quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Até o ano que vem

Organizados os Espíritos encarnados no planeta Terra segundo seus meios, anseios e progresso íntimo, a fim de gerir o tempo transcorrido do orbe em suas circunvoluções espaciais, em sua relação com estes, criaram-se os meios de mensurar, classificar e subdividir tal fenômeno. Assim sendo, o tempo que a humanidade goza não ficou apenas no âmbito da reação natural às auroras e aos ocasos, ou entre o que se convencionou chamar dia e noite. Os calendários, adotados segundo a particularidade de diferentes povos e culturas do mundo, são o testemunho de milhares de anos de observação do tempo, das sazonalidades decorrentes dos movimentos do planeta ao redor da estrela que lhe faculta possuir vida. A contagem e o registro do tempo sedimentou a civilização - permitiu a agricultura, a pecuária, a exploração de diferentes recursos naturais para o desenvolvimento humano, para seu progresso enfim. Natal e Reveillon são, outrossim, convenções, que vão ao socorro da necessidade em adotar o natural nascer e fenecer do dia numa escala muito maior, prescrevendo eternos começos e fins para ciclos de tempo que se contam em semanas, quinzenas, meses, anos, décadas, séculos, milênios, etc. - com o acréscimo de resignificações religiosas atadas a fenômenos naturais, como equinócios e solstícios, as festividades pagãs ou pré-históricas se propagaram através da história, de sociedade em sociedade desde então. Destarte, o Natal é celebrado no solstício de inverno, no hemisfério norte, que ocorre próximo ao 25 de dezembro segundo o antigo calendário romano (o calendário gregoriano em uso no ocidente aponta o 22 de dezembro como data mais aproximada do fenômeno) - este fato é notado pois aí a noite possui a maior duração do ano em relação ao dia; a partir do dia seguinte ao solstício, as noites começam a ter uma duração menor, e os dias uma duração maior, o que simbolizava para os povos primevos a vitória da luz frente a escuridão, do Sol contra a noite. A primitiva humanidade cultuava o Sol, como os Persas, por exemplo - a partir do terceiro século depois de Cristo, o Império Romano incorporou esta adoração por meio do culto ao deus Sol Invicto, que determinou o nascimento desta deidade no dia 25 de dezembro, dia em que sua personificação vence a escuridão, e os dias passam a ser maiores em relação as noites, ou seja, o solstício de inverno no hemisfério norte. Com o avanço cristão no seio de Roma, este foi se interpolando aos cultos já existências, enquanto aqueles sofreram igual processo, adotando aspectos do cristianismo. Por convenção, portanto, e tendo Jesus seu nascimento associado ao deus Sol Invicto, o 25 de dezembro passa a ser comemorado como dia do nascimento deste Espírito de avultado progresso. Não apenas Jesus, mas uma série de avatares, deuses e iluminados do mundo antigo tem seu nascimento registrado nesta data, como Herácles, Hórus, Krishna, Mitra, Dionísio, entre muitos outros. Muito embora, na condição de espíritas sejamos instados a racionalizar tais ordens de questões, é preciso reconhecer o valor social destas efemérides, respeitá-las e, ainda que não se deseje fazer parte de quaisquer festividades correlatas, não sujeitar quem vê nestas um mote para culto os argumentos do intelecto. Cada Espírito estará pronto segundo sua maturação natural, não cabendo empreender uma cruzada descabida e inútil contra uma prática que remonta ao princípio da senda humana na Terra. Para os que nos acompanharam desde este ano, quando iniciado tal despretensioso trabalho, desejamos um ano que se avizinha de excelentes realizações, sucesso e paz. Para encerrar esta que é a derradeira postagem de 2019, deixamos o registro de uma das fotografias tomadas do Espírito materializado de Katie King, que dobrou a incredulidade de Sir William Crookes, um dos maiores sábios nascidos em território inglês, com nossas redobradas recomendações de leitura e exame das obras que assinalam seus experimentos. Até 2020.



sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Qual o tamanho do Espírito?

No ano de 1984 um filme de origem americana chegou aos cinemas causando grande comoção – Ghostbuster, ou Os Caça-Fantasmas. Em 1989 ganharia uma continuação intitulada apenas Os Caça-Fantasmas II, decorrência direta do sucesso da primeira aventura de três parapsicólogos que estudam fenômenos psíquicos, e fazem da caça e captura de fantasmas sua profissão. Alguns dos conceitos comuns a parapsicologia, e a certas correntes de estudo e pesquisa espiritualista já se encontravam presentes no primeiro filme, mas é em sua continuação que curioso elemento da trama interessa. Havendo encontrado um rio do que as personagens de Dan Aykroyd e Harold Ramis chamam de lodo psicoativo sob a cidade de Nova York, eles colhem uma amostra e com este fazem uma série de experimentos, animando uma torradeira que reage a música, por exemplo. Qualquer indivíduo mais ou menos familiarizado aos conceitos da Doutrina dos Espíritos viu ali o fluido – na realidade, o fluido está presente desde o primeiro filme, quando afirmado de que tal substância são constituídos os fantasmas. De fato, a personagem de Bill Murray é quem acaba se havendo em lidar com os resquícios deixados pela passagem dos espectros, um fluido mais semelhante a um gel do que aquele que já se observou em sessões reais de materialização.

Para algumas correntes de estudos e pesquisa de fenômenos mediúnicos, da qual o filme lança mão em seus elementos, o fluido é chamado de ectoplasma – o termo foi cunhado em 1894 por Charles Richet, inventor da Metapsíquica. O uso errôneo deste termo para designar o fluido quando sofre certa condensação nos fenômenos de materialização é comum nos meios supostamente espíritas. Que fique claro, o termo é da Metapsíquica e não do Espiritismo; e, se nos permitamos o parêntese, Charles Richet embora francês, pouco deu atenção ao Espiritismo de Allan Kardec. Em O Tratado de Metapsíquica, um catatau de mais de 600 páginas, dedica poucas linhas a ele, equivocando-se ao trata-lo como médico; não apenas isso:

Essa teoria tem entretanto, um lado fraco, dolorosamente fraco. Toda a construção do sistema filosófico de Allan Kardec (que é aquela mesma do espiritismo) tem por base está brilhante hipótese de que os médiuns, nos quais se diz que os espíritos estão incorporados, não se enganam nunca, e que as escritas automáticas nos revelam verdades que é necessário aceitar, a não ser que esteja influenciado por maus espíritos. Nestas condições, se acompanhamos a teoria de Allan Kardec, seremos também levados a aceitar como dinheiro contado todas as divagações do inconsciente, as quais, salvo exceções, dão sempre mostra de uma muito primitiva e pueril inteligência. É um erro bem grave construir uma doutrina com as palavras dos tais espíritos, que são pobres espíritos.

Uma opinião que apenas pode ser exarada de alguém que jamais leu a obra espírita, que jamais pôs olhos a, por exemplo, o capítulo XXI de O Evangelho Segundo o Espiritismo. À segunda edição de sua obra, entretanto, Richet surge cheio de queixumes diante da repercussão desta entre os espíritas franceses:

Os espíritas receberam o meu Tratado de Metapsíquica com grande frieza. Compreendo o seu estado de espírito. Em vez de aceitar a sua teoria ingênua e frágil, propus aguardar, para se constituir qualquer teoria defensável, que os fatos fossem classificados, codificados, marcados, acompanhando-os das necessárias exigências do método experimental. Ao contrário, os espíritas julgam possuir já uma explicação adequada para todos os fenômenos. Disse-lhes que a sua explicação era hipotética, mas não hesitei em reconhecer que em certos casos, raros, a hipótese espírita, simplista, parecia ser preferível. Creio bem que isso não é senão uma aparência. Portanto a aparência continua nela. Se os espíritas fossem justos, reconheceriam que a minha tentativa de fazer entrar na ordem dos fatos científicos todos os fenômenos que constituem a base de sua fé, mereceria eu verdadeiramente alguma indulgência.

Suscita a qualquer estudioso do Espiritismo indagar das razões de tão indisfarçável ressentimento, visto que as inferências de Charles Richet parecem apriorísticas; não seriam os adeptos da Doutrina dos Espíritos a constatar como frágil e ingênuo quem afirma que Espíritos incorporam em médiuns, ou que Allan Kardec não dispensou linhas sem fim a expor critérios para o exame das mensagens dos Espíritos? Este é, tão somente, um capítulo mais na senda dos caminhos tortuosos pelos quais seguiram e seguem os aderentes da realidade do Espírito, que antes de haverem deixado de lado suas diferenças, coerentemente agindo diante da evidência de uma existência espiritual, a essencial, parecem haver se guiado pelos anseios do ego e do egoísmo, valorizando mais a matéria.

Diversamente do que ocorre em Caça-Fantasmas II, o ectoplasma, ou antes o fluido num estado particular de condensação, não é uma substância de fácil aquisição, tampouco de fácil conservação -  Juliette Bisson, como o descreve Arthur Conan Doyle em seu livro A História do Espiritualismo, madame da sociedade francesa e entusiasta dos fenômenos mediúnicos, empreendeu cinco anos de constantes experimentos com a médium Marthe Béraud, cognominada Eva Carrière, a quem adotou como uma filha. Em tais sessões, o cientista alemão Dr. Schrenck Notzing controlava estritamente as condições para evitar fraudes, e o resultado está hoje nos anais do espiritualismo mundial - o autor, acerca destes afirma curiosa iniciativa dos experimentadores:

Com o consentimento da médium foi cortada uma pequena porção (do fluido). Dissolveu-se na caixa em que foi colocada, como se fosse neve, deixando umidade e algumas células que poderiam provir de um fungo. O microscópio demonstrou células epiteliais da membrana mucosa, das quais a coisa parecia originar-se.

