sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Emmanuel à luz dos fatos

1. Introdução
A título de dar prosseguimento aos questionamentos levantados no artigo anteriormente publicado sem que, todavia, lhe seja uma continuação direta, o presente se propõe a focar nas ocasiões em que o suposto guia espiritual de Francisco Cândido Xavier, o Espírito que atendeu pelo consagrado cognome de Emmanuel, veio dar cumprimento a sua tarefa de orientar a este. Desde antes se esclareceu que o proceder de Emmanuel esteve muito ao largo da atuação oculta esperada de um guia espiritual segundo o prescrito pelo Espiritismo, de fato adequando-se mais ao posto de mentor, como era apontado por Chico e seus aderentes. Havendo construído uma carreira literária póstuma, o Espírito não demonstrou nenhum pudor em revelar-se por meio de romances autobiográficos, dando registro das identidades possuídas em vidas anteriores – na de maior destaque e pelo qual é lembrado, teria sido o bisneto de Públio Lêntulo Cornélio Sura, conspirador romano que, ao lado de Lúcio Sérgio Catilina tentou dissolver a República Romana cerca de 60 anos antes do nascimento de Jesus. Deste suposto bisneto não há prova que sustente sua existência, posto que uma vez executado o conspirador Sura em 63 a.C., seu corpo não foi reclamado por nenhum familiar ou parente consanguíneo, proceder de praxe, resultando concluir que não tivera filhos – menos ainda um bisneto.

Estes e outros pontos obscuros e duvidosos de seus livros já foram com minudência abordados – resta, no entanto, com o objetivo de chegar-se a uma conclusão acerca da natureza de Emmanuel, observar os extratos da vida de Chico Xavier, seu protegido, em sua atuação direta como guia. Algumas biografias foram detidamente examinadas para este intento; deixamos uma lista destas ao final do presente artigo para que o leitor possa, por seus próprios esforços consultá-las. Parte destas histórias e causos foram catalogadas pelo próprio Chico Xavier, seja por havê-las transcrito em artigos publicados amiúde na imprensa especializada, seja por tê-las relatado a amigos, companheiros e familiares, ou diante do público, como fez na histórica entrevista concedida ao programa Pinga-fogo da extinta TV Tupi, onde narrou o hoje famoso caso em que se viu sob forte turbulência em um avião que o levava de Uberaba para Belo Horizonte. A estes, portanto.

2. Passagens da vida de Chico Xavier
José Álvaro Santos, poeta, levou Chico Xavier para a capital mineira em 1933 à promessa de um trabalho que lhe pagasse melhor que o armazém de José Felizardo Sobrinho – conseguiu este uma licença de três meses e partiu com o versejador para Belo Horizonte, a contragosto de Emmanuel. Passado esse período e nada de emprego preparou-se para partir quando dois amigos de José Álvaro Santos o interpelaram, oferecendo emprego e estudo gratuito a custa de renegar O Parnaso de Além-Túmulo, seu primeiro livro, como obra dos Espíritos. Rapaz ainda, negou-se Chico a cumprir a condição, ademais os argumentos dos sujeitos que compararam-no a um sofrê, um pássaro hábil em imitar o estilo de canto de outras aves – Chico seria o sofrê dos poetas mortos, ou seja, nada de Espíritos. Emmanuel que não concordara com a viajem desde o princípio aconselhou o matuto: “_Sim, volte a Pedro Leopoldo e procuremos trabalhar. Você não é um sofrê, mas precisa sofrer para aprender.
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Quando retornou a Pedro Leopoldo, Chico voltou feliz as atividades do centro espírita – mas o público que já era pouco, minguou. Viu-se então sozinho a realizar as atividades da casa para os desencarnados. As histórias corriam e não poucos quiseram colocá-lo num sanatório. O padre Júlio Maria de Manhumirim era um renhido detrator do Espiritismo e, em particular, da figura de Chico Xavier – por treze anos o atacou por meio de artigos no periódico 'O Lutador', que fazia fossem entregues na casa do médium. Parou quando morreu e Emmanuel assim falou a Chico por ocasião do passamento: “_Não te aflijas com os que te atacam. O martelo que atormenta o prego com pancada o faz mais seguro e mais firme.
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Em maio de 1935 o correspondente de 'O Globo', Clementino de Alencar, desembarca em Pedro Leopoldo a fim de decifrar o fenômeno Chico Xavier. Acompanha uma das sessões no centro espírita e recebe uma mensagem em inglês de Emmanuel, e outra ainda, quase hermética: “_A vida, em suas causalidades profundas, escapa aos vossos escalpelos, e apenas o embriogenista observa, na penumbra e no silêncio, a infinitésima fração do fenômeno assimilatório das criações orgânicas.” Não seria a primeira e nem a última das mensagens do guia de Chico a desafiar qualquer tradução, embora estivesse claro que usava da língua portuguesa para se expressar.

