1. Introdução
A título de dar prosseguimento aos questionamentos
levantados no artigo anteriormente publicado sem que, todavia, lhe seja uma
continuação direta, o presente se propõe a focar nas ocasiões em que o suposto
guia espiritual de Francisco Cândido Xavier, o Espírito que atendeu pelo
consagrado cognome de Emmanuel, veio dar cumprimento a sua tarefa de orientar a
este. Desde antes se esclareceu que o proceder de Emmanuel esteve muito ao
largo da atuação oculta esperada de um guia espiritual segundo o prescrito pelo
Espiritismo, de fato adequando-se mais ao posto de mentor, como era
apontado por Chico e seus aderentes. Havendo construído uma carreira literária
póstuma, o Espírito não demonstrou nenhum pudor em revelar-se por meio de
romances autobiográficos, dando registro das identidades possuídas em vidas
anteriores – na de maior destaque e pelo qual é lembrado, teria sido o bisneto
de Públio Lêntulo Cornélio Sura, conspirador romano que, ao lado de Lúcio
Sérgio Catilina tentou dissolver a República Romana cerca de 60 anos antes do
nascimento de Jesus. Deste suposto bisneto não há prova que sustente sua
existência, posto que uma vez executado o conspirador Sura em 63 a.C., seu
corpo não foi reclamado por nenhum familiar ou parente consanguíneo, proceder
de praxe, resultando concluir que não tivera filhos – menos ainda um bisneto.
Estes e outros pontos obscuros e duvidosos de seus livros já
foram com minudência abordados – resta, no entanto, com o objetivo de chegar-se
a uma conclusão acerca da natureza de Emmanuel, observar os extratos da vida de
Chico Xavier, seu protegido, em sua atuação direta como guia. Algumas
biografias foram detidamente examinadas para este intento; deixamos uma lista
destas ao final do presente artigo para que o leitor possa, por seus próprios
esforços consultá-las. Parte destas histórias e causos foram catalogadas pelo
próprio Chico Xavier, seja por havê-las transcrito em artigos publicados amiúde
na imprensa especializada, seja por tê-las relatado a amigos, companheiros e
familiares, ou diante do público, como fez na histórica entrevista concedida ao
programa Pinga-fogo da extinta TV Tupi, onde narrou o hoje famoso caso em que
se viu sob forte turbulência em um avião que o levava de Uberaba para Belo Horizonte.
A estes, portanto.
2. Passagens da vida de Chico Xavier
José Álvaro Santos, poeta, levou Chico Xavier para a capital
mineira em 1933 à promessa de um trabalho que lhe pagasse melhor que o armazém
de José Felizardo Sobrinho – conseguiu este uma licença de três meses e partiu
com o versejador para Belo Horizonte, a contragosto de Emmanuel. Passado esse
período e nada de emprego preparou-se para partir quando dois amigos de José
Álvaro Santos o interpelaram, oferecendo emprego e estudo gratuito a custa de
renegar O Parnaso de Além-Túmulo, seu primeiro livro, como obra dos
Espíritos. Rapaz ainda, negou-se Chico a cumprir a condição, ademais os
argumentos dos sujeitos que compararam-no a um sofrê, um pássaro hábil em
imitar o estilo de canto de outras aves – Chico seria o sofrê dos poetas
mortos, ou seja, nada de Espíritos. Emmanuel que não concordara com a viajem
desde o princípio aconselhou o matuto: “_Sim, volte a Pedro Leopoldo e
procuremos trabalhar. Você não é um sofrê, mas precisa sofrer para aprender.”
--
Quando retornou a Pedro Leopoldo, Chico voltou feliz as
atividades do centro espírita – mas o público que já era pouco, minguou. Viu-se
então sozinho a realizar as atividades da casa para os desencarnados. As
histórias corriam e não poucos quiseram colocá-lo num sanatório. O padre Júlio
Maria de Manhumirim era um renhido detrator do Espiritismo e, em particular, da
figura de Chico Xavier – por treze anos o atacou por meio de artigos no
periódico 'O Lutador', que fazia fossem entregues na casa do médium.