Em outras ocasiões, com diferentes médiuns e pesquisadores, obteve-se toda sorte de substâncias, inclusive cabelo humano colhido de uma pequena cabeça materializada, demonstrando tratar-se esta de matéria volátil, flexível, capaz de assumir formas, texturas e propriedades ao sabor dos pedidos daqueles que desejaram com ela colher resultados peremptórios, atestando sua existência de modo inegável. Estes e outros tantos relatos em que o fluido condensado (ou ectoplasma como querem os adeptos da Metapsíquica) facultou a materialização de Espíritos, traz a memória os registros dos experimentos de Sir William Crookes com a médium Florence Cook, cuja mediunidade manifestava o Espírito de uma moça chamada Katie King. Ao tomar-lhe o pulso o cirurgião Dr. James M. Gully, nada pode aferir buscando-lhe os batimentos cardíacos - porém, ao que o Espírito compreendendo o objetivo deste, fez reagir-lhe a substância fluídica de que se constituía, apresentando na sequência uma pulsação firme qual se se contasse de retorno ao mundo dos encarnados.


 Todo este introito resulta do desejo de responder a questão que intitula o presente artigo, vindo por fontes várias demonstrar irrecusavelmente a existência do perispírito e da matéria de que este se compõe, o fluido. Conceber o Espírito destituído de forma, ou constituição particular, divisando-lhe a nu em sua natureza imaterial é tema da imaginação. Desde a mais remota Antiguidade, o corpo sútil que dá individualidade e envolve o Espírito é conhecido, sendo no Egito chamado de Ka; na Grécia era conhecido por Ochéma; o matemático e filosofo Pitágoras dera-lhe o nome de Eidolon; para os hindus trata-se da Linga Sharira; para os hebreus é a Néphesph; Paracelso o denominou Corpo Sidéreo, enquanto Hippolyte Baraduc o chamou Somod; Paulo de Tarso, por conseguinte, em suas epístolas o tratou por Corpo Espiritual. Transcrever in extenso todas as passagens em que Allan Kardec remete a existência, origem e propriedades do perispírito, resultaria confeccionar uma obra própria, sem acrescer-lhe qualquer linha possível, sob pena de avolumar em vão um conhecimento bastante amplo, e doutrinariamente definitivo. Sob os auspícios dos bons Espíritos e contando com a indulgência dos leitores, apanharemos de trechos das Obras Básicas que, concluímos, perfazem o todo da matéria de modo resumido, para que se possa em sequência vir adentrar o bojo do presente.

1- O que é o perispírito?

93. O Espírito, propriamente dito, está a descoberto ou, como alguns o pretendem, encontra-se envolto numa substância qualquer?
O Espírito é envolvido por uma substância vaporosa para ti, porém, ainda muito grosseira para nós; todavia, bastante vaporosa para poder elevar-se na atmosfera e transportar-se para onde ele queira.

Além desse invólucro material, tem o Espírito um segundo, semimaterial, que o liga ao primeiro. Por ocasião da morte, despoja-se deste, porém não do outro, a que damos o nome de perispírito.” - O Livro dos Médiuns, 1º parte, cap. 1, item 3

O perispírito faz, portanto, parte integrante do Espírito, como o corpo o faz do homem. Porém, o perispírito, só por só, não é o Espírito, do mesmo modo que só o corpo não constitui o homem, porquanto o perispírito não pensa. Ele é para o Espírito o que o corpo é para o homem: o agente ou instrumento de sua ação.” - O Livro dos Médiuns, 2º parte, cap. 1, item 55

2- Qual a função do perispírito?

Esse invólucro semimaterial, que tem a forma humana, constitui para o Espírito um corpo fluídico, vaporoso, mas que, pelo fato de nos ser invisível no seu estado normal, não deixa de ter algumas das propriedades da matéria.” - O Livro dos Médiuns, 1º parte, cap. 1, item 3

Esse segundo invólucro da alma, ou perispírito, existe, pois, durante a vida corpórea; é o intermediário de todas as sensações que o Espírito percebe e pelo qual transmite sua vontade ao exterior e atua sobre os órgãos do corpo. Para nos servirmos de uma comparação material, diremos que é o fio elétrico condutor, que serve para a recepção e a transmissão do pensamento; é, em suma, esse agente misterioso, imperceptível, conhecido pelo nome de fluido nervoso, que desempenha tão grande papel na economia orgânica e que ainda não se leva muito em conta nos fenômenos fisiológicos e patológicos.” - O Livro dos Médiuns, 2º parte, cap.1, item 54

Pela sua essência espiritual, o Espírito é um ser indefinido, abstrato, que não pode ter ação direta sobre a matéria, sendo-lhe indispensável um intermediário, que é o envoltório fluídico, o qual, de certo modo, faz parte integrante dele. É semimaterial esse envoltório, isto é, pertence à matéria pela sua origem e à espiritualidade pela sua natureza etérea. Como toda matéria, ele é extraído do fluido cósmico universal que, nessa circunstância, sofre uma modificação especial. Esse envoltório, denominado perispírito, faz de um ser abstrato, do Espírito, um ser concreto, definido, apreensível pelo pensamento. Torna-o apto a atuar sobre a matéria tangível, conforme se dá com todos os fluidos imponderáveis, que são, como se sabe, os mais poderosos motores. O fluido perispirítico constitui, pois, o traço de união entre o Espírito e a matéria. Enquanto aquele se acha unido ao corpo, serve-lhe ele de veículo ao pensamento, para transmitir o movimento às diversas partes do organismo, as quais atuam sob a impulsão da sua vontade e para fazer que repercutam no Espírito as sensações que os agentes exteriores produzam. Servem-lhe de fios condutores os nervos como, no telégrafo, ao fluido elétrico serve de condutor o fio metálico.” - A Gênese, cap. 11, item 17

3- Qual a origem do perispírito?

94. De onde o Espírito retira seu envoltório semi-material?
Do fluido universal de cada globo. É por isso que não é idêntico em todos os mundos; passando de um mundo a outro, o Espírito muda de envoltório, como mudais de roupa.” - O Livro dos Espíritos

135a) Qual a natureza desse elo?
Semimaterial, isto é, intermediária entre o Espírito e o corpo. E é preciso que assim seja, para que eles possam comunicar-se um com o outro. É através desse elo que o Espírito age sobre a matéria e reciprocamente.” - O Livro dos Espíritos

O perispírito, ou corpo fluídico dos Espíritos, é um dos mais importantes produtos do fluido cósmico; é uma condensação desse fluido em torno de um foco de inteligência ou alma.” - A Gênese, cap. 14, item 7

4- Como se relaciona o perispírito ao progresso do Espírito?

94a) Assim, quando os Espíritos que habitam mundos superiores vêm até nós, tomam um perispírito mais grosseiro?
É preciso que se revistam da vossa matéria; já o dissemos.” - O Livro dos Espíritos

186. Haverá mundos em que o Espírito, deixando de habitar um corpo material, só tenha como envoltório o perispírito?
Sim; e até mesmo esse envoltório se torna tão etéreo, que para vós é como se ele não existisse; este é, então, o estado dos puros Espíritos.” - O Livro dos Espíritos

187. A substância do perispírito é a mesma em todos os mundos?
Não; ela é mais ou menos etérea. Passando de um mundo a outro, o Espírito se reveste da matéria própria de cada um; e essa mudança é tão rápida quanto o relâmpago.” - O Livro dos Espíritos

Mas, qualquer que seja o grau em que se encontre, o Espírito está sempre revestido de um envoltório, ou perispírito, cuja natureza se eteriza, à medida que ele se depura e eleva na hierarquia espiritual.” - O Livro dos Médiuns, 2º parte, cap. 1, item 55

Esse envoltório, haurido no meio ambiente, varia, conforme a natureza dos mundos. Passando de um mundo ao outro, os Espíritos mudam de envoltório como mudamos de roupa, ao passar do inverno para o verão, ou do pólo ao Equador. Os Espíritos mais elevados, quando vêm nos visitar, revestem, portanto, o perispírito terrestre e, então, suas percepções se produzem como nos nossos Espíritos comuns;” - O Livro dos Espíritos, item 257

5- Quais são as propriedades do perispírito?

95. O envoltório semimaterial do Espírito dispõe de formas determinadas e pode ser perceptível?
Sim, uma forma correspondente à vontade do Espírito; é assim que ele vos aparece algumas vezes, quer nos sonhos, quer no estado de vigília, e que pode tomar uma forma visível e até mesmo palpável.” - O Livro dos Espíritos

Por sua natureza e em seu estado normal, o perispírito é invisível (…) Mas, (…) pode ele sofrer modificações que o tornem perceptível à vista, quer por meio de uma espécie de condensação, quer por meio de uma mudança na disposição de suas moléculas. Aparece-nos então sob uma forma vaporosa. A condensação (…) dizemos, pode ser tal que o perispírito adquira as propriedades de um corpo sólido e tangível, conservando, porém, a possibilidade de retomar instantaneamente seu estado etéreo e invisível.” - O Livro dos Médiuns, 2º parte, cap. 6, item 105

O perispírito pode variar de aparência, modificar-se ao infinito; a alma é a inteligência, não muda a sua natureza.” - O Livro dos Médiuns, 1º parte, cap. 4, item 51

Mas a matéria sutil do perispírito não possui a tenacidade, nem a rigidez da matéria compacta do corpo; é, se assim nos podemos exprimir, flexível e expansível, donde resulta que a forma que toma, conquanto decalcada na do corpo, não é absoluta, amolga-se à vontade do Espírito, que lhe pode dar a aparência que entenda, ao passo que o invólucro sólido lhe oferece invencível resistência.” - O Livro dos Médiuns, 2º parte, cap. 1, item 56

