão em completa semelhança com as características dos mundos transitórios,
referidos nas questões 234 a 236 de O Livro dos Espíritos, que são apenas
acampamentos temporários.”
Embora conheça as questões
referidas, não parece capaz de as compreender - na edição de maio de 1859 da Revista
Espírita, em artigo intitulado Mundos Intermediários ou Transitórios,
Allan Kardec indaga o Espírito de Santo Agostinho acerca destes orbes, ao que
este afirma o já sabido em O Livro dos Espíritos - tais mundos são
planetas, e não cidades fluídicas que pairam nas altas camadas atmosféricas
destes; são estéreis de vida física; e assim o são porque os Espíritos que os
habitam de cousa alguma precisam; não há nenhum atualmente dentre os mundos que
constituem o sistema solar ao qual a Terra pertence; mas, a Terra já foi um
mundo transitório em seu passado, no período de sua formação; tais mundos
subsistem na condição de estações de pouso, e não como locais em que será
preciso laborar para se obter uma moradia, como descrito em Nosso Lar,
por exemplo. Seria preciso um grande dano cognitivo para se enxergar aí, nas letras
do Codificador, as descrições narradas pelo Espírito André Luiz em suas obras,
e nas de outros autores surgidos nas décadas subsequentes, encomendadas com o
fito de enriquecer seus editores. Contudo, a razão pela qual se aponta os
mundos transitórios como sendo as Colônias Espirituais é para as conformar ao
princípio doutrinário da pluralidade dos mundos habitados, e não a da
erraticidade - é esta uma manobra de prestidigitação literária com o fim claro
de manter a tese intacta, mesmo que comprometa a fonte original, qual seja o
Espírito André Luiz e suas obras, pois que não se trata de mundos transitórios
o que o leitor encontra em Nosso Lar, nem em Cidade no Além de
Heigorina Cunha, ou em Violetas na Janela de Vera Lúcia M. De Carvalho.
Quando arrolada a erraticidade aí, a tese das Colônias Espirituais esboroa
facilmente, e é isto que o autor precisa evitar a todo custo. Uma vez que haja
se convencido, por meio da obra de Yvonne A. Pereira acerca da realidade das
narrações do Espírito André Luiz e congeneres, Allan Kardec se lhe surge como
incomodo penetra, a quem ora lhe tem utilidade, ora é desprezado por suas
asserções. Assim Paulo Neto aborda a questão 87 de O Livro dos Espíritos,
comprovando que a erraticidade e a tese que defende são inconciliáveis:
“A afirmação de não haver
região determinada e circunscrita no espaço nada tem a ver com a existência ou
não da colônias espirituais, que, atualmente, tantos companheiros atacam;
porém, ao que tudo indica, eles estão levando em consideração o conceito, então
vigente à época de 'céu' e 'inferno' localizados, ou seja, como locais
circunscritos, como sendo um espaço físico delimitado.”
Ora, há aqui uma torção
argumentativa bastante hábil que, apenas os aderentes da ideia, ou aqueles tão
absolutamente inábeis na leitura crítica adotam sem precauções - solicitamos a
explicação de por que não tem nada que ver a afirmação da inexistência de
regiões circunscritas no espaço, com o fito de conter Espíritos errantes, com a
existência de Colônias Espirituais. Uma Colônia Espiritual não é uma cidade, e
uma cidade localizada nas altas camadas atmosféricas do planeta, aí inserida
num deserto lodoso destinado a Espíritos sofredores, conhecido pelo termo
Umbral? Ainda que este, por todas as fontes conhecidas e compulsadas se
constitua num deserto que perfaz toda a extensão do globo terrestre, ele
encontra seu limite nas Colônias Espirituais, e estas neste, o que claramente
os circunscreve, geográfica e espacialmente - as ilustrações esquemáticas encontradas em Cidade no Além,
obra coadjuvada por Chico Xavier, houvera apresentado erro nesta divisão do
espaço circundante ao planeta em esferas espirituais, porque não as corrigiu o
médium mineiro? Porque não foram reprovadas por André Luiz ou Emmanuel? Acaso o
tenham feito, não se lhes conhece o réprobo - na máxima segundo a qual o
silêncio aprova, questiona-se afinal, em que resume-se o conceito das Colônias
Espirituais para Paulo Neto?