Parou quando morreu e Emmanuel assim falou a Chico por ocasião do passamento: “_Não
te aflijas com os que te atacam. O martelo que atormenta o prego com pancada o
faz mais seguro e mais firme.”
--
Em maio de 1935 o correspondente de 'O Globo', Clementino
de Alencar, desembarca em Pedro Leopoldo a fim de decifrar o fenômeno Chico
Xavier. Acompanha uma das sessões no centro espírita e recebe uma mensagem em
inglês de Emmanuel, e outra ainda, quase hermética: “_A vida, em suas
causalidades profundas, escapa aos vossos escalpelos, e apenas o embriogenista
observa, na penumbra e no silêncio, a infinitésima fração do fenômeno
assimilatório das criações orgânicas.” Não seria a primeira e nem a última
das mensagens do guia de Chico a desafiar qualquer tradução, embora estivesse
claro que usava da língua portuguesa para se expressar.
--
Chico Xavier era elogiado e exaltado por seus aderentes;
mas, amargurado por ressalvas feitas por Emmanuel e, em especial, por sua mãe
que o alertara acerca de ter sua mediunidade suspensa se cedesse aos
prazeres da matéria, evitava as armadilhas do ego rebaixando-se, recusando
qualquer enaltecimento, humilhando-se se preciso fosse. Certa feita, repreendeu
uma mulher pedindo que não o elogiasse a maneira que procedia, pois não passava
de um verme no mundo. Emmanuel interveio: “_Não insulte o verme. Ele
funciona, ativo, na transmutação dos detritos da terra, com extrema fidelidade
ao papel de humilde e valioso servidor da natureza. Ainda nos falta muito para
sermos fiéis a Deus em nossa missão.” Chico passou, então, a definir-se
como subverme.
--
Certa feita, Chico recebeu convite para apresentar-se a um
centro espírita de Belo Horizonte; sua presença era considerada indispensável
pelos anfitriões. Num laivo de rara vaidade, o médium pediu dois dias de folga
e, procedimento mais raro ainda, não pediu consentimento a Emmanuel, embarcando
de trem para a capital. Este, todavia, não demoraria a manifestar-se – durante
a viajem surgiu a Chico dizendo: “_Então, você se julga indispensável e, por
isso, rompeu todos os obstáculos para viajar como quem realiza uma tarefa
fundamental? Já refletiu que o serviço do ganha-pão é indispensável a você?”
Bastou para Chico sair do trem e apanhar outro de retorno a Pedro Leopoldo.
Nunca mais faltou ao trabalho por que motivo fosse, até se aposentar.
--
Os necessitados que acorriam para Chico eram muitos, e até
no trabalho eles o perturbavam – deu-se ocasião em que uma mulher o procurara
por toda parte, sendo frequentemente despistada para que deixasse o médium
trabalhar em paz: as cousas do Espiritismo apenas à noite, no centro. Esta
mulher foi a primeira a chegar, e desde pronto repreendeu Chico aos tapas pela
trabalheira de persegui-lo ao longo do dia. Ele se irritara, mas fora acalmado
por Emmanuel que o fez lembrar-se de uma fala sua: “_Sua missão é formar
livros e leitores. Formar leitores é suportar suas exigências, sem censuras.
Formar livros é se esquecer de você.” Nenhum leitor em potencial poderia
ser deixado de lado; nenhum divulgador, por menor que fosse, deveria ser
ignorado ou atendido com descuido.
--
A vista de Chico Xavier nunca foi boa – tinha uma doença
crônica que causava-lhe muita dor. Certa noite, a agonia se apoderou dele e,
cansado, pediu o auxílio de Emmanuel, que duramente lhe respondeu: “_Sua
condição não exonera você da necessidade de lutar e sofrer, em seu próprio
benefício, como acontece às outras criaturas. Se nem Cristo teve privilégios,
por que você os teria?” O sofrimento vinha acompanhado de lições aviltantes
e depreciativas. Numa ocasião, o olho sangrara, e Chico passara o fim de semana
deitado recuperando-se. Emmanuel não podia deixar por menos, e interpelou o
médium, que respondeu-lhe o óbvio: “_O senhor não vê que meu olho está
doente?” O Espírito não se satisfez: “_E o que o outro está fazendo? Ter
dois olhos é um luxo.”