O Espírito, encarnado, conserva, com as qualidades que lhe são próprias, o seu perispírito que, como se sabe, não fica circunscrito pelo corpo, mas irradia ao seu derredor e o envolve como que de uma atmosfera fluídica. (…) Sendo o perispírito dos encarnados de natureza idêntica à dos fluidos espirituais, ele os assimila com facilidade, como uma esponja se embebe de um líquido. Esses fluidos exercem sobre o perispírito uma ação tanto mais direta, quanto, por sua expansão e sua irradiação, o perispírito com eles se confunde.” - A Gênese, cap. 14, item 18

Criando imagens fluídicas, o pensamento se reflete no envoltório perispirítico, como num espelho, ou ainda como essas imagens de objetos terrestres que se refletem nos vapores do ar; toma nele corpo e aí, de certo modo se fotografa. Tenha um homem, por exemplo, a ideia de matar a outro: embora o corpo material se lhe conserve impassível, seu corpo fluídico é posto em ação pelo pensamento e reproduz todos os matizes deste último; executa fluidicamente o gesto, o ato que intentou praticar. O pensamento cria a imagem da vítima e a cena inteira é pintada, como num quadro, tal qual se lhe desenrola no Espírito. Desse modo é que os mais secretos movimentos da alma repercutem no envoltório fluídico; que uma alma pode ler noutra alma como num livro e ver o que não é perceptível aos olhos do corpo. Os olhos do corpo veem as impressões interiores que se refletem nos traços do rosto: a cólera, a alegria, a tristeza; mas a alma vê nos traços da alma os pensamentos que não se traduzem no exterior.” - Revista Espírita, junho de 1868, Fotografia do Pensamento

Em muitos passos do Evangelho se lê: 'Mas, Jesus, conhecendo-lhes os pensamentos, lhes diz...' Ora, como poderia Ele conhecer os pensamentos dos seus interlocutores, senão pelas irradiações fluídicas desses pensamentos e, ao mesmo tempo, pela vista espiritual que lhe permitia ler-lhes no foro íntimo? Muitas vezes, supondo que um pensamento se acha sepultado nos refolhos da alma, o homem não suspeita que traz em si um espelho onde se reflete aquele pensamento, um revelador na sua própria irradiação fluídica, impregnada dele. Se víssemos o mecanismo do mundo invisível que nos cerca, as ramificações dos fios condutores do pensamento, a ligarem todos os seres inteligentes, corporais e incorpóreos, os eflúvios fluídicos carregados das marcas do mundo moral, os quais como correntes aéreas, atravessam o espaço, muito menos surpreendidos ficaríamos diante de certos efeitos que a ignorância atribui ao acaso.” - A Gênese, cap. 15, item 9

Apesar de todo este conhecimento assim exposto, muitas pessoas guardam sérias ressalvas a alguns pontos que lhes parecem, por falta de instrução, obscuros em demasia – há muito mais a ser obtido pela leitura e estudo das Obras Básicas, comunicações, mensagens e explicações detalhadas que constam da Revista Espírita; e não se dê o sujeito por satisfeito, há uma série de experimentadores, pesquisadores e catalogadores de fenômenos mediúnicos, coetâneos de Allan Kardec e posteriores, cujas descrições e estudos de caso valem a pena serem lidos e examinados, acautelando-se, todavia, de suas conclusões que podem, por certo, passarem ao largo da Doutrina dos Espíritos. Um de tais pontos diz respeito precisamente a questão que dá título ao presente artigo – parece mote de dúvida que o Espírito, e consequentemente o perispírito que o envolve, possa variar de estatura de maneira abrupta e acentuada. A apreciação das Obras Básicas resulta compreender que a forma humana é a adotada universalmente pelos Espíritos, e que o perispírito pode variar de aparência, modificar-se ao infinito. Pode-se, no mais, especular das razões de tal resistência diante de fenômeno tão natural e corriqueiro – doutrinas e sistemas de ideias completamente estranhos ao Espiritismo, vicejando aqui ora acolá podem ser apontados como os responsáveis pelo domínio universal da ignorância. No entanto, sem lhes dar o crédito de uma análise, em vista de já as haver examinado em vários dos artigos aqui publicados, basta que se constate haver um materialismo nas entrelinhas que concebem o perispírito como possuidor de órgãos, tal e qual o corpo físico – basta o estudo para ver a verdade.


A título de exercitar o mais fundamental didatismo, observemos as figuras retratadas acima – lado a lado estão, separados por décadas, o homem mais alto do mundo de que se tem registro, o norte-americano Robert Wadlow, que até o momento de sua morte jamais parou de crescer, atingindo incríveis 2m72cm. de altura., e o nepalês Chandra Dangi, que a seu turno, é considerado o menor ser humano registrado, não tendo ultrapassado míseros 0,55cm. de altura. Para se ter uma ideia da discrepância, os pés de Robert Wadlow, considerados os maiores do mundo, mediam 0,47cm.; ou seja, Chandra Dangi era pouco maior que os pés do mais alto ser humano de todos os tempos. Ao não se levar em conta a imaterialidade do Espírito, tampouco a maleabilidade do perispírito, não se pode conceber tamanha desconformidade. Quando trata das comunicações recebidas acerca de Júpiter, Allan Kardec obtêm informes acerca da estatura física de seus habitantes por Bernard Palissy, que afirma serem estes 'grandes e bem proporcionado. Maiores que os vossos maiores homens.' - não fosse tudo quanto fora exposto, como explicar as dimensões dos seres espirituais? Podemos ainda, obter de outras fontes, registros bastante curiosos acerca do que nós mesmos fomos testemunha. Mas antes que possam ser apreciados, no tocante a natureza do Espírito, o ser principal, as Obras Básicas possuem alguns trechos oportunos para o estudo, e para o entendimento que se busca alcançar pelo presente exposto, vale a pena lê-los:

23a) Qual a natureza íntima do espírito?
Não é fácil analisar o espírito com a vossa linguagem. Para vós, nada é, porque o espírito não é uma coisa palpável; mas, para nós, é alguma coisa. Sabei-o bem, o nada é coisa alguma; o nada não existe.” - O Livro dos Espíritos

82. É correto dizer que os Espíritos são imateriais?
Como se pode definir uma coisa, quando faltam termos de comparação e com uma linguagem ineficiente? Um cego de nascença pode definir a luz? Imaterial não é bem a palavra; incorpóreo seria mais exato, pois deves compreender bem que o Espírito, sendo uma criação, deve ser alguma coisa; é matéria quintenssenciada, porém, sem analogia para vós, e tão etérea que não pode ser percebida pelos vossos sentidos.” - O Livro dos Espíritos

Quanto à natureza intima da alma, essa desconhecemo-la. Quando se diz que a alma é imaterial, deve-se entendê-lo em sentido relativo, não em sentido absoluto, por isso que a imaterialidade absoluta seria o nada. Ora, a alma, ou o Espírito, são alguma coisa. Qualificando-a de imaterial, quer-se dizer que sua essência é de tal modo superior, que nenhuma analogia tem com o que chamamos matéria e que, assim, para nós, ela é imaterial.” - O Livro dos Médiuns, 1º parte, cap.4, item 50

Muitas partes mais apenas resultariam em ratificar que a natureza do Espírito, é esta desconhecida; porém, afirmá-la-emos imaterial a partir do momento que os parâmetros para defini-lo são única e exclusivamente materiais, o que resultaria, sob quaisquer tentativas, todas equivocadas. Isto posto, cabe expor as razões, ou antes os casos que motivaram a existência da presente postagem - certa feita uma garota de nosso convívio, com cerca de 3 anos de idade, passou a ter seu sono perturbado – inquieta, despertava-lhe a agitação e a excitação nos instantes que antecediam o repouso noturno. Nenhum procedimento era possível de fazê-la pacificar. Parecia divertir-se ainda com as tentativas vãs de acalmá-la. Tendo a mediunidade um caráter hereditário1 e já sendo de nosso conhecimento que a mãe desta era, não apenas médium sonambúlica como psicofônica, deitamos a esta fluidos por meio de passes, diante da suspeita que um Espírito respondia pelo alvoroço. E tal qual se imaginara, o desencarnado viera manifestar-se por intermédio desta – tratou-se de Espírito ligado as cousas próprias da infância, que apreciava brincar com a garota, travestindo-se de palhaço; este detalhe, aliás, correspondia às alegações da pequena que afirmava a antevisão do bufão. Dialogamos algum tempo com o Espírito que, infantilizado em demasia, parecia irredutível em sua intenção de divertir-se com a criança encarnada. Desde que é de conhecimento geral o caráter inconstante das crianças, firmamos acordo com o Espírito para que viesse brincar com a menina apenas durante seu repouso, jamais antes, contando que dentro em pouco este partiria em busca de novos parceiros de algazarra. Ainda, perguntamos há quanto se encontrava ali, interagindo com a criança, ao que nos respondeu que achegara-se fazia poucos dias, agitando-se a noite e repousando algum tempo num móvel que havia no aposento desta pela manhã, vez por outra a acompanhando ao ambiente escolar – o móvel a que o Espírito se referia, e o fez com afirmação contundente, era uma réplica de cerca de 30 centímetros de comprimento por 20 centímetros de altura de uma cristaleira, confeccionada pelo bisavô da menina, marceneiro de reconhecida habilidade.