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Chico Xavier era elogiado e exaltado por seus aderentes; mas, amargurado por ressalvas feitas por Emmanuel e, em especial, por sua mãe que o alertara acerca de ter sua mediunidade suspensa se cedesse aos prazeres da matéria, evitava as armadilhas do ego rebaixando-se, recusando qualquer enaltecimento, humilhando-se se preciso fosse. Certa feita, repreendeu uma mulher pedindo que não o elogiasse a maneira que procedia, pois não passava de um verme no mundo. Emmanuel interveio: “_Não insulte o verme. Ele funciona, ativo, na transmutação dos detritos da terra, com extrema fidelidade ao papel de humilde e valioso servidor da natureza. Ainda nos falta muito para sermos fiéis a Deus em nossa missão.” Chico passou, então, a definir-se como subverme.
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Certa feita, Chico recebeu convite para apresentar-se a um centro espírita de Belo Horizonte; sua presença era considerada indispensável pelos anfitriões. Num laivo de rara vaidade, o médium pediu dois dias de folga e, procedimento mais raro ainda, não pediu consentimento a Emmanuel, embarcando de trem para a capital. Este, todavia, não demoraria a manifestar-se – durante a viajem surgiu a Chico dizendo: “_Então, você se julga indispensável e, por isso, rompeu todos os obstáculos para viajar como quem realiza uma tarefa fundamental? Já refletiu que o serviço do ganha-pão é indispensável a você?” Bastou para Chico sair do trem e apanhar outro de retorno a Pedro Leopoldo. Nunca mais faltou ao trabalho por que motivo fosse, até se aposentar.
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Os necessitados que acorriam para Chico eram muitos, e até no trabalho eles o perturbavam – deu-se ocasião em que uma mulher o procurara por toda parte, sendo frequentemente despistada para que deixasse o médium trabalhar em paz: as cousas do Espiritismo apenas à noite, no centro. Esta mulher foi a primeira a chegar, e desde pronto repreendeu Chico aos tapas pela trabalheira de persegui-lo ao longo do dia. Ele se irritara, mas fora acalmado por Emmanuel que o fez lembrar-se de uma fala sua: “_Sua missão é formar livros e leitores. Formar leitores é suportar suas exigências, sem censuras. Formar livros é se esquecer de você.” Nenhum leitor em potencial poderia ser deixado de lado; nenhum divulgador, por menor que fosse, deveria ser ignorado ou atendido com descuido.
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A vista de Chico Xavier nunca foi boa – tinha uma doença crônica que causava-lhe muita dor. Certa noite, a agonia se apoderou dele e, cansado, pediu o auxílio de Emmanuel, que duramente lhe respondeu: “_Sua condição não exonera você da necessidade de lutar e sofrer, em seu próprio benefício, como acontece às outras criaturas. Se nem Cristo teve privilégios, por que você os teria?” O sofrimento vinha acompanhado de lições aviltantes e depreciativas. Numa ocasião, o olho sangrara, e Chico passara o fim de semana deitado recuperando-se. Emmanuel não podia deixar por menos, e interpelou o médium, que respondeu-lhe o óbvio: “_O senhor não vê que meu olho está doente?” O Espírito não se satisfez: “_E o que o outro está fazendo? Ter dois olhos é um luxo.
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Iniciava-se a década de 1940 e Chico parou de urinar – o ataque de uremia, alertou-lhe o médico, poderia ser fatal se o médium não urinasse dentro de 24 horas. A perspectiva da morte avizinhava-se dele e, como de costume, evocou a presença de Emmanuel. Desta feita, sem pedido de ajuda, apenas desejava ser recebido no além por seu guia. O Espírito, todavia, era muito atarefado para dar atenção ao seu protegido: “_Estarei ocupado. Mas se você sentir que a hora chegou recorra aos amigos do (centro espírita) Luiz Gonzaga e, depois, não se descuide das sessões de quarta-feira (destinadas aos Espíritos sofredores). Espere pacientemente a sua vez de ser atendido. Você não é melhor do que os outros.