--
Iniciava-se a década de 1940 e Chico parou de urinar – o
ataque de uremia, alertou-lhe o médico, poderia ser fatal se o médium não
urinasse dentro de 24 horas. A perspectiva da morte avizinhava-se dele e, como
de costume, evocou a presença de Emmanuel. Desta feita, sem pedido de ajuda,
apenas desejava ser recebido no além por seu guia. O Espírito, todavia, era
muito atarefado para dar atenção ao seu protegido: “_Estarei ocupado. Mas se
você sentir que a hora chegou recorra aos amigos do (centro espírita)
Luiz Gonzaga e, depois, não se descuide das sessões de quarta-feira
(destinadas aos Espíritos sofredores). Espere pacientemente a sua vez de ser
atendido. Você não é melhor do que os outros.”
--
Nosso Lar
fora a décima nona obra psicografada por Chico Xavier – para escrevê-la, ou
antes, traduzir o mais perfeitamente possível as descrições fantásticas de
André Luiz, ele fora levado para conhecer a Colônia fluídica, ciceroneado por
este e por Emmanuel. De retorno, as dúvidas ainda persistiam, mas o trabalho
foi feito e o ponto final fora pingado. Como de hábito, consultou seu guia
diante do desejo de estudar a medianimidade da psicografia, ao que este lhe
respondeu: “_Se a laranjeira quisesse estudar o que se passa com ela na
produção de laranjas, com certeza não produziria fruto algum. Vamos trabalhar
como se amanhã já não fosse possível fazer nada. Para nós, o que interessa
agora é trabalhar.”
--
Chico Xavier trabalhava muito – ocorreu uma noite de voltar
para casa era mais de 1 hora da manhã, exaurido. Ao chegar ao lar, deu com seus
gatos doentes, tendo vomitado por toda a sala. Apesar do mau cheiro terrível,
preferiu a cama; pela manhã pediria a uma irmã que arrumasse tudo. No caminho
para o quarto, Emmanuel intervém: “_Você, que vem de uma reunião espírita,
está fugindo da sua obrigação? Está exigindo que uma pobre menina cansada de
trabalhar nas panelas e no tanque para que não lhe falte comida nem roupa
lavada, limpe esta sujeira? Você vai pegar um pano, vai trazer água, sabão e
vamos lavar.” Por lavar, claro, apenas Chico o fez. O Espírito emendaria
ainda: “_No Espiritismo, a pessoa tem que começar estudando nos grandes
livros e também lavando as privadas, trabalhando, ajudando os que estão com
fome, lavando a ferida de nossos irmãos. Se não tivermos coragem de ajudar na
limpeza de um banheiro, de uma privada, nós estaremos estudando os grandes
livros de nossa doutrina em vão.” Cabia a Emmanuel interpretar de modo
bastante pessoal ao Espiritismo, e como devia um espírita se comportar. A
Chico, nem o estudo das obras da Doutrina, pois entre deveres e direitos apenas
os primeiros lhe couberam.
--
O médium de Pedro Leopoldo não era afeito a momentos de
descanso e diversão – numa ocasião, contudo, deu-se a demandar algum tempo
entre conversas frívolas com amigos. Emmanuel não podia consentir com aquilo e
interveio: ou Chico se trancava imediatamente para escrever ou ele iria embora:
“_Você fará tudo aproveitando os minutos.” Conversa encerrada.
--
A rotina de Chico Xavier era massacrante, e o peso só fazia
aumentar; ansiava por um alívio, por um caminho mais tranquilo e calmo.
Emmanuel veio em resposta: “_A estrada larga, pavimentada é mais suscetível
de desastres, porque nela a velocidade é ameaçadora. A estrada estreita,
entulhada, nos faz caminhar com mais cuidado.” Chico esboroaria os pés e
perderia a saúde na estrada acidentada da vida.
--
Em 1944 estoura o escândalo Humberto de Campos – a viúva do
jornalista e escritor acionara o médium mineiro na justiça. O matuto do
interior de Minas Gerais via-se diante da possibilidade de ser preso, e seus
queixumes para Emmanuel tiveram a seguinte resposta: “_Meu filho, você é
planta muito fraca para suportar a força das ventanias. Tem ainda muito que
lutar para um dia merecer ser preso e morrer pelo Cristo.” Chico estava
aquém da pior das celas.