Encantado pelo brinquedo, fez-nos prometer que o penduraríamos, visto que fora confeccionado com tal propósito – promessa jamais cumprida pois, como imaginado, o Espírito dali a tanto partira sem mais que sua presença fosse sentida. A criança, explica-se, podia bem ter os rudimentos da mediunidade àquela idade, mas sua excitação a visão do histrião decorria do seu estado de espírito, já relativamente liberto das amarras do corpo físico nos instantes precedentes ao repouso. Quanto a moradia diminuta do Espírito, poderíamos explicá-lo por duas hipóteses apenas – ou o Espírito, como toda criança mais ou menos deseducada, incorrera numa mentira; ou dissera a verdade, de fato fazendo da réplica sua habitação temporária. Em sendo este o caso, como seria possível? Tudo quanto fora exposto até então pode explicar coerentemente este caso; e o seguinte - por ocasião de haver-se feito necessário proceder a organização de um móvel, um armário de aço de boa dimensão e resistência destinado a conter toda sorte de documentos, decorreu dali a algum tempo, em sessão de experimentação mediúnica manifestar-se um Espírito em patente exaltação emocional, revoltado com a arrumação que empreendemos – explicou: o Espírito fizera do armário de aço sua casa, seu lar; habitava por entre as subdivisões deste. Detalhe: entre as prateleiras, não distam mais que 30 centímetros de altura. Por entre os volumes formados pelo amontoado de obras e documentos, um ser humano, por mais diminuto fosse, não poderia tomar lugar ali. Como explicar o fato? Uma vez mais, tudo já se encontra explicado. Porém, apanhemos dos alfarrábios de reportado pesquisador para constatar-se a natureza do Espírito e do perispírito.

Ernesto Bozzano, abalizado catalogador de fenômenos mediúnicos, espiritualista e pesquisador, em sua obra Materializações de Espíritos em Proporções Minúsculas, transcreve ele trechos do livro de Anne Louise Fletcher, A Morte Sem Véu. Esta autora, em reunião de experimentação mediúnica com a médium Ada Bessenet Toledo, estando ladeada pelo metapsiquista americano Dr. Hereward Carrington, por ocasião desta narra alguns fatos mui pertinentes:

O fenômeno, porém, que mais me surpreendeu, interessando-me grandemente, foi a materialização de uma figura com a altura de 14 polegadas (cerca de 35 centímetros), cercada de longo manto flutuante, a qual se pôs a dançar na mesa entre mim e o Dr. Carrington (estávamos sentados um defronte do outro). (…) era bem uma mulherzinha viva, perfeitamente normal, salvo no que concerne às suas proporções minúsculas.

Noutro caso colhido pelo pesquisador italiano, também catalogado na obra, o comandante da artilharia inglesa C. C. Colley, que fora defensor ferrenho do espiritualismo, narra caso ocorrido consigo em 1898; quando em sessão de experimentação mediúnica em que estavam presentes além de si, o anfitrião proprietário da casa onde se dava esta, sua filha e o médium. Por tais termos ele descreve o ocorrido:

O médium estava mergulhado em profundo transe. De repente, vi sair de seu lado algo parecendo o vapor de uma chaleira fervendo. Esse vapor tomou a forma de um tubo – que chamaremos o condutor da substância – que se alongou até atingir o centro da mesa oval em torno da qual estávamos sentados. Aí ele se transformou numa nuvenzinha de cerca de dois pés de diâmetro (cerca de 60 centímetros) que não tardou a tomar a forma de uma bela boneca da altura de 18 polegadas (cerca de 45 centímetros), que se pôs a passear graciosamente na mesa, como se fosse a miniatura viva de um Espírito. Ela se apresentou diante de cada um de nós com muita naturalidade e, finalmente, sentou-se em meus joelhos. Tive o privilégio de apertar-lhe a mão, que não era maior do que o meu polegar.

Ainda, uma história mais, recolhida da mesma obra de Bozzano, tendo ocorrido ao experimentador neozelandês E. H. Saché, de Auckland, por meio da médium Lily Hope, na década de 1920 – recebeu a esta em sua residência com o fito de realizar uma série de sessões experimentais, dentre as quais colheu-se o extrato abaixo, onde Saché anota:

Houve um curto intervalo de repouso, depois do qual vimos aparecer, no meio de nós, uma figurinha com a altura de 30 polegadas (76 centímetros aproximadamente), a qual, sorrindo, nos dirigiu a palavra. Ela diz ser Sunrise, que deixara, por alguns instantes, o controle da médium a fim de mostrar-se a nós. Perguntamos-lhe por que se manifestava em dimensões tão reduzidas e ela respondeu que assim o fizera para não gastar muita força. Tendo lhe pedido que permanecesse entre nós mais algum tempo do que as outras manifestações, sorriu, fez um sinal negativo com a mãozinha e desapareceu.

É de causar, portanto, algum espanto que Espíritos possam tomar dimensões minúsculas, mesmo ao manifestarem-se visíveis e tangíveis em sessões de experimentação mediúnica? Não seriam as visões de gnomos, elfos, goblins, demônios, gigantes, animais ou feras míticas, senão modificações naturais que podem sofrer o perispírito? Não seriam as narrativas mediúnicas que atestam os estigmas e as mutilações perispirituais um caso flagrante de interpretação literal do que, de fato, é aparente? Não seria a falta de explicação dos autores espirituais para isto um inequívoco sinal de ignorância, ou canalhice com o fito de confundir? O perispírito, tomando a forma e a dimensão que bem entende o Espírito, não carece do auxílio de terceiros para realizar o que naturalmente ocorre, sendo de rir-se quem leva em conta narrativas que descrevem processos fluídicos complexos no sentido de miniaturizar o ser para a reencarnação. Quão maior for o conhecimento do perispírito como prescrito pela Doutrina dos Espíritos, maiores subsídios terá o estudioso para chegar a uma conclusão por seus próprios meios. Ao estudo, portanto.
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1_ver questão 451 de O Livro dos Espíritos


sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Fé raciocinada - porque o Espiritismo não é uma religião?

Religião, como a Filosofia, é um aspecto do conhecimento humano cuja definição não é única nem unânime; pelo contrário, sem limites claros, qualquer novidade pode ser adequada a uma e a outra. Dificilmente algum estudioso se destaca dos demais por ter uma visão mais abrangente da questão, entendendo que conhecimento o é independente de como se busque classificá-lo – mas, para isso, seria preciso realmente uma visão de conjunto algo privilegiada, dada a escassez com que é encontrada entre os homens de intelecto. Para o Espiritismo, contudo, a questão é outra e mais profunda – a recusa em categorizar a Doutrina como uma religião, proceder adotado por Allan Kardec e muitos dos aderentes fidedignos, decorre do pleno conhecimento do que perfaz a base desta e daquela; e porque ambas são antagônicas. O Codificador compreendia a questão e a expôs em diversos e inumeráveis trechos das Obras Básicas, reconhecendo o Espiritismo como o mais oportuno e potente aliado da religião, por que vem somar-lhe a base racional faltante, explicando toda sorte de fenômenos sempre reportados como milagrosos, sempre alocados à condição de mistérios de fé. Nestas oportunidades, acaso fosse o Espiritismo de fato uma religião, não seria compreensível e esperado que Allan Kardec assim procedesse, assim o definisse? A culminância do antagonismo entre a religião e a Doutrina dos Espíritos foi exposta nas Obras Básicas em O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo XIX, itens 6 e 7, por meio do qual o professor expressa:

Nada examinando, a fé cega aceita, sem verificação, assim o verdadeiro como o falso, e a cada passo se choca com a evidência e a razão. Levada ao excesso, produz o fanatismo. (…) A fé necessita de uma base, base que é a inteligência perfeita daquilo em que se deve crer. E, para crer, não basta ver; é preciso, sobretudo, compreender. (…) A fé raciocinada, por se apoiar nos fatos e na lógica, nenhuma obscuridade deixa. A criatura então crê, porque tem certeza, e ninguém tem certeza senão porque compreendeu. Eis por que não se dobra. Fé inabalável só o é a que pode encarar de frente a razão, em todas as épocas da Humanidade.

A perfeita inteligência é a mais completa compreensão possível, acerca daquilo que se deve crer e, em termos espíritas, essa é a crença nos fundamentos da Doutrina dos Espíritos. Para ilustrar a questão, vamos tomar licença para revelar uma experiência pessoal – desde há alguns anos, quando empreendemos sinceros esforços no estudo do Espiritismo, alcançamos o fundamento dos fluidos; mas o que são os fluidos? Compreende-se sua ação nos fenômenos mediúnicos, e na composição do perispírito, mas e quanto ao passe espírita? A transferência de fluidos salutares de um indivíduo para outro, como bem proceder? Havia ainda uma série de questões em aberto, e não apenas o capítulo XIV de A Gênese foi preponderante e necessário, mas um sem número de passagens da Revista Espírita precisaram ser examinados com minúcia e labor – todavia, não estávamos plenamente satisfeitos. Buscamos a rica literatura acerca dos magnetizadores que precederam Allan Kardec e o Espiritismo, desde Mesmer e seus seguidores; a figura extraordinária de Daniel Dunglas Home ofereceu igual quantidade de apontamentos, das mais variadas fontes e vertentes. Ao final destas, um experimento a que este fora submetido atingiu-nos o ânimo com redobrado interesse – fora posta sob um cesto telado invertido uma balança, a mais precisa que havia na segunda metade do século XIX, sob a qual se orientou o sr. Home a impor a mão. O espaço existente entre a mão do médium e o fundo do cesto, e deste para a superfície sensível da balança distava uns bons centímetros, o que não impediu a agulha em registrar um volume de mais de 1 quilograma; volume este invisível para o médium e para o experimentador.