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Nosso Lar fora a décima nona obra psicografada por Chico Xavier – para escrevê-la, ou antes, traduzir o mais perfeitamente possível as descrições fantásticas de André Luiz, ele fora levado para conhecer a Colônia fluídica, ciceroneado por este e por Emmanuel. De retorno, as dúvidas ainda persistiam, mas o trabalho foi feito e o ponto final fora pingado. Como de hábito, consultou seu guia diante do desejo de estudar a medianimidade da psicografia, ao que este lhe respondeu: “_Se a laranjeira quisesse estudar o que se passa com ela na produção de laranjas, com certeza não produziria fruto algum. Vamos trabalhar como se amanhã já não fosse possível fazer nada. Para nós, o que interessa agora é trabalhar.
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Chico Xavier trabalhava muito – ocorreu uma noite de voltar para casa era mais de 1 hora da manhã, exaurido. Ao chegar ao lar, deu com seus gatos doentes, tendo vomitado por toda a sala. Apesar do mau cheiro terrível, preferiu a cama; pela manhã pediria a uma irmã que arrumasse tudo. No caminho para o quarto, Emmanuel intervém: “_Você, que vem de uma reunião espírita, está fugindo da sua obrigação? Está exigindo que uma pobre menina cansada de trabalhar nas panelas e no tanque para que não lhe falte comida nem roupa lavada, limpe esta sujeira? Você vai pegar um pano, vai trazer água, sabão e vamos lavar.” Por lavar, claro, apenas Chico o fez. O Espírito emendaria ainda: “_No Espiritismo, a pessoa tem que começar estudando nos grandes livros e também lavando as privadas, trabalhando, ajudando os que estão com fome, lavando a ferida de nossos irmãos. Se não tivermos coragem de ajudar na limpeza de um banheiro, de uma privada, nós estaremos estudando os grandes livros de nossa doutrina em vão.” Cabia a Emmanuel interpretar de modo bastante pessoal ao Espiritismo, e como devia um espírita se comportar. A Chico, nem o estudo das obras da Doutrina, pois entre deveres e direitos apenas os primeiros lhe couberam.
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O médium de Pedro Leopoldo não era afeito a momentos de descanso e diversão – numa ocasião, contudo, deu-se a demandar algum tempo entre conversas frívolas com amigos. Emmanuel não podia consentir com aquilo e interveio: ou Chico se trancava imediatamente para escrever ou ele iria embora: “_Você fará tudo aproveitando os minutos.” Conversa encerrada.
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A rotina de Chico Xavier era massacrante, e o peso só fazia aumentar; ansiava por um alívio, por um caminho mais tranquilo e calmo. Emmanuel veio em resposta: “_A estrada larga, pavimentada é mais suscetível de desastres, porque nela a velocidade é ameaçadora. A estrada estreita, entulhada, nos faz caminhar com mais cuidado.” Chico esboroaria os pés e perderia a saúde na estrada acidentada da vida.
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Em 1944 estoura o escândalo Humberto de Campos – a viúva do jornalista e escritor acionara o médium mineiro na justiça. O matuto do interior de Minas Gerais via-se diante da possibilidade de ser preso, e seus queixumes para Emmanuel tiveram a seguinte resposta: “_Meu filho, você é planta muito fraca para suportar a força das ventanias. Tem ainda muito que lutar para um dia merecer ser preso e morrer pelo Cristo.” Chico estava aquém da pior das celas.
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Refeito do processo movido contra si pela viúva de Humberto de Campos, Chico estava feliz e, para sua surpresa, recebeu de presente de empresários paranaenses um piano. Espalhara-se o boato que, próximo ao fim de sua existência, o médium mineiro passaria a psicografar partituras dos grandes gênios da música. Verdade ou não, os representantes da marca do piano fizeram sua parte, atrelando esta ao médium por meio do mimo. Amante de música clássica, Chico empolgou-se e contratou aulas de piano – diversamente do que sempre fazia, resolveu ficar com o presente e usá-lo. No dia de sua primeira aula, em meio a doentes e necessitados que aguardavam sua assistência, ele apenas esperava a chegada da professora. Emmanuel surgiu e ralhou: “_Quer dizer que essa gente toda que está aí sofrendo, angustiada, ficará aguardando o dia em que você resolva atendê-la?” Chico dispensou a professora e livrou-se do piano.