--
Refeito do processo movido contra si pela viúva de Humberto
de Campos, Chico estava feliz e, para sua surpresa, recebeu de presente de
empresários paranaenses um piano. Espalhara-se o boato que, próximo ao fim de
sua existência, o médium mineiro passaria a psicografar partituras dos grandes
gênios da música. Verdade ou não, os representantes da marca do piano fizeram
sua parte, atrelando esta ao médium por meio do mimo. Amante de música
clássica, Chico empolgou-se e contratou aulas de piano – diversamente do que
sempre fazia, resolveu ficar com o presente e usá-lo. No dia de sua primeira
aula, em meio a doentes e necessitados que aguardavam sua assistência, ele
apenas esperava a chegada da professora. Emmanuel surgiu e ralhou: “_Quer
dizer que essa gente toda que está aí sofrendo, angustiada, ficará aguardando o
dia em que você resolva atendê-la?” Chico dispensou a professora e
livrou-se do piano.
--
Quando o escândalo envolvendo a obra psicográfica atribuída
a Humberto de Campos era apenas uma lembrança infeliz do passado, novo golpe
sobreveio a Chico – seu sobrinho residente em Sabará, Amauri Pena Xavier,
denunciou o tio como farsante; mensagens e livros eram produção própria,
decorrente de espantosa memória e capacidade de imitação do médium. A imprensa
deitou o sensacionalismo em reportagens mais interessadas em vender jornais e
revistas que em apurar a verdade. Desanimado, Chico recorre a Emmanuel, pedindo
desta feita uma orientação a própria mãe de Jesus; dias se passam até que o 'mentor'
retorna com a mensagem mariana: “_Isso também passa.” Chico a escrevera
na cabeceira da cama e a lera toda manhã como ânimo para suportar o dia. Mas,
Emmanuel dera sua emenda, afinal a frase se aplicava a momentos tristes, e
também aos alegres.
--
Em 1958 Chico Xavier ia de avião de Uberaba para Belo
Horizonte – a nave enfrentava turbulência devido a um vento de cauda. Por mais
de dez minutos tudo sacudiu e tremeu; ainda que os Espíritos lhe fossem
íntimos, Chico não era afeito a ideia de morrer e, como todos no avião,
demonstrava isto com veemência. Emmanuel interveio – como era possível a um
espírita fazer tamanho alarde diante da morte? Cansado e oprimido, e ante da
possibilidade de uma morte terrível, Chico desafiou seu 'mentor'
afirmando estar apavorado. Emmanuel recomendou: “_Está bem. Então, cale a
boca para não afligir a cabeça dos outros com seus gritos. Morra com fé em
Deus, morra com educação.”
--
Em 1967 Chico Xavier comemorou a efeméride de completar 40
anos de mediunato; de Emmanuel ganhou a responsabilidade de receber as
mensagens de Espíritos aos seus parentes encarnados. Eram mensagens
particulares, e a assistência ficava em expectativa irreal, atingindo os
limites do descontrole emocional. Certa noite um sujeito devolveu a mensagem
que Chico lhe entregara, atribuída a um familiar morto, com cusparadas –
alegava serem falsas aquelas palavras. O médium aguentou passivamente, caindo
em prantos quando de volta ao lar. Emmanuel endureceu: “_Quando alguém
cuspir em seu rosto, diga simplesmente que a chuva molhou sua face, se alguém
pedir explicações. Não reclame.”
--
A década de 1970 passara de sua metade quando o coração de
Chico começou a mostrar sinais de cansaço – a angina passou a afligir-lhe. Fora
a doença que vitimara sua mãe. Acometido pelas dores angustiantes, recorreu uma
vez mais a Emmanuel, e dele ouviu laconicamente: “_Afinal, o que querias?
Não maltrataste as energias do corpo? As lutas e as caminhadas pelo bem, embora
contem com o amparo do Mundo Maior, não excluem as limitações e os desgastes do
vaso físico terrestre.” Apenas esqueceu-se de afirmar o Espírito que muito
desta luta e parte da caminhada se deveu não a sua orientação, mas ao
constrangimento e a mão pesada que impôs sobre o médium, não lhe dando paz ou
espaço para seu livre-arbítrio.