Pedimos licença a um companheiro em cujo local de trabalho dispunha uma balança eletrônica, destas que se encontram amiúde no comércio, para proceder a nossa própria experiência. Dotados de toda a compreensão que nos fora dada pelo estudo atento das Obras Básicas, e pelas leituras de outros tantos livros que relacionavam a existência do fluido, dispusemos a destra 10 centímetros acima do tampo metálico sensível da balança, com o firme propósito de causar alguma reação visível, ostensiva – por meros segundos, os indicadores numéricos passaram a registrar alguma leitura, embaralhando-se em seguida, até desaparecer completamente, indicando o desligamento do aparato, permanecendo assim por algo como 15 segundos, retornando após suas funções normais. Imediatamente fez-me rememorar a relação existente entre o fluido e a eletricidade, aspecto reportado por Allan Kardec e pelos Espíritos da Codificação em vários trechos das Obras Básicas. Teria sido possível causar um dano permanente no aparelho eletrônico? Felizmente este não se verificou. Bastou-nos então, para realizar uma série de experimentos com copos de água a fim de criar substâncias ora salutares, ora deletérias – nossa esposa reportou, em mais de uma ocasião, o sabor medicamentoso das infusões fluídicas que preparamos, as quais sorveu afim de minorar toda sorte de incômodos somáticos. Acaso antes os passes que aplicávamos eram decorrência mais da ação macaqueada de terceiros, passaram então a surtir efeitos muito mais eficazmente. Não fosse o desejo patente de compreender o mais possível o fluido, sua razão de ser e seus efeitos, teríamos ad aeternum uma pendência a resolver, uma lacuna a preencher no aprendizado do Espiritismo, um aprendizado de flagrantes consequências práticas. A fé que moveu-nos durante o experimento com a balança adveio dos resultados práticos colhidos e catalogados não apenas de Allan Kardec, mas por um séquito seleto de  homens animados pelo mesmo desejo de conhecer que nos comocionou até então, e que nos orienta à ação ainda hoje. Este conhecimento pregresso forneceu-nos a base de sustentação da fé, que levou a uma compreensão peremptória da ação dos fluidos.

Seria esta a ação correntemente adotada de parte dos espíritas? Será a fé destes sempre raciocinada? Será que o fato de um sujeito tornar-se espírita, faz com que sua fé seja imediatamente raciocinada? Que procedimentos se podem adotar para consolidar a fé raciocinada do espirita? Ou será que subsiste uma tendência de acreditar, de crer sem compreender, de parte dos espíritas? Será que, amiúde não se assumem como verdades versões, narrativas e conceitos tradicionalmente repetidos, mas que não contam com comprovação? Será que a atitude corrente não é a de crer por que alguém disse, ou por que determinada instituição assim se posicionou? Os aspectos do 'sujeito espírita nacional' são condignos de exame e estudo, o que oportunamente se fará – mas colecionamos um sem número de causos de indivíduos cujo ardor da maturidade espiritual fê-los debater com toda sorte de sacerdotes, fê-los lançar dúvidas às verdades religiosas, seus dogmas e seus mistérios; porém, quando descoberto o Espiritismo, quando lançados neste mundo novo de verdades racionais, vêm se portar tais mesmos como partícipes mansos de um rebanho que aceita bovinamente tudo o que lhes chega a guisa de Espiritismo. Parece uma maturidade incompleta, que questiona o dogma, mas não os símbolos e os sinais, não as instituições e invenções humanas, não a urdidura social e a origem das tradições, não as necessidades frente aos condicionamentos.

A fé raciocinada não deve mover o sujeito apenas para compreender a origem e ação do fluido, por exemplo, mas também e principalmente para conjurar um impacto prático em sua vida, assim como infusões fluídicas podem levar a mitigar sintomas, ou a curar as moléstias que os gerou. Por que casar? Por que ter filhos? Para quê ter animais de estimação? Deve-se ter uma religião? Qual a finalidade de uma religião? Será o Espiritismo uma religião? Por que deve-se confiar nas instruções a esse respeito? Como teria Allan Kardec tratado a questão? Estas e outras indagações mais ilustram os caminhos do pensamento que fideliza-se a fé raciocinada, que não busca crer sem proceder a um exame atento, a um estudo minucioso, a experiência. Um muito bom exercício que qualquer espírita pode realizar é o cotejamento de obras mediúnicas – três livros que lidam com a figura de Jesus de Nazaré podem prestar-se a esse procedimento: O Sublime Peregrino de Ramatis, O Redentor de Edgard Armond, e Os Últimos Seis Dias de Jesus de Jamiro dos Santos Filhos. Que abordagens os autores utilizaram? A quais passagens da vida de Jesus eles se dedicaram? Há semelhança ou discordância entre as obras? Das palavras de Jesus, elas são concordes as explicações encontradas em O Evangelho Segundo o Espiritismo? Das ações de Jesus, elas são concordes as explicações encontradas em A Gênese? Assim como nós outros incorremos em comparar Há 2000 Anos do Espírito Emmanuel aos fatos historiográficos acerca da Roma e da Palestina no século I, o leitor não há de encontrar maiores entraves para executar semelhante tarefa, seguindo a sugestão aqui exposta ou abordando temática própria. Temas como fluido e erraticidade possuem uma literatura vasta, assim como a pluralidade dos mundos habitados, ou a mediunidade, ou ainda os estudos da Física acerca da natureza e origem da matéria; são, enfim, fundamentos em que o Espiritismo se assenta e que deveriam, por princípio, ser do interesse mais caro de todo espírita.

Mas, se a questão abordada é a religião, por que não começar por esta? Em artigos futuros, serão desenvolvidos com maior desvelo tais indagações, depreendendo-se por que outras razões a Doutrina dos Espíritos não é, nem pode ser, uma religião.


sexta-feira, 20 de setembro de 2019

A Condessa Paula

José Herculano Pires avança posteridade adentro no qualitativo de modelo de fidelidade doutrinária espírita, reportado defensor da Doutrina dos Espíritos e outorgado por Emmanuel, o obsessor de Chico Xavier, como 'o metro que melhor mediu Kardec'. Obviamente que, parte significativa do enaltecimento a sua memória e trabalho é judiciosa, mas nem mesmo o avultado, por maiores sejam seu talento literário e sagacidade mental, deve padecer de aceitação passiva – sua obra merece e deve ser revisitada, examinada, criticada, racionalizada. Sem que o proceder seja permitido neste espaço e tempo, há que chamar a atenção, todavia, para o que é conhecido por alguns como a fase mais desairosa de um intelecto privilegiado – a fusão de sua obra a de Chico Xavier; deste período em que se achegou ao médium de Pedro Leopoldo, quando aposentou momentaneamente o espírito crítico pelo qual é sempre lembrado. Uma das obras deste ciclo é O Infinito e o Finito, onde o jornalista e filósofo atreve escrever o seguinte:

Muitas pessoas encontram dificuldades em aceitar as descrições da vida de além-túmulo, dos livros de André Luiz, psicografados por Chico Xavier. Mesmo entre os espíritas, já habituados a tratar dos problemas do 'outro lado da vida', essas descrições encontraram no princípio, e ainda hoje encontram, certa relutância. (…) No tocante às revelações mediúnicas, as descrições de André Luiz não constituem novidade, a não ser quanto ao que trazem de pessoal, da maneira de ver do autor. Já em O Céu e o Inferno, Kardec apresenta descrições semelhantes. Na Revue Spirite, o codificador publicou numerosos relatos de além-túmulo no mesmo sentido.

Para quem no livro Vampirismo chamou André Luiz de neófito empolgado que às vezes emprega em suas obras termos que destoam da terminologia doutrinária e conceitos que nem sempre se ajustam aos princípios espíritas, José Herculano Pires sofreu uma metamorfose digna de nota, sujeitando-se as figuras nefastas do Espírito pseudo-sábio André Luiz e do obsessor Emmanuel. É de se especular do poder da docilidade servil e da humildade mística de Chico Xavier para haverem dobrado o caráter, até então, considerado rijo do jornalista. Ou, como presumem observadores outros, houvera sempre um desejo velado de José Herculano Pires pela ascensão e reconhecimento como escritor, algo que talvez não haja ocorrido na medida de suas expectativas - mal algum faria, portanto, estar atado a um best-seller da categoria do matuto mineiro; ao que, para este, outrossim, não constituiria senão a vantagem de aderir a si a respeitabilidade outorgada ao primeiro graças a reputação de fiel servidor do Espiritismo. Sejam por estas ou outras razões, José Herculano Pires encerra em si a contradição por haver deferido uma obra claramente pseudo-sábia, enquanto a figura de Chico subsiste menos arranhada, ainda que seja o responsável passivo pelos livros destes.

Embora uma pesquisa superficial revele estes fatos biográficos e bibliográficos de José Herculano Pires, alguns autores ou entusiastas das ideias de André Luiz e que tais porfiam na idolatria da personalidade, tomando por irrecusáveis as ideias deste, e de outros mais; assim opera o autor Paulo Neto em sua obra As Colônias Espirituais e a Codificação. Este tomo foi detidamente compulsado nas pesquisas que levaram a composição de rica obra acerca da deturpação da erraticidade empreendida pela ideologia das Colônias Espirituais, de autoria nossa, que um dia será dado a publicação. Até lá, este livro de Paulo Neto constitui material interessante, posto que, apanhando da tradicional autoridade dada a José Herculano Pires, ele busca embasar sua defesa de uma erraticidade materialista. E, a exemplo deste, o autor também buscou nas Obras Básicas do Espiritismo o que não está lá; assim escreve ele:

O que é mais importante na obra O Céu e o Inferno vem agora. Trata-se de uma mensagem assinada pela Condessa Paula, classificada por Kardec entre os Espíritos felizes. Depois de destacar as qualidades morais da Condessa, informando que ela havia falecido aos 36 anos de idade, no ano de 1851, que 'um de seus parentes evocou-a doze anos depois de falecida, e obteve, em resposta a diversas perguntas, a seguinte comunicação.