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Quando o escândalo envolvendo a obra psicográfica atribuída a Humberto de Campos era apenas uma lembrança infeliz do passado, novo golpe sobreveio a Chico – seu sobrinho residente em Sabará, Amauri Pena Xavier, denunciou o tio como farsante; mensagens e livros eram produção própria, decorrente de espantosa memória e capacidade de imitação do médium. A imprensa deitou o sensacionalismo em reportagens mais interessadas em vender jornais e revistas que em apurar a verdade. Desanimado, Chico recorre a Emmanuel, pedindo desta feita uma orientação a própria mãe de Jesus; dias se passam até que o 'mentor' retorna com a mensagem mariana: “_Isso também passa.” Chico a escrevera na cabeceira da cama e a lera toda manhã como ânimo para suportar o dia. Mas, Emmanuel dera sua emenda, afinal a frase se aplicava a momentos tristes, e também aos alegres.
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Em 1958 Chico Xavier ia de avião de Uberaba para Belo Horizonte – a nave enfrentava turbulência devido a um vento de cauda. Por mais de dez minutos tudo sacudiu e tremeu; ainda que os Espíritos lhe fossem íntimos, Chico não era afeito a ideia de morrer e, como todos no avião, demonstrava isto com veemência. Emmanuel interveio – como era possível a um espírita fazer tamanho alarde diante da morte? Cansado e oprimido, e ante da possibilidade de uma morte terrível, Chico desafiou seu 'mentor' afirmando estar apavorado. Emmanuel recomendou: “_Está bem. Então, cale a boca para não afligir a cabeça dos outros com seus gritos. Morra com fé em Deus, morra com educação.
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Em 1967 Chico Xavier comemorou a efeméride de completar 40 anos de mediunato; de Emmanuel ganhou a responsabilidade de receber as mensagens de Espíritos aos seus parentes encarnados. Eram mensagens particulares, e a assistência ficava em expectativa irreal, atingindo os limites do descontrole emocional. Certa noite um sujeito devolveu a mensagem que Chico lhe entregara, atribuída a um familiar morto, com cusparadas – alegava serem falsas aquelas palavras. O médium aguentou passivamente, caindo em prantos quando de volta ao lar. Emmanuel endureceu: “_Quando alguém cuspir em seu rosto, diga simplesmente que a chuva molhou sua face, se alguém pedir explicações. Não reclame.
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A década de 1970 passara de sua metade quando o coração de Chico começou a mostrar sinais de cansaço – a angina passou a afligir-lhe. Fora a doença que vitimara sua mãe. Acometido pelas dores angustiantes, recorreu uma vez mais a Emmanuel, e dele ouviu laconicamente: “_Afinal, o que querias? Não maltrataste as energias do corpo? As lutas e as caminhadas pelo bem, embora contem com o amparo do Mundo Maior, não excluem as limitações e os desgastes do vaso físico terrestre.” Apenas esqueceu-se de afirmar o Espírito que muito desta luta e parte da caminhada se deveu não a sua orientação, mas ao constrangimento e a mão pesada que impôs sobre o médium, não lhe dando paz ou espaço para seu livre-arbítrio.
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Quando Emmanuel iniciou contatos ostensivos frequentes com Chico Xavier, estabelecera com ele o compromisso da recepção psicográfica de trinta livros. Dezesseis anos depois, em 1947, ele põe o ponto final em Volta, Bocage, a trigésima obra. Emmanuel aparece e sentencia – mais trinta livros. Chico anui, desanimado. Em 1958 Evolução em Dois Mundos é lançado, seu sexagésimo livro, psicografado em parceria com Waldo Vieira – findo mais um acordo com Emmanuel, Chico estava feliz novamente, diante da perspectiva de diminuir o ritmo. Seu 'mentor', contudo, veio com um novo comunicado: “_Os mentores da Vida Maior, perante os quais devo também estar disciplinado, me advertiram que nos cabe chegar ao limite de cem livros.” Onze anos se passariam até completar os quarenta volumes restantes, e Chico uma vez mais rejubilava-se; Poetas Redivivos era a obra de número cem acordado com Emmanuel. O Espírito, uma vez mais, portava más notícias para o médium: “_Estou na obrigação de dizer a você que os mentores da Vida Superior, que nos orientam, expediram uma instrução: ela determina que sua atual reencarnação seja desapropriada, em benefício da divulgação dos princípios espírita-cristãos. Sua existência, do ponto de vista físico, fica à disposição das entidades espirituais que possam colaborar na execução das mensagens e livros, enquanto seu corpo se mostre apto para nossas atividades.” Chico não engoliu a indignação e ralhou, defendendo que o Espiritismo prescreve o livre-arbítrio: e se ele não desejasse prosseguir? Emmanuel encerrou o assunto afirmando: “_A instrução a que me refiro é semelhante a um decreto de desapropriação, quando lançado por autoridade na Terra. Se você recusar o serviço a que me reporto, os orientadores dessa obra de nos dedicarmos ao cristianismo redivivo terão autoridade bastante para retirar você de seu atual corpo físico.” Diante desta velada ameaça de morte, Chico psicografou mais três centenas de livros até o ponto em que a saúde não mais o permitiu, às portas da morte.