--
Quando Emmanuel iniciou contatos ostensivos frequentes com
Chico Xavier, estabelecera com ele o compromisso da recepção psicográfica de
trinta livros. Dezesseis anos depois, em 1947, ele põe o ponto final em Volta,
Bocage, a trigésima obra. Emmanuel aparece e sentencia – mais trinta
livros. Chico anui, desanimado. Em 1958 Evolução em Dois Mundos é
lançado, seu sexagésimo livro, psicografado em parceria com Waldo Vieira –
findo mais um acordo com Emmanuel, Chico estava feliz novamente, diante da
perspectiva de diminuir o ritmo. Seu 'mentor', contudo, veio com um novo
comunicado: “_Os mentores da Vida Maior, perante os quais devo também estar
disciplinado, me advertiram que nos cabe chegar ao limite de cem livros.”
Onze anos se passariam até completar os quarenta volumes restantes, e Chico uma
vez mais rejubilava-se; Poetas Redivivos era a obra de número cem
acordado com Emmanuel. O Espírito, uma vez mais, portava más notícias para o
médium: “_Estou na obrigação de dizer a você que os mentores da Vida
Superior, que nos orientam, expediram uma instrução: ela determina que sua
atual reencarnação seja desapropriada, em benefício da divulgação dos
princípios espírita-cristãos. Sua existência, do ponto de vista físico, fica à
disposição das entidades espirituais que possam colaborar na execução das
mensagens e livros, enquanto seu corpo se mostre apto para nossas atividades.”
Chico não engoliu a indignação e ralhou, defendendo que o Espiritismo prescreve
o livre-arbítrio: e se ele não desejasse prosseguir? Emmanuel encerrou o
assunto afirmando: “_A instrução a que me refiro é semelhante a um decreto
de desapropriação, quando lançado por autoridade na Terra. Se você recusar o
serviço a que me reporto, os orientadores dessa obra de nos dedicarmos ao
cristianismo redivivo terão autoridade bastante para retirar você de seu atual
corpo físico.” Diante desta velada ameaça de morte, Chico psicografou mais
três centenas de livros até o ponto em que a saúde não mais o permitiu, às
portas da morte.
3. Apuração
Quem tem o privilégio de uma relação tão próxima,
íntima, particular e ostensiva com seu benfeitor espiritual, assim como Chico
Xavier? Excetuando-se as biografias que, a feição das hagiografias dos santos
católicos, exaltam qualquer fato ligado a existência do médium mineiro, quem
como Marcel Souto Maior buscou a isenção jornalística para abordar os fatos,
reconheceu a anormal atuação de Emmanuel – não é, senão pela explicação
ululante que se pode inferir pela identidade deste: um obsessor manifesto,
patente. Que benfeitor espiritual desapropria a vida de seu protegido? Que
benfeitor espiritual espezinha seus sofrimentos? Que benfeitor constrange,
humilha, interfere no livre-arbítrio deste? Atentarão as vozes dos fanáticos
que os fins justificam os meios, que a mediunidade é maior que o homem, que a
mensagem deve sobrepujar o indivíduo – mas estes não são espíritas; são já
qualquer outra cousa, um amontoado de idólatras sincréticos. As evidências são
obnubiladas pela ignorância quanto ao prescrito pelo Espiritismo – então o
Espírito missionário deve ir adiante, como a cumprir um fadário sem o qual cai
derrotado, não resistindo espaço para a manifestação do livre-arbítrio? Allan
Kardec, um Espírito missionário evidente, tivera notícias de sua missão e com o
Espírito da Verdade colheu as seguintes impressões, dirimindo suas dúvidas:
“Não esqueças que pode triunfar, como podes falir. Neste
último caso, outro te substituiria, porquanto os desígnios de Deus não assentam
na cabeça de um homem. Nunca, pois, fales de tua missão; seria a maneira de a
fazeres malograr-se. Ela somente pode justificar-se pela obra e tu ainda nada
fizeste. Se a cumprires, os homens saberão reconhecê-lo, cedo ou tarde, visto que
pelos frutos é que se verifica a qualidade da árvore. (…) A nossa assistência
não te faltará, mas será inútil se, de teu lado, não fizeres o que for
necessário. Tens o teu livre-arbítrio, do qual podes usar como o entenderes.