Procede em seguida a transcrever todo o referido e volumoso fragmento de O Céu e o Inferno, o que não se fará aqui senão em parte, ao que conclui nos seguintes termos:

Fizemos questão de transcrever tudo, porquanto, além das 'moradias aéreas', a Condessa informa outras particularidades da vida espiritual. Aqui, então, podemos afirma com segurança, que na Codificação tem, sim, aquilo que alguns confrades querem combater como se não fosse doutrinário.

Quando José Herculano Pires atesta que em O Céu e o Inferno há descrições semelhantes àquela das obras do Espírito André Luiz, não é possível saber a que se refere, uma vez que examinada a obra da Allan Kardec não é possível encontrar cousa algum análoga as Colônias Espirituais; o detalhe aqui é que o jornalista empreendeu esforços para lançar sua própria tradução das Obras Básicas, além da Revista Espírita – para Paulo Neto, contudo, a resposta a esta referência é a Condessa Paula. Um trecho em particular da mensagem de tal nobiliárquico Espírito necessita ser transcrito:

Tendes razão, amigo, em pensar que sou feliz. Assim é, efetivamente, e mais ainda do que a linguagem pode exprimir, conquanto longe do seu último grau. Mas eu estive na Terra entre os felizes, pois não me lembro de haver aí experimentado um só desgosto real. Juventude, homenagens, saúde, fortuna, tudo o que entre vós outros constitui felicidade eu possuía! O que é, no entanto, essa felicidade comparada à que desfruto aqui? Esplêndidas festas terrenas em que se ostentam os mais ricos paramentos, o que são elas comparadas a estas assembleias de Espíritos resplendentes de brilho que as vossas vistas não suportariam, brilho que é o apanágio da sua pureza? Os vossos palácios de dourados salões, que são eles comparados a estas moradas aéreas, vastas regiões do Espaço matizadas de cores que obumbrariam o arco-íris? Os vossos passeios, a contados passos, a que se reduzem, comparados aos percursos da imensidade, mais céleres que o raio?

Em diversas comunicações registradas e catalogadas por Allan Kardec, seja em O Céu e o Inferno, seja nas milhares de páginas dos doze volumes da Revista Espírita, o professor lionês, quando ante um Espírito que, a exemplo da Condessa Paula possui progresso tal que o relaciona aos Espíritos de escol, sempre prodigalizou indagar da condição e destino deste – e sempre um mundo de maior progresso é aludido, seja por este seja por aquele. Júpiter mesmo é apontado amiúde por Allan Kardec, como exemplo de mundo superior, para onde vão os Espíritos de maior progresso. Segundo parece, a questão aqui é simplesmente de saber interpretar o que está escrito – a Condessa Paula descreve, por meio de analogias, ou seja, concebendo uma relação de semelhança entre cousas ou fatos distintos, tudo quanto sente e vê, o seu estado enfim. Não se escusa um certo lirismo próprio do Espirito, de fato, mas não se arrolaria tal mensagem ao ordinário da literatura mediúnica própria das obras que defendem as Colônias Espirituais. Quando ela questiona que 'os vossos palácios de dourados salões, que são eles comparados a estas moradas aéreas, vastas regiões do Espaço matizadas de cores que obumbrariam o arco-íris?', ela cria uma correspondência entre o local em que está e aqueles próprios da Terra; mas, porque concluir forçosamente tratar-se de uma Colônia Espiritual, ou algo de mesma natureza, posto que a equivalência maior está para com as moradias aéreas existentes em Júpiter? A mesma pareidolia se verifica quanto a mensagem encontrada em O Evangelho Segundo o Espiritismo, em seu capítulo XI, item 11, intitulada O Egoísmo, assinada apenas por Emmanuel – grande número de 'espíritas' credita a mesma ao obsessor de Chico Xavier, quando em realidade é de autoria de Emmanuel Swedemborg, este sim Espírito presente desde o princípio na Codificação do Espiritismo.

Contudo, uma observação atenta atesta que o nobre Espírito apanha de uma referência conhecida ao seu interlocutor, qual seja um palácio como exemplo de moradia suntuosa e de grandes dimensões, para buscar revelar o local onde erra, ou seja, um espaço multicolorido de enorme extensão – mas, o restante de sua mensagem dá a chave para se compreender o destino da jovem fidalga doze anos após seu decesso; assim ela expressa-se:

As ocupações, posto que isentas de fadiga, revestem-se de perspectivas e emoções variáveis e incessantes, pelos mil incidentes que se lhes filiam. Tem cada qual sua missão a cumprir, seus protegidos a velar, amigos terrenos a visitar, mecanismos da natureza a dirigir, almas sofredoras a consolar; e é o vaivém, não de uma rua a outra, porém, de um a outro mundo; reunimo-nos, separamo-nos para novamente nos juntarmos; e, reunidos em certo ponto, comunicamo-nos o trabalho realizado, felicitando-nos pelos êxitos obtidos; ajustamo-nos, mutuamente nos assistimos nos casos difíceis. Finalmente, asseguro-vos que ninguém tem tempo para enfadar-se, por um segundo que seja.

Eis a descrição de um Espírito feliz a errar pela eternidade - 'é o vaivém, não de uma rua a outra, porém, de um a outro mundo'. Não é de subtrair a ideia que faz das Colônias Espirituais cidades que, como tal, possuem seus logradouros, avenidas e ruelas; a Condessa Paula já não mais caminha por tais paragens terrestres, pois o pensamento a leva percorrer os mundos do firmamento infinito, com a intimidade e a familiaridade de quem atravessa os cômodos da própria residência. É a paga pelo progresso alcançado – um universo sem portas, cuja vastidão é convidativa e a acolhida é a de Deus por intermédio dos Espíritos familiares. Em ensaios previamente postados aqui, estas questões já foram tangidas e repisadas, para que não falte ao leitor subsídios para compreender a erraticidade qual prescrita pelo Espiritismo; nestes tempos revisionistas, é sempre necessário manter a vigília para que o erro não persista, para que a Doutrina dos Espíritos não seja conspurcada pela ação de autores como Paulo Neto e José Herculano Pires. Qual sejam suas motivações, as consequências de suas obras apenas diminuem o Espiritismo, eivando seus fundamentos com ideias aberrantes que, no âmago, constituem a expressão de um materialismo oriundo dos atavismos de eras ancestrais.

O Cosmo é muito maior do que pregam os autores aqui abordados, e a Condessa Paula vem dar seu contributo ao Espiritismo para expô-lo em toda sua beleza e magnitude.
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A nobre ao lado é Caroline Esterházy, Condessa de Galántha, amiga e musa do compositor Franz Schubert; nascida em Pressburg, outrora Reino da Hungria, atual Bratislava na Eslováquia, morreu em 1851, a exemplo da Condessa Paula, cuja identidade prossegue uma completa incógnita, apesar dos esforços empreendidos para descobrir a mulher por trás da mensagem. Certamente que sua identidade fora resguardada por Allan Kardec, ainda que por razões que nos escapam. Caroline aqui está para ilustrar como poderia parecer-se a Condessa Paula, com as vestimentas e o penteado próprios da primeira metade do século XIX. Cremos que, por haver sido nobre e abastada, a Condessa Paula possua registros relativamente precisos de sua passagem pela Terra, e até mesmo algum retrato pintado n'algum museu ou parede da residência de algum descendente, o que chama à pesquisa.

sábado, 14 de setembro de 2019

Kardec - um filme


Wagner de Assis dirigiu Nosso Lar, o que é um mau sinal para a cinebiografia de Allan Kardec – arrolado a categoria genérica das ‘cousas do Espiritismo’, a obra de André Luiz e o Espírito missionário do professor Rivail acabam se igualando numa mistura homogênea, perfazendo um simulacro de Espiritismo em sua expressão prática nacional – o que é chamado ordinariamente de movimento espírita brasileiro. E o diretor e roteirista, a despeito de suas capacidades como tal, apenas toma partido deste simulacro, dando-lhe um eco cinematográfico de grande visibilidade. Nosso Lar não deveria existir como livro, menos ainda em peça de teatro e filme – mas, por que haveria de ser relevante nossa opinião a respeito? Em prejuízo a fidelidade doutrinária, não serão tais filmes que darão sobrevida ao equívoco; há dezenas de lançamentos anuais de obras literárias de origem mediúnica que alimentam fartamente a confusão.

Num sábado qualquer e de espírito pronto, fomos assistir ao filme – as questões relativas aos aspectos técnicos da obra são o que mais se destacam positivamente, afinal a direção de arte é digna e convence em grande parte, tanto quanto a fotografia. Esta, todavia, chama a atenção em algumas cenas externas em que a luz natural parece ocre demais, como se uma lâmpada alaranjada houvera substituído o Sol. Sempre defendemos que o interprete definitivo de Allan Kardec seria o ator Paulo Goulart, infelizmente falecido em 2014; a ideia de vê-lo na pele do professor Rivail é hoje artigo da imaginação. Mas, Leonardo Medeiros é esforçado, tanto quanto o restante do elenco – o roteiro não ajuda, porém, e as falas ditas qual se escritas por um William Shakespeare desprovido de inspiração chamaram a atenção da crítica. De fato, acaba por emprestar um aspecto documental as cenas, parecendo um desses filmes de baixo orçamento feitos para a TV, e não uma superprodução destinada as salas de cinema.