3. Apuração
Quem tem o privilégio de uma relação tão próxima, íntima, particular e ostensiva com seu benfeitor espiritual, assim como Chico Xavier? Excetuando-se as biografias que, a feição das hagiografias dos santos católicos, exaltam qualquer fato ligado a existência do médium mineiro, quem como Marcel Souto Maior buscou a isenção jornalística para abordar os fatos, reconheceu a anormal atuação de Emmanuel – não é, senão pela explicação ululante que se pode inferir pela identidade deste: um obsessor manifesto, patente. Que benfeitor espiritual desapropria a vida de seu protegido? Que benfeitor espiritual espezinha seus sofrimentos? Que benfeitor constrange, humilha, interfere no livre-arbítrio deste? Atentarão as vozes dos fanáticos que os fins justificam os meios, que a mediunidade é maior que o homem, que a mensagem deve sobrepujar o indivíduo – mas estes não são espíritas; são já qualquer outra cousa, um amontoado de idólatras sincréticos. As evidências são obnubiladas pela ignorância quanto ao prescrito pelo Espiritismo – então o Espírito missionário deve ir adiante, como a cumprir um fadário sem o qual cai derrotado, não resistindo espaço para a manifestação do livre-arbítrio? Allan Kardec, um Espírito missionário evidente, tivera notícias de sua missão e com o Espírito da Verdade colheu as seguintes impressões, dirimindo suas dúvidas:

Não esqueças que pode triunfar, como podes falir. Neste último caso, outro te substituiria, porquanto os desígnios de Deus não assentam na cabeça de um homem. Nunca, pois, fales de tua missão; seria a maneira de a fazeres malograr-se. Ela somente pode justificar-se pela obra e tu ainda nada fizeste. Se a cumprires, os homens saberão reconhecê-lo, cedo ou tarde, visto que pelos frutos é que se verifica a qualidade da árvore. (…) A nossa assistência não te faltará, mas será inútil se, de teu lado, não fizeres o que for necessário. Tens o teu livre-arbítrio, do qual podes usar como o entenderes. Nenhum homem é constrangido a fazer coisa alguma.

Segue-se a esta um sumário de dificuldades que o Espírito alerta se abaterão sobre Allan Kardec, caso prossiga na missão – este complementa a nota, escrita dez anos após tal comunicação, confirmando a estas e os dissabores previstos, bem como o comprometimento da própria saúde física diante do tamanho da tarefa. Porém, relata o júbilo com que recebera as consequências benfazejas de tanto labor, afirmando sem laivos de vaidade que, em nenhum momento sobreveio o desânimo diante das vicissitudes, mantendo-se apartado de toda reação negativa que lhe lançaram detratores e opositores. Cotejando-se os casos, verifica-se a oposição no tocante ao respeito a um dos princípios fundamentais da Doutrina dos Espíritos – o livre-arbítrio. Caso se leve em conta que o Espírito de Verdade tenha de fato sido Jesus de Nazaré, uma hipótese sempre aventada, mais grave se verifica a atuação de Emmanuel frente a Chico Xavier – ou alguém há de cometer o descalabro de meter no mesmo nível um Espírito de escol como Jesus e este insipiente Emmanuel?

4. Cotejamento e conclusão
No artigo anteriormente postado aqui, transcreveram-se os itens 246 e 247 do capítulo intitulado Da Obsessão de O Livro dos Médiuns, onde o Codificador traça um perfil bastante apropriado de uma espécie de obsessor que, parece-nos, adequa-se quase à perfeição a figura de Emmanuel. Ponto a ponto, vamos cotejá-los ao que se conhece de Emmanuel, lançando questões para se encontrar respostas que permitam a devida reflexão e inferência acerca da identidade do Espírito; também aqui tomaremos de tudo quanto foi exposto na postagem anteriormente publicada.

A_Há Espíritos obsessores sem maldade (…) dominados pelo orgulho e falso saber. (…) Têm suas ideias (…) e querem fazer que suas opiniões prevaleçam. Para esse efeito, procuram médiuns bastante crédulos para os aceitar de olhos fechados e que eles fascinam, a fim de os impedir de discernir o verdadeiro do falso. São os mais perigosos, (…) podem tornar cridas as mais ridículas utopias.”_Chico Xavier em algum momento de sua trajetória lançou dúvidas quanto a ser Emmanuel o seu guia espiritual? Em que ponto, mesmo dentre aqueles raros em que se opôs aos caprichos deste, deixou de acatá-lo e obedecê-lo? Mesmo quando, durante o processo de psicografia de Nosso Lar guardou dúvidas ao que punha no papel, não permitiu que o trabalho fosse finalizado e publicado, sem o que, contudo, lhe fosse podido estudar a psicografia, impedido por Emmanuel? E não seria este um Espírito de cujas ideias próprias, ainda que contrárias ao Espiritismo, as apresentou por meio de livros (O Consolador, A Caminha da Luz, Emmanuel, etc.)? Não é uma ridícula utopia todo este sistema que corrompeu a erraticidade por meio do ideário das Colônias Espirituais, a qual sancionou ao auxiliar André Luiz, seu autor?

B_Como conhecem o prestígio dos grandes nomes, não escrupulizam em se adornarem com um daqueles diante dos quais todos se inclinam, e não recuam sequer ante o sacrilégio de se dizerem Jesus, a Virgem Maria, ou um santo venerado.”_O uso do nome Emmanuel, um nome bíblico e profético, segundo a qual seria conhecido o próprio Jesus tem algum significado? Não imporia ele respeito por tacitamente levar a concluir, ainda que erroneamente, que Emmanuel fora um Espírito de elite? Essa ideia subjacente não foi reforçada pela história narrada em Há 2000 Anos, onde supostamente Emmanuel estivera na presença de Jesus? Ou quando Chico, ingenuamente pede por um consolo a Virgem Maria, sem levantar objeções a que Emmanuel poderia obtê-las para ele, diante dos problemas causados por seu sobrinho? Ainda: não exorta respeito revelar haver sido, outrossim, o padre jesuíta Manoel da Nóbrega, um dos fundadores da cidade de São Paulo? Não teria sido a credulidade de Chico Xavier explorada por este Espírito?