Nenhum homem é constrangido a fazer coisa alguma.”
Segue-se a esta um sumário de dificuldades que o Espírito
alerta se abaterão sobre Allan Kardec, caso prossiga na missão – este
complementa a nota, escrita dez anos após tal comunicação, confirmando a estas
e os dissabores previstos, bem como o comprometimento da própria saúde física
diante do tamanho da tarefa. Porém, relata o júbilo com que recebera as
consequências benfazejas de tanto labor, afirmando sem laivos de vaidade que,
em nenhum momento sobreveio o desânimo diante das vicissitudes, mantendo-se
apartado de toda reação negativa que lhe lançaram detratores e opositores.
Cotejando-se os casos, verifica-se a oposição no tocante ao respeito a um dos
princípios fundamentais da Doutrina dos Espíritos – o livre-arbítrio. Caso se leve
em conta que o Espírito de Verdade tenha de fato sido Jesus de Nazaré, uma
hipótese sempre aventada, mais grave se verifica a atuação de Emmanuel frente a
Chico Xavier – ou alguém há de cometer o descalabro de meter no mesmo nível um
Espírito de escol como Jesus e este insipiente Emmanuel?
4. Cotejamento e conclusão
No artigo anteriormente postado aqui, transcreveram-se os
itens 246 e 247 do capítulo intitulado Da Obsessão de O Livro dos
Médiuns, onde o Codificador traça um perfil bastante apropriado de uma
espécie de obsessor que, parece-nos, adequa-se quase à perfeição a figura de
Emmanuel. Ponto a ponto, vamos cotejá-los ao que se conhece de Emmanuel,
lançando questões para se encontrar respostas que permitam a devida reflexão e
inferência acerca da identidade do Espírito; também aqui tomaremos de tudo
quanto foi exposto na postagem anteriormente publicada.
A_“Há
Espíritos obsessores sem maldade (…) dominados pelo orgulho e falso saber. (…)
Têm suas ideias (…) e querem fazer que suas opiniões prevaleçam. Para esse
efeito, procuram médiuns bastante crédulos para os aceitar de olhos fechados e
que eles fascinam, a fim de os impedir de discernir o verdadeiro do falso. São
os mais perigosos, (…) podem tornar cridas as mais ridículas utopias.”_Chico
Xavier em algum momento de sua trajetória lançou dúvidas quanto a ser Emmanuel
o seu guia espiritual? Em que ponto, mesmo dentre aqueles raros em que se opôs
aos caprichos deste, deixou de acatá-lo e obedecê-lo? Mesmo quando, durante o
processo de psicografia de Nosso Lar guardou dúvidas ao que punha no
papel, não permitiu que o trabalho fosse finalizado e publicado, sem o que,
contudo, lhe fosse podido estudar a psicografia, impedido por Emmanuel? E não
seria este um Espírito de cujas ideias próprias, ainda que contrárias ao
Espiritismo, as apresentou por meio de livros (O Consolador, A
Caminha da Luz, Emmanuel, etc.)? Não é uma ridícula utopia todo este
sistema que corrompeu a erraticidade por meio do ideário das Colônias
Espirituais, a qual sancionou ao auxiliar André Luiz, seu autor?
B_“Como
conhecem o prestígio dos grandes nomes, não escrupulizam em se adornarem com um
daqueles diante dos quais todos se inclinam, e não recuam sequer ante o
sacrilégio de se dizerem Jesus, a Virgem Maria, ou um santo venerado.”_O
uso do nome Emmanuel, um nome bíblico e profético, segundo a qual seria
conhecido o próprio Jesus tem algum significado? Não imporia ele respeito por
tacitamente levar a concluir, ainda que erroneamente, que Emmanuel fora um
Espírito de elite? Essa ideia subjacente não foi reforçada pela história
narrada em Há 2000 Anos, onde supostamente Emmanuel estivera na presença
de Jesus? Ou quando Chico, ingenuamente pede por um consolo a Virgem Maria, sem
levantar objeções a que Emmanuel poderia obtê-las para ele, diante dos
problemas causados por seu sobrinho? Ainda: não exorta respeito revelar haver
sido, outrossim, o padre jesuíta Manoel da Nóbrega, um dos fundadores da cidade
de São Paulo? Não teria sido a credulidade de Chico Xavier explorada por este
Espírito?