Contudo, o que de fato começou a incomodar no filme é o retrato construído da protagonista, que a Sra. Anna Blackwell, a primeira tradutora para o inglês das obras espíritas de Allan Kardec, assim definiu:

Pessoalmente Allan Kardec era de estatura média. Compleição forte, com uma cabeça grande, redonda, maciça, feições bem marcadas, olhos pardos, claros, mais se assemelhando a um alemão do que a um francês. Enérgico e perseverante, mas de temperamento calmo, cauteloso e não imaginoso até a frieza, incrédulo por natureza e por educação, pensador seguro e lógico, e eminentemente prático no pensamento e na ação. Era igualmente emancipado do misticismo e do entusiasmo. Grave, lento no falar, modesto nas maneiras, embora não lhe faltasse uma certa calma dignidade, resultante da seriedade e da segurança mental, que eram traços distintivos de seu caráter. Nem provocava nem evitava a discussão, mas nunca fazia voluntariamente observações sobre o assunto a que havia devotado toda a sua vida, recebia com afabilidade os inúmeros visitantes de toda a parte do mundo que vinham conversar com ele a respeito dos pontos de vista nos quais o reconheciam um expoente, respondendo às perguntas e objeções, explanando as dificuldade, e dando informações a todos os investigadores sérios, com os quais falava com liberdade e animação, de rosto ocasionalmente iluminado por um sorriso genial e agradável, conquanto tal fosse a sua habitual seriedade de conduta que nunca se lhe ouvia uma gargalhada. Entre as milhares de pessoas por quem era visitado, estavam inúmeras pessoas de alta posição social, literária, artística e científica. O Imperador Napoleão III, cujo interesse pelos fenômenos espíritas não era mistério para ninguém, procurou-o várias vezes e teve longas palestras com ele nas Tuileries, sobre a doutrina de ‘O Livro dos Espíritos’.


Duas ocasiões no filme chamam a atenção – quando recebe mensagem mediúnica ameaçadora, torna-se paranoico e acovardado, tentando impedir mesmo que Amélie (Sandra Corveloni) atenda a porta de casa; em outro momento, tomado por inseguranças e carente da aprovação de seu trabalho, recebe Ermance Dufaux e seu pai em sua casa, acabando com esta impondo-lhe a mão sobre o peito em plena prática psicofônica. A cena toda acabou por vencer qualquer ânimo de nossa parte por manter plena a atenção diante do que se passava na tela – as suas reações ao Auto de Fé de Barcelona apenas somaram para vislumbrar com insistência ao relógio, ansiando pelo fim da projeção. Nem vagamente alguém que fora descrito com feições germânicas e uma personalidade fria, cautelosa, calma e segura passaria por aquela figura interpretada por Leonardo Medeiros – reitera-se que o problema não está na interpretação, mas no que o roteiro exige do ator, na composição do ethos da personagem, ou seja, o conjunto das características que compõem a personalidade deste.

Como se reconhece, pelos frutos, a árvore que os gerou, pelas Obras Básicas se ponde conhecer Allan Kardec, acrescendo-lhe o adjetivo de homem eminentemente cerebral; alguém que fora descrito, ainda, pelo astrônomo Camille Flammarion em discurso proferido diante de sua tumba como dotado de razão reta e judiciosa, o bom-senso encarnado. O professor Rivail é uma figura cuja distância temporal e escassez documental dificultam o retrato, cuja personalidade o torna a mais improvável das personagens a serem abordadas pela ficção, ainda mais na condição de protagonista – uma personalidade à pouco retratada pelo cinema que poderia ser um modelo mais próximo de Allan Kardec é a de Neil Armstrong no filme O Primeiro Homem. Interpretado ali por Ryan Gosling, o astronauta é frio, distante, evasivo até, preferindo chorar a morte da filha na solidão e recolhimento oculto de um gabinete. O Codificador é um sujeito que aí oferece possibilidades mais interessantes, a de representar um homem de intelecto privilegiado desvendando um ramo de conhecimento todo novo – alguns críticos mesmo se ressentiram disto; com um diretor mais habilidoso, esta poderia ser uma boa maneira de mostrar um cético de pensamento livre sendo levado, por esforços próprios, a uma descoberta que o converte a um ramo de saber até então oculto.


Muitas passagens do filme reinterpretam em falas diversas passagens das notas de Allan Kardec presentes em Obras Póstumas, e outras mais das Obras Básicas – uma em específico, quando rememora a mensagem do Espírito da Verdade acerca dos escolhos decorrentes de aceitar a missão de codificar o Espiritismo, o filme se aproveita desta para buscar novamente imprimir pela insegurança alguma humanidade a personagem, como se a personalidade sistemática do Codificador não bastasse para tanto. A nota anexa a transcrição da mensagem mediúnica é a seguinte:

Escrevo esta nota a 1º de janeiro de 1867, dez anos e meio depois que me foi dada a comunicação acima e atesto que ela se realizou em todos os pontos, pois experimentei todas as vicissitudes que me foram preditas. Andei em luta com o ódio de inimigos encarniçados, com a injúria, a calúnia, a inveja e o ciúme; libelos infames se publicaram contra mim; as minhas melhores instruções foram falseadas; traíram-me aqueles em quem eu mais confiança depositava, pagaram-me com a ingratidão aqueles a quem prestei serviços. A Sociedade de Paris se constituiu foco de contínuas intrigas urdidas contra mim por aqueles mesmos que se declaravam a meu favor e que, de boa fisionomia na minha presença, pelas costas me golpeavam. Disseram que os que se me conservavam fieis estavam à minha soldada e que eu lhes pagava com o dinheiro que ganhava do Espiritismo. Nunca mais me foi dado saber o que é o repouso; mais de uma vez sucumbi ao excesso de trabalho, tive abalada a saúde e comprometida a existência. Graças, porém, à proteção e assistência dos bons Espíritos que incessantemente me deram manifestas provas de solicitude, tenho a ventura de reconhecer que nunca senti o menor desfalecimento ou desanimo e que prossegui, sempre com o mesmo ardor, no desempenho da minha tarefa, sem me preocupar com a maldade de que era objeto. Segundo a comunicação do Espírito de Verdade, eu tinha de contar com tudo isso e tudo se verificou. Mas, também, a par dessas vicissitudes, que de satisfações experimentei, vendo a obra crescer de maneira tão prodigiosa! Com que compensações deliciosas foram pagas as minhas tribulações! Que de bênçãos e de provas de real simpatia recebi da parte de muitos aflitos a quem a Doutrina consolou! Este resultado não mo anunciou o Espírito de Verdade que, sem dúvida intencionalmente, apenas me mostrara as dificuldades do caminho. Qual não seria, pois, a minha ingratidão, se me queixasse! Se dissesse que há uma compensação entre o bem e o mal, não estaria com a verdade, porquanto o bem, refiro-me às satisfações morais, sobrelevaram de muito o mal. Quando me sobrevinha uma decepção, uma contrariedade qualquer, eu me elevava pelo pensamento acima da humanidade e me colocava antecipadamente na região dos Espíritos e desse ponto culminante, donde divisava o da minha chegada, as misérias da vida deslizavam por sobre mim sem me atingirem. Tão habitual se me tornara esse modo de proceder, que os gritos dos maus jamais me perturbaram.

Parece-nos claro que não obstante toda campanha em contrário, toda a tribulação, a saúde física de Allan Kardec sofreu mais que seu desejo de chegar a um propósito – laborou para a morte, abreviou a própria existência para alcançar um objetivo; e tão certo são suas próprias palavras para descrever um estado de espírito inabalável quanto a lógica simples que não pode conceber um intelectual de meia idade hesitante, inseguro, acovardado frente a um desafio mental de tal monta – nesta altura da vida, ou se aceita ou se recusa, ou é fácil ou simplesmente impossível. Todo o processo intelectivo exigido do professor Rivail, certamente, não constituiu per si o maior ou mais truncado embaraço; na qualidade de Espírito missionário, possuía as ferramentas para a execução da tarefa. O filme peca nesta retratação, ficando muito aquém do biografado. E nisto se concentra o seu malogro. Allan Kardec merece mais.


sexta-feira, 13 de setembro de 2019

O vídeo de Pondé


Detratores. No passado quanto no presente cabe ao espírita defrontar com estes, investidos sempre dos mesmos argumentos e da mesma presunção – nos dias que correm, contudo, a singularidade dos tempos pelos quais avança a nação brasileira, eventualmente, pode trazer alguma novidade. Velhas fórmulas e velhos sistemas não têm funcionado mais para certo extrato social – as disciplinas do conhecimento humano são complexas e o tempo para estudá-las é escasso; o sacerdote já não vem ao encontro de uma maturação de alma que pede mais, mas prossegue com o empenho minguado de sempre. Em meio a polarização política e ideológica, os discursos se perdem no vazio do óbvio, numa guerra inane entre o politicamente correto e o incorreto – mas os tempos repudiam a isenção, pedem, exigem a tomada de posição, seja ela qual for. Os líderes da nova vanguarda do pensamento usurpam a importância clerical e falam dos púlpitos da nação a um rebanho cujos indivíduos se creem mais inteligentes que seus pares. Em um país de analfabetos funcionais este é o novo êxtase religioso. No grande mercado midiático o sujeito deve escolher seu líder, seu oráculo, seu guru, aquele a cujas palavras dará eco – Mário Sergio Cortela, Clóvis de Barros Filho, Augusto Cury, Leandro Karnal, Luiz Felipe Pondé, Olavo de Carvalho, Marco Antonio Villa ou qualquer outro dentro deste espectro.