Qualquer estudioso considerará,
após pesquisar cuidadosamente, que a opinião una de André Luiz, que não deixa
de adaptar ideias pregressas, mas que nem longinquamente correspondem as normas
apresentadas por Allan Kardec em o Controle Universal dos Ensinamentos dos
Espíritos, foi ao longo das décadas adaptada ao gosto do mercado que, qual
hímen complacente aceitou novas ideias, novas concepções imagéticas mais
fantásticas e mais espetaculares, sem se romper e sem deixar de prestar
deferência a fonte original. Todavia, o que teima em não se adaptar acaba
menosprezado ou deformado - eis o caso das Obras da Codificação, e a atitude do
autor de As Colônias Espirituais e a Codificação condiz ipsis
litteris a de todos aqueles que o antecederam, erroneamente afirmando que a
Doutrina dos Espíritos encontra-se inacabada, procedimento que adota já no
terceiro capítulo de sua obra. Este tema o abordamos em artigo aqui publicado
em 10 de agosto de 2019, desmantelando ponto por ponto as interpretações
personalíssimas, também encontradas no livro em análise das passagens escaladas
das Obras Básicas, as quais usa o autor para fazer valer sua visão.
Há uma conveniente miopia na obra
de Paulo Neto, que ainda padece de uma pesquisa desleixada - a questão de
número 1017 (em algumas traduções é a 1016) de O Livro dos Espíritos
sequer surge, possivelmente e, uma vez mais, porque não convém trazê-la ao
conhecimento do leitor. Já por si esta implode a tese das Colônias Espirituais,
como fizemos notar em artigos anteriores. Nada temos contrário a quem quer que
escolha aderir as ideias que mais se conjuguem a seus pendores naturais e
particulares, ainda menos a quem opte por escapar ao trabalho de
voluntariamente aumentar o volume do próprio conhecimento, mas por nenhuma paga
ou sob quaisquer escusas pode-se permitir que a figura de Allan Kardec, e a
Codificação espírita sejam evocados a dar distinção a ideias e conceitos
oriundos de Espíritos pseudo-sábios. Menos ainda se estes venham desfigurar
qualquer dos fundamentos componentes da Doutrina dos Espíritos - a erraticidade
é um deles, tão importante quanto cada um dos demais para a compreensão coerente
do Espiritismo. Que se deseje conjurar Yvonne A. Pereira, Léon Denis, George
Vale Owen, Enerto Bozzano, André Luiz, Emmanuel ou qualquer outra figura
enaltecida pelas gentes que se creem espíritas, é esta da responsabilidade de
cada um, autor de uma obra qual esta ou não, para defender que exista o que
quer que seja para além dos limites da morte física. Chamar a isto de
Espiritismo, contudo, é algo que nenhum espírita sério, estudioso, consciente e
crítico há de permitir se faça - não há o que censurar na crença das Colônias
Espirituais, desde que fique claro não se tratar de Espiritismo. Ostentando tal
título, a obra de Paulo Neto é um crime de lesa-cultura. E todo aquele que um
dia sequer considerou seriamente a tese das Colônias Espirituais e similares,
para depois, aprofundando estudos nas Obras Básicas dar-se consciente do engodo
a que fora exposto, compreende perfeitamente os sentimentos que resultam disto.
Examinem tudo, absolutamente tudo, é o que conclamamos aos que de fato desejam
conhecer o Espiritismo.
“841. Para respeitar a
liberdade de consciência, dever-se-á deixar que se propaguem doutrinas
perniciosas, ou poder-se-á, sem atentar contra aquela liberdade, procurar
trazer ao caminho da verdade os que se transviaram obedecendo a falsos princípios?
Certamente que podeis e até
deveis; mas, ensinai, a exemplo de Jesus, servindo-vos da brandura e da
persuasão e não da força, o que seria pior do que a crença daquele a quem
desejaríeis convencer. Se alguma coisa se pode impor, é o bem e a fraternidade.
Mas não cremos que o melhor meio de fazê-lo admitidos seja obrar com violência.
A convicção não se impõe.”
“A caridade consiste em fazer todos os esforços para colocar a luz em
evidencia pois aquele que crê que possui uma parte da verdade está obrigado
pela lei de honra e divulgá-la. O medo das consequências que possam resultar da
discussão nunca deve deter o pensador. Jesus, esse sublime modelo, não pensava
duas vezes antes de tratar os fariseus como raças de víboras e sepulcros
caiados. Isso deve-se a que ele compreendia que todo aquele que não combate o
erro do qual tem conhecimento, torna-se responsável, e converte-se em cúmplice
das desgraças que esse erro pode acarretar.” - Gabriel Dellane