C_“Procuram
deslumbrar por meio de uma linguagem empolada, mais pretensiosa do que
profunda, eriçada de termos técnicos e recheada das retumbantes palavras –
caridade e moral. Cuidadosamente evitarão dar um mau conselho, porque bem sabem
que seriam repelidos. (…) A moral, porém, para esses Espíritos é simples
passaporte, (…) O que querem, acima de tudo, é impor suas ideias por mais
disparatadas que sejam.”_O estilo de escrita pomposa e pernóstica de
Emmanuel não de adequa ao perfil elaborado? Não foi grande parte dos atos de
benemerência levados a efeito por Chico Xavier movidos pela intervenção direta
de Emmanuel? Não foi ele a dobrar a vontade do médium para fazer além das
próprias forças e da saúde? O que desejara Emmanuel impedindo Chico Xavier de divertir-se,
de dar vazão ao desejo inofensivo de aprender piano? Ou reprovando suas
conversas frívolas com amigos e familiares? Não eram os ditados de suas obras o
que deveria importar mais que ao bem-estar do médium?
D_“Os
Espíritos dados a sistemas são geralmente escrevinhadores, pelo que buscam os
médiuns que escrevem com facilidade e dos quais tratam de fazer instrumentos
dóceis e, sobretudo, entusiastas, fascinando-os. São quase sempre verbosos,
muito prolixos, procurando compensar a qualidade pela quantidade. Comprazem-se
em ditar, aos seus intérpretes, volumosos escritos indigestos e frequentemente
pouco inteligíveis que, felizmente têm por antidoto a impossibilidade material
de serem lidos pelas massas. Os Espíritos verdadeiramente superiores são sóbrios
de palavras; dizem muita coisa em poucas frases. Segue-se que aquela
fecundidade prodigiosa deve sempre ser suspeita. Nunca será demais toda a
circunspecção, quando se trate de publicar semelhantes escritos.”_Chico
Xavier, algum dia, lançou dúvidas quanto a suposta superioridade de Emmanuel?
Não era a ele que sempre evocava para orientar-se, sujeitando seu
livre-arbítrio aos desvarios deste? Não é Emmanuel que, dentre as mais de
quatro centenas de livros psicografados por Chico Xavier, responde por um
quarto dentre estes? E quanto aos prefácios de obras alheias, ou as mensagens
de cunho moral, e toda sorte de escritos que indicam um loquaz em pleno
exercício? Não são estes mesmos livros de orientação ética um pastiche das mais
altas e edificantes lições morais de todos os povos e de todos os tempos? Não é
o proceder comum de um padre a compor sermões ao longo de décadas? E, embora
popular, não seria Emmanuel como que a roupa nova do imperador, alegadamente
compreendido por quem teme o estigma da estupidez por não haver sido capaz de
romper-lhe os desafios idiomáticos? Fascinado Chico Xavier, e enredado os
leitores, outrossim, que barreiras sê-lhe foram impostas para alardear o que
bem entendesse? Não foi a custa de algo inexistente como 'mentores da vida
maior' que ele prendeu seu médium até o fim?
E_“As
utopias e as excentricidades, que neles por vezes abundam e chocam o bom-senso,
produzem lamentável impressão nas pessoas ainda noviças na Doutrina, dando-lhes
uma ideia falsa do Espiritismo, sem mesmo se levar em conta que são armas de
que se servem seus inimigos, para ridicularizá-los. Entre tais publicações,
algumas há que, sem serem más e sem provirem de uma obsessão, podem
considerar-se imprudentes, intempestivas, ou desazada.”_Que pensaria o
sujeito que, estudando a O Livro dos Médiuns lesse os apontamentos de
Emmanuel em sua obra homônima acerca do caráter desgraçado dos médiuns? Que
pensaria este, ainda, acerca da questão das almas gêmeas em resposta contida em
O Consolador? Ou ainda seu aval a doutrina das Colônias Espirituais,
estando este hipotético estudante diante de O Céu e o Inferno? Ainda e
uma vez mais, que pensar do infame 'Culto do Evangelho no Lar', cuja
mensagem deste instila a prática? E quantos não tiveram o espírito de
questionar a postura frontalmente contrária ao Espiritismo deste escrevinhador
de além-túmulo, abraçando seus sistemas, adotando suas ideias?