Luiz Felipe Pondé é o filósofo do politicamente incorreto, da crítica ao simulacro da inteligência e bondade, desta grande máscara social que todos buscam vestir, da grande demagogia do homem que pratica a forma mais débil de desonestidade – aquela impingida contra si mesmo. Além de lecionar na Academia, filosofa em artigos para jornais e livros – seu O Guia Politicamente Incorreto da Filosofia, uma de suas obras de maior vendagem, possui um começo promissor, mas suas bravatas acabam por resvalar na obviedade, tornando-se estanques pouco após a metade do livro, redundando numa experiência de leitura estétil. Nas entrelinhas de suas provocações filosóficas há um prazer indisfarçável, como se as dirigisse aos filhos bem-nascidos da nação, da qual se compõe por certo, a massa de seus alunos – pessoas que tem horror a ideologia de direita, que vertem suores diante de um discurso contrário ao aquecimento global, tem ódios intestinos de quem usa a palavra poetisa ao invés de poeta, etc. Imagina-se que este público, provavelmente, se sinta ofendido com este exercício de sagaz inventividade filosófica levada a efeito pelo pensador de cachimbo; Olavo de Carvalho também aprecia um bom discurso regado a tabaco, e corriqueiros palavrões. Pondé abre mão destes no entanto, mantendo a placidez entre um trago e outro, fazendo do coloquialismo discursivo uma prática menos prazerosa que necessária, afinal, o publico precisa entender o que lhe passa pela cabeça entre as listas de pensadores que sustentam seu patrimônio intelectual.

Além dos muitos compromissos que o fazem uma figura sempre presente nos veículos de mídia, ele mantém um canal no Youtube, e foi neste que a 14 de setembro de 2017 baixou um vídeo sob o título O Espiritismo é uma filosofia respeitada pelo mainstream filosófico? - para evitar dissabores próprios a sempre complexa questão de direitos autorais vertidos ao ambiente virtual, bem como a correr o risco de o vídeo ser deletado desde sua origem, transcrevemos palavra por palavra a preleção de cerca de 3 minutos onde o filósofo leva em conta o Espiritismo:

O Espiritismo é uma filosofia respeitada pelo mainstream filosófico? Não, não é. Com isso eu não quero dizer que você só pode seguir coisas que é respeitado pelo mainstream filosófico. Quando eu falo mainstream filosófico quero dizer, digamos, uma tradição que vem da Grécia, com Platão e Aristóteles, que passa pela escolástica medieval, que toca em gente como Descartes, Pascal, Locke, Hobbes, Rousseau, iluministas em geral, e de lá para cá gente como Wittgenstein, Heidegger, ou seja, estou citando alguns nomes; o próprio Nietzsche, Marx, nomes que fazem parte do mainstream filosófico. O Espiritismo não é considerado uma filosofia, digamos assim, consistente. O Espiritismo é uma forma de crença que nasce de um sujeito chamado Allan Kardec, que na verdade assumiu esse nome, supostamente de um Espirito de uma reencarnação anterior dele; francês, mas que na França, todo mundo que reza no túmulo dele no Père-Lachaise é brasileiro, e que era um positivista. Então, a ideia que muitos espíritas falam de que o Espiritismo é uma Ciência, e que portanto, ele só acredita no que é provado... eu sempre tenho amigos espíritas, e converso com eles e tal... eu acho Candomblé enfim, infinitamente mais interessante do que o Espiritismo como forma religiosa inclusive de crença em Espíritos e coisas assim. E eu sempre pergunto aos espíritas kardecistas: mas, afinal de contas porque a gente não prova de uma vez por todas, diante de um grupo de pesquisa de céticos que existe essa coisa chamada reencarnação? Por que que pessoas que curam o câncer em outras pessoas não conseguem curar o câncer nelas mesmas, né? A teoria de que o Espirito está em eterna evolução é uma teoria legal, por que resolve tudo e não responde nada. Significa que você está sempre e sempre avançando e, por isso você não consegue resolver os problemas básicos que todo mundo gostaria de resolver agora. Uma outra coisa que sempre me chamou a atenção é por que a ideia de que o Espírito seja uma energia não resolve muita coisa, por que a energia é luz. Pra você lembrar quem você é, você precisa de um cérebro, a não ser que as suas memórias não tenham nenhuma relação com neurônios e fica então armazenadas num tipo de luz que é você. Só que até onde a gente sabe, se a gente viaja a velocidade da luz dissolve qualquer identidade que a gente tenha. Então, a noção de que no princípio Deus criou Espíritos inteligentes e imateriais, me parece uma versão positivista como Kardec, ou seja, uma linguagem que parece meio científica, pra velha história que Deus teria criado almas imortais. Então, portanto, o desejo que alguns espíritas tem de que o Espiritismo seja uma filosofia que faça parte, digamos assim, da filosofia mainstream, me parece completamente fora da realidade. Primeiro porque a maior parte do tempo eles ficam lendo esses livros, O Evangelho Segundo o Espiritismo por exemplo, né? Ou ficam lendo outros livros de Espíritos que, de repente, psicografaram esses textos e tal, e esses Espíritos não sabem nada além do que a gente já sabe; eles falam de amor, eles falam de desapego, coisa que Buda, Jesus e todo esse time aí já falou, não é? Então, me parece que o Espiritismo é uma religião entre outras, uma religião sem ritualística, uma religião sem liturgia, uma religião sem ritos, né? Uma religião sem igreja, por isso mesmo, eu acho, uma religião sem graça.

Dito com toda a pompa da retórica, este texto bem pouco filosófico até parece fazer algum sentido; mas, transcrito, perde força imensamente. O grande problema deste amontoado de professores, filósofos e palestrantes é, certamente, a agremiação que os sustenta. Não se pode duvidar que possuam sua parcela de conhecimento, e a custa de treino, prática e experiência, ou apenas talento natural, sejam capazes de transmitir de modo excepcional o que sabem – mas, a saber o que sabem, não sabem tudo acerca de todas as disciplinas de conhecimento humano. Para seus aderentes isto pouco importa – é da tradição dos intelectuais meterem-se a opinar acerca de tudo, e com grandes manobras argumentativas, passam por mestres. Porém, esta é uma prática que põe a prova o sujeito, e o Espiritismo já teve opositores mais hábeis em denegri-lo, sem que estes denunciassem de pronto jamais terem posto olhos a obra de Allan Kardec. Aqui, todavia, Pondé parece um amador de aptidão ginasiana. Está claro que jamais leu as obras componentes da Doutrina dos Espíritos – isto, mais claro fica, ao apontar amigos seus, supostamente espíritas, como as fontes de seus conhecimentos acerca da Doutrina.

Seus partidário e admiradores não se atentarão, sequer, para asneiras da ordem da afirmação segundo a qual o Espírito é energia! Essa ideia pode bem encontrar aderentes em certos círculos da prática espírita, ilegítima, as quais frequentam estes tais amigos do filósofo, mas é mais prevalente no vocabulário de ‘bichos-grilos’ egressos do movimento hippie dos anos 1960, daqueles que se voltaram ao espectro exotérico do ocultismo ocidental – tudo é energia, quando na realidade, é fluido. Os conhecimentos de Pondé acolhem, por exemplo, a questão das terapias espirituais, ou espiritualistas; talvez ele esteja mesmo pensando nas tão polêmicas cirurgias, as quais apenas indivíduos dotados de grande ignorância e desespero arriscam submeter-se. Esta, por si só, daria uma postagem extensa; afirma-la qual manifestação do Espiritismo é sinal de desconhecimento profundo – espera-se isto do populacho iletrado, mas não de um filosofo graduado em Israel? Depende de quem dá a ele a respeitabilidade que acredita ser merecedor. Respeitamos, desde que ele se atenha a seu campo de conhecimento.

Luiz Felipe Pondé comete a clássica falácia lógica do argumentum ad ignorantiam, largamente utilizada por detratores de sempre, que prescreve que sua ignorância da vasta literatura acerca da reencarnação é prova de que ela não há – é o mesmo que afirmar que o que lhe escapa ao conhecimento não existe; pode ser aplicada numa afirmação tradicional dos céticos que defendem que nunca tendo sido detectada vida fora da Terra, ela não existe, por exemplo. Carl Sagan teria afirmado que ‘ausência de evidencia não é evidencia de ausência’, uma frase que demonstra uma postura um cadinho mais previdente e de maior bom senso, denunciadora de um pensador de primeira ordem, e que bem poderia guiar o modus pensandi do sr. Pondé. Mas as evidências existem, o que é ainda mais acusadora do proceder do filósofo.

Outra questão que suscitaria um desenvolvimento maior, para além daquele mesmo que demos em artigo anteriormente publicado neste blog (3 de agosto de 2019) é a do Espiritismo como uma religião. Mas, neste específico e exclusivo caso damos total razão ao filósofo - vertido a uma reles religião, o Espiritismo perde sua força e razão de ser. Quanto a sua graça, Pondé vê elegância no mistério religioso, como demonstra em seus escritos e entrevistas - para ele, um milagre se basta por sua condição, ou seja, indefinidamente sem explicação e razão de dogma. Uma doutrina que oferte uma alternativa lógica que explique tais ordens de fenômenos não é, senão, um atentado a beleza que ele vê, como algo nocivo a sua razão intrínseca de ser - um filósofo existe para questionar, e não para encontrar respostas, afinal. Porém, um raciocínio assim desenvolvido, raso, aborrecido e sem esforço, demonstra o quão apelativo é este vídeo, que se destina a instilar o escândalo e a chocar as sensibilidades mais vulneráveis; e o quanto leva em conta Pondé a Doutrina? - ele pouco se dá por isso. A recíproca, porém, não é a realidade. Pondé, assim como outros detratores cujos argumentos atestam um obscurantismo intelectual agudo é, e deve permanecer sendo o alvo de atento exame por parte dos espíritas, não apenas para impedir ataques disparatados, mas para evitar a divulgação de conceitos equivocados daqueles que pensam ser espíritas. São estes os responsáveis, em primeiríssima instância, das bobeiras saídas da boca de Luiz Felipe Pondé. Permaneçamos vigilantes.
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O vídeo, para ser observado in loco pelos interessados
https://www.youtube.com/watch?v=xwsiHwd5FSc