C_Procuram deslumbrar por meio de uma linguagem empolada, mais pretensiosa do que profunda, eriçada de termos técnicos e recheada das retumbantes palavras – caridade e moral. Cuidadosamente evitarão dar um mau conselho, porque bem sabem que seriam repelidos. (…) A moral, porém, para esses Espíritos é simples passaporte, (…) O que querem, acima de tudo, é impor suas ideias por mais disparatadas que sejam.”_O estilo de escrita pomposa e pernóstica de Emmanuel não de adequa ao perfil elaborado? Não foi grande parte dos atos de benemerência levados a efeito por Chico Xavier movidos pela intervenção direta de Emmanuel? Não foi ele a dobrar a vontade do médium para fazer além das próprias forças e da saúde? O que desejara Emmanuel impedindo Chico Xavier de divertir-se, de dar vazão ao desejo inofensivo de aprender piano? Ou reprovando suas conversas frívolas com amigos e familiares? Não eram os ditados de suas obras o que deveria importar mais que ao bem-estar do médium?

D_“Os Espíritos dados a sistemas são geralmente escrevinhadores, pelo que buscam os médiuns que escrevem com facilidade e dos quais tratam de fazer instrumentos dóceis e, sobretudo, entusiastas, fascinando-os. São quase sempre verbosos, muito prolixos, procurando compensar a qualidade pela quantidade. Comprazem-se em ditar, aos seus intérpretes, volumosos escritos indigestos e frequentemente pouco inteligíveis que, felizmente têm por antidoto a impossibilidade material de serem lidos pelas massas. Os Espíritos verdadeiramente superiores são sóbrios de palavras; dizem muita coisa em poucas frases. Segue-se que aquela fecundidade prodigiosa deve sempre ser suspeita. Nunca será demais toda a circunspecção, quando se trate de publicar semelhantes escritos.”_Chico Xavier, algum dia, lançou dúvidas quanto a suposta superioridade de Emmanuel? Não era a ele que sempre evocava para orientar-se, sujeitando seu livre-arbítrio aos desvarios deste? Não é Emmanuel que, dentre as mais de quatro centenas de livros psicografados por Chico Xavier, responde por um quarto dentre estes? E quanto aos prefácios de obras alheias, ou as mensagens de cunho moral, e toda sorte de escritos que indicam um loquaz em pleno exercício? Não são estes mesmos livros de orientação ética um pastiche das mais altas e edificantes lições morais de todos os povos e de todos os tempos? Não é o proceder comum de um padre a compor sermões ao longo de décadas? E, embora popular, não seria Emmanuel como que a roupa nova do imperador, alegadamente compreendido por quem teme o estigma da estupidez por não haver sido capaz de romper-lhe os desafios idiomáticos? Fascinado Chico Xavier, e enredado os leitores, outrossim, que barreiras sê-lhe foram impostas para alardear o que bem entendesse? Não foi a custa de algo inexistente como 'mentores da vida maior' que ele prendeu seu médium até o fim?

E_“As utopias e as excentricidades, que neles por vezes abundam e chocam o bom-senso, produzem lamentável impressão nas pessoas ainda noviças na Doutrina, dando-lhes uma ideia falsa do Espiritismo, sem mesmo se levar em conta que são armas de que se servem seus inimigos, para ridicularizá-los. Entre tais publicações, algumas há que, sem serem más e sem provirem de uma obsessão, podem considerar-se imprudentes, intempestivas, ou desazada.”_Que pensaria o sujeito que, estudando a O Livro dos Médiuns lesse os apontamentos de Emmanuel em sua obra homônima acerca do caráter desgraçado dos médiuns? Que pensaria este, ainda, acerca da questão das almas gêmeas em resposta contida em O Consolador? Ou ainda seu aval a doutrina das Colônias Espirituais, estando este hipotético estudante diante de O Céu e o Inferno? Ainda e uma vez mais, que pensar do infame 'Culto do Evangelho no Lar', cuja mensagem deste instila a prática? E quantos não tiveram o espírito de questionar a postura frontalmente contrária ao Espiritismo deste escrevinhador de além-túmulo, abraçando seus sistemas, adotando suas ideias?