Tais ordens de questionamentos visam apenas colaborar para a
reflexão; e a que levam estes, afinal? Que conclusões se podem tirar por meio
deste cotejamento e de tudo quanto foi apresentado até aqui, neste e no artigo
anterior? Os fatos falam por si e, se acaso ainda persistem dúvidas quanto a se
este Espírito fora um obsessor, basta verificar que distante esteve da postura
esperada de um guia espiritual, e mais ainda de possuir as luzes de sabedoria
que lhe outorgaram a insensata crença do populacho inculto. Não condizendo a
este nível, o que lhe resta tendo em vista seu proceder e suas obras eivadas de
equívocos? Não é sua postura indefensável, a despeito dos aderentes sempre tão
pródigos em argumentar para salvaguardar suas crenças, seu fanatismo, sua
idolatria? Não outro senão Emmanuel constrangeu Chico Xavier, explorou o matuto
ingênuo de Pedro Leopoldo para dele fazer seu servidor, seu escravo de letras,
o arauto de moral ilibada contra a qual todas as vozes antagônicas pareceriam a
expressão cabal da loucura e da obsessão? Não compulsou ao médium de caráter
servil a tornar-se uma máquina de escrever despojada de livre-arbítrio, um
autômato sem vontade cuja razão de existir era única e simplesmente
psicografar-lhe a obra, espargindo suas ideias extravagantes, seja acerca da
natureza dos médiuns e da mediunidade, seja acerca da formação da Terra ou da
evolução de Jesus, ou da existência afirmativa das almas gêmeas, ou ainda dos
procedimentos burocráticos da Roma antiga? Não foi ele a ameaçar de morte Chico
Xavier?
A conclusão parece agora mais inequívoca - Francisco Cândido Xavier, médium prático de Pedro Leopoldo, interior de Minas Gerais, jamais fora espírita; padecera toda a vida de um processo doloroso de obsessão e fascinação, empreendido por um Espírito que se identificara pelo nome de Emmanuel; e este, apesar de suas palavras insuflando a caridade e exortado elevados valores morais, estivera apenas e tão somente comprometido em espalhar a confusão com suas ideias anômalas e equivocadas, frontalmente contrárias a Doutrina dos Espíritos. Este, enfim, é o Espírito Emmanuel, desnudo ao exame de todos. Que contributos Chico Xavier e Emmanuel deram ao Espiritismo? Nenhum!
_______
Chico Xavier de
Encarnação a Encarnação _Therezinha Radetic; Ed. EME. Capivari-SP. 2019
Nosso Amigo Chico
Xavier_Luciano N. da Costa e Silva; Ed. ALF. Itapira-SP. 1998
Novíssimas Revelações
do Nosso Amigo Chico Xavier_Luciano N. da Costa e Silva; Ed. ALF.
Joanópolis-SP. s/d
A Vida Triunfa-Pesquisa
Sobre Mensagens que Chico Xavier Recebeu_Paulo Rossi Severino; Ed. FE. S/
localidade ou data
As Vidas de Chico
Xavier_Marcel Souto Maior; Ed. Planeta. São Paulo-SP. 2003
Por Trás do Véu de
Ísis_Marcel Souto Maior; Ed. Planeta. São Paulo-SP. 2004
Nosso Chico_Saulo
Gomes; Ed. Intervidas. Catanduva-SP. 2018
Até Sempre Chico Xavier_Nena
Galves; Ed. CEU. São Paulo-SP. 2017
Chico Xavier do
Calvário à Redenção_Carlos Alberto Braga Costa; Ed. EME. Capivari-SP. 2019
Testemunhos de Chico
Xavier_Sueli Caldas Schubert; FEB. Brasília-DF. 2010