Tais ordens de questionamentos visam apenas colaborar para a reflexão; e a que levam estes, afinal? Que conclusões se podem tirar por meio deste cotejamento e de tudo quanto foi apresentado até aqui, neste e no artigo anterior? Os fatos falam por si e, se acaso ainda persistem dúvidas quanto a se este Espírito fora um obsessor, basta verificar que distante esteve da postura esperada de um guia espiritual, e mais ainda de possuir as luzes de sabedoria que lhe outorgaram a insensata crença do populacho inculto. Não condizendo a este nível, o que lhe resta tendo em vista seu proceder e suas obras eivadas de equívocos? Não é sua postura indefensável, a despeito dos aderentes sempre tão pródigos em argumentar para salvaguardar suas crenças, seu fanatismo, sua idolatria? Não outro senão Emmanuel constrangeu Chico Xavier, explorou o matuto ingênuo de Pedro Leopoldo para dele fazer seu servidor, seu escravo de letras, o arauto de moral ilibada contra a qual todas as vozes antagônicas pareceriam a expressão cabal da loucura e da obsessão? Não compulsou ao médium de caráter servil a tornar-se uma máquina de escrever despojada de livre-arbítrio, um autômato sem vontade cuja razão de existir era única e simplesmente psicografar-lhe a obra, espargindo suas ideias extravagantes, seja acerca da natureza dos médiuns e da mediunidade, seja acerca da formação da Terra ou da evolução de Jesus, ou da existência afirmativa das almas gêmeas, ou ainda dos procedimentos burocráticos da Roma antiga? Não foi ele a ameaçar de morte Chico Xavier?

A conclusão parece agora mais inequívoca - Francisco Cândido Xavier, médium prático de Pedro Leopoldo, interior de Minas Gerais, jamais fora espírita; padecera toda a vida de um processo doloroso de obsessão e fascinação, empreendido por um Espírito que se identificara pelo nome de Emmanuel; e este, apesar de suas palavras insuflando a caridade e exortado elevados valores morais, estivera apenas e tão somente comprometido em espalhar a confusão com suas ideias anômalas e equivocadas, frontalmente contrárias a Doutrina dos Espíritos. Este, enfim, é o Espírito Emmanuel, desnudo ao exame de todos. Que contributos Chico Xavier e Emmanuel deram ao Espiritismo? Nenhum!


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Chico Xavier de Encarnação a Encarnação _Therezinha Radetic; Ed. EME. Capivari-SP. 2019
Nosso Amigo Chico Xavier_Luciano N. da Costa e Silva; Ed. ALF. Itapira-SP. 1998
Novíssimas Revelações do Nosso Amigo Chico Xavier_Luciano N. da Costa e Silva; Ed. ALF. Joanópolis-SP. s/d
A Vida Triunfa-Pesquisa Sobre Mensagens que Chico Xavier Recebeu_Paulo Rossi Severino; Ed. FE. S/ localidade ou data
As Vidas de Chico Xavier_Marcel Souto Maior; Ed. Planeta. São Paulo-SP. 2003
Por Trás do Véu de Ísis_Marcel Souto Maior; Ed. Planeta. São Paulo-SP. 2004
Nosso Chico_Saulo Gomes; Ed. Intervidas. Catanduva-SP. 2018
Até Sempre Chico Xavier_Nena Galves; Ed. CEU. São Paulo-SP. 2017
Chico Xavier do Calvário à Redenção_Carlos Alberto Braga Costa; Ed. EME. Capivari-SP. 2019
Testemunhos de Chico Xavier_Sueli Caldas Schubert; FEB. Brasília-DF. 2010

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